app-icon

Baixe o nosso app Gazeta de Alagoas de graça!

Baixar
Nº 5859
Caderno B

FALTAM OUSADIA E RITMO NA POLÊMICA SÉRIE SOBRE JESUS

Crítica vê problemas em produção que imagina surgimento de um novo Cristo no Oriente Médio

Por TONY GOES/ FOLHAPRESS | Edição do dia 08/01/2020 - Matéria atualizada em 08/01/2020 às 06h00

Messiah está disponível na Netflix e crítica fala em excesso de cuidado na produção
Messiah está disponível na Netflix e crítica fala em excesso de cuidado na produção - Foto: Reprodução
 

O que aconteceria se Jesus Cristo voltasse ao mundo agora? Uma resposta comum à pergunta é que ele seria preso e morto por quem se diz cristão. 'Messiah', da Netflix, não vai tão longe. Com dez episódios na primeira temporada, a série imagina o surgimento de um jovem líder religioso no Oriente Médio. Depois de impedir a conquista de Damasco pelo Estado Islâmico ao, aparentemente, conjurar uma tempestade de areia, o rapaz passa a ser chamado de al-Masih –o messias, em árabe. Bastou a plataforma divulgar o trailer nas redes sociais, há cerca de um mês, para os protestos começarem. Sem terem visto um único episódio, mais de 4.000 pessoas já assinaram uma petição online propondo um boicote à Netflix. Segundo alguns muçulmanos, o protagonista de 'Messiah' seria um "dajjal", ou falso profeta. Grupos cristãos também clamam pelo cancelamento da série. O governo da Jordânia, onde muitas cenas foram rodadas, pediu que o programa não fosse exibido lá. E assim, menos de um mês depois do lançamento do polêmico especial de Natal do Porta dos Fundos, o maior serviço de streaming do mundo se vê envolvido em mais uma controvérsia religiosa. Só que, desta vez, a gritaria deve silenciar. Porque, na verdade, a série faz um esforço consciente para não questionar nenhuma crença. Nem é de se admirar –os produtores de 'Messiah' são Mark Burnett (também responsável pelo reality 'Survivor') e sua mulher, a atriz Roma Downey. O casal fez ainda a comportada minissérie 'A Bíblia', de 2013, exibida no Brasil pela Record. Tamanho cuidado acaba por prejudicar 'Messiah'. A ótima premissa se dilui ao longo dos episódios. As coisas demoram a acontecer. Concentradas, talvez rendessem um bom filme. Depois de salvar Damasco, al-Masih (o ator belga de origem árabe Mehdi Dehbi) leva seus seguidores à fronteira da Síria com Israel, onde todos são impedidos de entrar. Um campo de refugiados se improvisa do dia para a noite, atraindo a atenção do Mossad e da CIA. O suposto messias é interrogado pelo agente israelense Aviram Dahan, papel de Tomer Sisley, que fica confuso com as respostas. Enquanto isso, nos Estados Unidos, a agente americana Eva Geller (Michelle Monaghan, da franquia 'Missão Impossível') suspeita que uma seita terrorista esteja se formando. Eva guarda um segredo doloroso, assim como sua congênere Carrie Mathison, de "Homeland" - série, aliás, com que 'Messiah' tem semelhanças. É louvável que os personagens principais de uma obra tenham passados complexos. Infelizmente, aqui os roteiristas dedicam atenção demais a elas e se esquecem um pouco da trama principal. Afinal, al-Masih é ou não é a segunda encarnação de Cristo? Não demora para que os serviços de espionagem descubram que ele é um estudante iraniano, com passagem por uma universidade americana. Mas, e os seus milagres, realizados em frente a câmeras e celulares? Ele ressuscita um menino morto, caminha sobre as águas e não se incomoda em posar para fotos para o Instagram. Enquanto seus discípulos se amontoam na fronteira israelense, al-Masih aparece no Texas, onde salva de um tornado a filha de um pastor. O religioso, Felix (John Ortiz), vive uma profunda crise pessoal e financeira e acredita piamente ter encontrado o verdadeiro filho de Deus. Em meio a tantos dramas paralelos, a figura de al-Masih permanece algo opaca. 'Messiah' está mais interessado em mostrar como pessoas comuns reagiriam com a súbita intromissão do sagrado em suas vidas cotidianas. Em nenhum momento o roteiro esclarece se seu personagem-título é ou não um impostor. Essa ausência de pregação religiosa torna 'Messiah' palatável até para os não crentes. O showrunner Michael Pretoni frisa que sua intenção era provocar, não insultar. Mas um pouco mais de ousadia –ou, pelo menos, de agilidade– teriam conquistado mais adeptos à série.

Mais matérias
desta edição