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FILME FALA DO PRESENTE, FUTURO E SOBRE A UBERIZAÇÃO DO TRABALHO

Celebrado longa de Ken Loach está em cartaz no Centro Cultural Arte Pajuçara

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Filmes do cineasta costumam impactar debate público na Inglaterra e outros países europeus
Filmes do cineasta costumam impactar debate público na Inglaterra e outros países europeus | Foto: Divulgação

“Vi esse filme à noite e até perdi o sono”, diz a jornalista Alexa Salomão sobre o filme “Você Não Estava Aqui”, do diretor britânico Ken Loach. O longa, que chega aos cinemas no dia 27 de fevereiro, foi exibido em sessão de pré-estreia promovida pela Folha de S.Paulo. O que tirou o sono da editora de Mercado da Folha, que participou do debate após a sessão, foi a “imensa fragilidade dos personagens” no que se refere a suas relações de trabalho. Abby Turner (Debbie Honeywood) trabalha como cuidadora de doentes em uma modalidade conhecida como contrato zero hora, em que o funcionário só trabalha quando é chamado pelo patrão e recebe apenas pelos serviços prestados, sem garantias. Abby chega a trabalhar 14 horas por dia cuidando de pessoas com mobilidade reduzida e idosos que não conseguem ir ao banheiro ou fazer refeições sozinhos. Seu marido, Ricky Turner (Kris Hitchen), aceita a indicação de um amigo e começa a trabalhar como motorista autônomo em uma empresa onde recebe por entrega realizada, sem vínculo empregatício. Apesar do discurso do patrão sobre a liberdade de seus funcionários, os direitos de Ricky são bem limitados no dia a dia.

Embora passem a maior parte do tempo fora de casa, o casal, que mora em Newcastle, nordeste da Inglaterra, precisa lidar com os dois filhos adolescentes: Sebastian (Rhys Stone), que chega a ser suspenso da escola e detido pela polícia, e Liza Jane (Katie Proctor), que se sente culpada por parte dos problemas da família. Alexa Salomão explica que a flexibilização das relações de trabalho foi a tentativa de solucionar o problema dos altos níveis de desemprego no Reino Unido e em vários países após a crise financeira mundial de 2008. No Brasil, a situação não é diferente. Segundo o IBGE, o trabalho informal é a principal ocupação da população de 11 estados brasileiros. A informalidade atingiu 41,1% dos trabalhadores do país, maior nível desde 2016. “Nesse momento, há um grupo que reúne juristas, juízes e acadêmicos elaborando o que seria a fase dois da reforma trabalhista, que vai tentar uma flexibilização mais profunda ainda. As relações de trabalho vão continuar mudando. A tendência é que piore, não que melhore. A maioria das pessoas pode se tornar Ricky e Abby na vida real”, prevê Salomão. Para a pesquisadora Cecília Mello, professora da Escola de Comunicação e Artes da USP, que também participou do debate, “há mais vozes reclamando [da precarização do trabalho] no Reino Unido do que no Brasil”. Mello fez mestrado e doutorado na Inglaterra antes da crise de 2008 e, atualmente, volta ao país anualmente para eventos e conferências relacionados ao cinema, sua área de pesquisa. “[Na Inglaterra] há a precarização [do trabalho], mas ao mesmo tempo há a consciência de que isso está ocorrendo e, em certa medida, quem pode lutar contra isso vem lutando”, afirma a professora. Ela menciona a resistência por parte da população e do Estado contra empresas como a Uber que, em 2019, chegou a ser proibida de operar em Londres. “Parte da sociedade britânica está se movimentando para tentar achar uma solução. A posição do próprio Ken Loach é de não querer viver em um mundo onde todo mundo acha que não há mais saída.” Segundo Mello, a derrota do Partido Trabalhista nas urnas mostra que o olhar crítico presente nas obras de Loach não é o favorito do povo britânico. Ela lembra, entretanto, o impacto que outros filmes do cineasta tiveram sobre o debate público na Inglaterra. Em 2016, por exemplo, Jeremy Corbyn, líder do Partido Trabalhista, recomendou à então primeira-ministra Theresa May que assistisse ao filme “Eu, Daniel Blake”. O longa de 2016 conta a história de um homem que se afasta do trabalho e precisa buscar auxílio do governo, enfrentando no caminho os obstáculos da burocracia britânica. “Eu, Daniel Blake” foi o vencedor da Palma de Ouro em seu ano de lançamento, o prêmio de maior prestígio do Festival de Cannes.

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