CINEMA COM ‘C’ MAIÚSCULO
Resultados do Globo de Ouro reforçam poder do cinema e frustra apostas da Netflix
Por Editoria de Cultura | Edição do dia 07/01/2020 - Matéria atualizada em 07/01/2020 às 06h00
A sétima arte é como uma montanha russa contínua. E, de tempos em tempos, ela transporta esse vai e vem de emoções das telas para as premiações. E este é um daqueles anos, em que cada prêmio reverbera como um clássico de futebol. Apesar de o Globo de Ouro não ser um termômetro 100% confiável do que será o Oscar, a cerimônia da 77ª edição, que ocorreu no último domingo (5), em Los Angeles, prometia consagrar a Netflix como residência de um cinema com ‘C’ maiúsculo. Não aconteceu. A gigante do streaming chegou à cerimônia com 17 indicações para as categorias cinematográficas. Além de “O Irlandês”, épico dirigido por ninguém menos que Martin Scorsese, a plataforma ainda tinha no páreo os sólidos “Dois Papas”, “História de um Casamento” e “Meu Nome é Dolemite”. Na categoria de melhor filme de drama, eram três chances contra duas. Mas não foi desta vez. “O Irlandês”, que somava cinco indicações, saiu de mãos abanando e perdeu os postos de melhor filme de drama e melhor diretor para “1917”, de Sam Mendes. “História de um Casamento” só ganhou um prêmio, de melhor atriz coadjuvante, para Laura Dern. Perdeu o troféu de melhor roteiro, ao qual era favorito, para “Era uma Vez Em Hollywood”. A nostálgica incursão de Quentin Tarantino nos bastidores da indústria cinematográfica, aliás, foi a grande campeã da noite, com prêmios de melhor filme de comédia ou musical e melhor ator no gênero para Brad Pitt. Os últimos não surpreenderam, assim como os demais prêmios cinematográficos distribuídos na cerimônia. Os correspondentes estrangeiros que formam a premiação renovaram sua fé nas biografias musicais, concedendo prêmios a Renée Zellweger e Taron Egerton por seus retratos de Judy Garland e Elton John, nesta ordem. E Joaquin Phoenix foi consagrado melhor ator de filme dramático por seu Coringa atormentado. Já o discurso do ator não foi nada previsível. Ele, que começou agradecendo à Associação de Jornalistas Estrangeiros pelas opções veganas no jantar, escancarou a hipocrisia de seus colegas presentes. “É ótimo votar” disse, “mas às vezes precisamos fazer mudanças e sacrifícios pessoais. Espero que não precisemos fretar jatinhos privados para Palm Springs de vez em quando, por favor.” Na primeira parte, Phoenix fazia referência à fala de Michelle Williams ao receber a estatueta de melhor atriz pela minissérie “Fosse/Verdon”. Nela, pediu que mulheres, “dos 18 ao 118”, fossem às urnas -o voto não é compulsório nos Estados Unidos. “Por favor, façam isso em interesse próprio. É o que os homens vêm fazendo por anos, e é por isso que o mundo se parece tanto com eles”, afirmou. Outro discurso que rendeu aplausos foi o de Patricia Arquette, que citou a tensão crescente entre os Estados Unidos e o Irã. Mas a noite teve poucas polêmicas, e mesmo o mestre de cerimônias, Ricky Gervais, que nas outras cinco edições do evento que comandou ficou famoso pelas ofensas, maneirou desta vez -sua piada mais ousada falou da pouca idade das namoradas de Leonardo DiCaprio. A crítica mais ferina veio provavelmente do sul-coreano Bong John-Hoo, cujo “Parasita” foi eleito o melhor filme em melhor língua estrangeira. “Quando superarmos a barreira de legendas, vocês vão conhecer muitos outros filmes incríveis”, disse. Junto com a atriz Awkwafina, melhor atriz de comédia ou musical por “A Despedida”, falado em grande parte em chinês, foi destaque numa edição criticada pela falta de diversidade. Já entre as categorias de televisão, os estrangeiros dominaram a cerimônia. A britânica Phoebe Waller-Bridge de novo roubou os holofotes nas categorias de humor, conquistando os prêmios de melhor série e melhor atriz de comédia ou musical por “Fleabag”. Olivia Colman, que vive sua madrinha na série, também foi premiada, mas como melhor atriz em série dramática por sua versão da rainha Elizabeth 2ª em “The Crown”. Por fim, outra conterrânea, “Chernobyl”, recebeu as estatuetas de melhor minissérie e de melhor ator coadjuvante para o sueco Stellan Skäsgard. Os grandes azarões da noite também foram estrangeiros. Ramy Youssef, criador e astro de “Ramy”, sobre um filho de imigrantes egípcios, tirou de Michael Douglas o prêmio de melhor ator em série de comédia -o protagonista de “O Método Kominsky” havia ganhado a categoria no ano passado. Youssef fez troça da situação, dizendo que “minha mãe também estava torcendo pelo Michael Douglas. Os egípcios o amam.” E o australiano Russell Crowe foi eleito o melhor ator em minissérie, por “The Loudest Voice”.