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Caderno B

FESTIVAL DE LIVES MOSTRA ARTISTAS DO JEITO QUE O PÚBLICO NUNCA VIU

Ao vivo e isolados em casa, artistas mostram intimidade e fazem covers inusitados

Por LUCAS BRÊDA/ FOLHAPRESS | Edição do dia 24/03/2020 - Matéria atualizada em 24/03/2020 às 06h00

Ludmilla aproveita lives para se aventurar em outros ritmos e mostrar dia a dia
Ludmilla aproveita lives para se aventurar em outros ritmos e mostrar dia a dia - Foto: Reprodução
 

Na semana passada, o carioca FP do Trem Bala anunciou que entraria ao vivo no YouTube, às 16h de domingo (22), divulgando mensagens de vídeo de Everton Ribeiro e Gérson, jogadores do Flamengo. O DJ, torcedor fanático e produtor de músicas sobre o time, queria matar duas saudades –a dos shows, por isso montou sua mesa de som na varanda de casa, e dos jogos de futebol, por isso escolheu o horário tradicional em que o esporte seria exibido na TV. Musicalmente, seu show caseiro tinha pouquíssimos atrativos, já que o som das caixas não é bem captado pelo pequeno microfone de um telefone. E, além disso, as músicas de seu set estão praticamente todas na internet, importando apenas sua seleção, combinação e intervenção para comentários entre as faixas. A transmissão de apresentações caseiras na internet tem sido cada vez mais frequentes entre os músicos do Brasil e do mundo no período de pandemia do novo coronavírus. Os projetos, que incluem festivais inteiros ou iniciativas individuais, não rendem dinheiro, apesar da exposição para milhares e às vezes milhões de fãs, mas aproximam os artistas de seu público. Ludmilla, que acabara de lançar dois singles e prepara um EP de pagode para o próximo mês, pode conversar e apresentar mais devidamente a nova fase da carreira. Também no domingo (22), acompanhada por um músico no violão, ela cantou as faixas que já gravou –versão em samba de sua música, “A Boba Fui Eu”, e outra de Alcione, “Faz Uma Loucura Por Mim” -, atendeu a pedidos de fãs e até mostrou ao vivo uma canção inédita. Mais do que ouvir a habilidosa cantora em um terreno não tão conhecido pelo público, o show trouxe outro tipo de comunicação entre ela e os fãs. Mesmo que não seja raro ver Ludmilla fazendo vídeos e publicando conteúdo na internet, não deixa de ser curioso ver a artista conversando em casa com a mulher ou cumprimentando a mãe, que apareceu, segundo a cantora, bêbada no meio da live. Com diferentes formatos e objetivos, esses shows têm valor musical só para os mais aficionados pelos artistas. Afinal, ver Ludmilla se esforçando para lembrar a letra de “Mande um Sinal”, de Pixote, apesar de não ser um atrativo dos mais chamativos, também não é exatamente uma cena comum. Uma música em especial mostrou versatilidade impressionante, aparecendo em duas lives diferentes. Trata-se de “Disk Me”, sofrência de Pabllo Vittar que nem é um hit dos mais novos da drag queen maranhense, tendo sido lançada em 2018, no disco “Não Para Não”. Bastante pedida pelos fãs, a faixa foi cantada por artistas tão diferentes quanto a sertaneja Marília Mendonça e o roqueiro emo Lucas Silveira, vocalista do Fresno, em vídeos que já circulam na internet. Enquanto a versão original tem produção com guitarras de brega e um refrão explosivo, na voz de Marília Mendonça virou uma bonita canção romântica. Com Silveira, “Disk Me” soou ainda mais triste e melódica. É improvável imaginar algum desses cantores se arriscando na versão num show com palco, público e banda, mas as lives nas redes sociais são a plataforma adequada para as performances mais descompromissadas. Quem faz algo inusitado e espontâneo, aliás, tem se dado melhor nos shows caseiros e com poucos equipamentos. Pela caixa de comentários, sempre frenética, é possível ter alguma noção da reação do público, mas a experiência virtual apenas emula –e não substitui– os shows presenciais. Um crítico do New York Times, que tem ido a shows regularmente desde os anos 1970, escreveu sobre as noites vazias sem poder frequentar os clubes noturnos e casas de show. De fato, estar num show significa se pegar dançando sem querer, abraçar um estranho em uma performance mais triste, pular em uma roda de bate-cabeça ou sentir o corpo tomado por graves altíssimos. Estar em casa e ver seu músico favorito tocar também em casa pode dar uma sensação de falta de proximidade, já que ninguém vai se descabelar por um ídolo preso na tela. Até por isso, vários músicos têm investido em outro tipo de conteúdo. O DJ de techno e house L_cio disse que vai oferecer cursos de produção e mixagem online. Anitta tem chamado professores para dicas de alimentação ou aulas de francês. Charli XCX e Miley Cyrus fizeram, cada uma à sua maneira, uma espécie de talk show com conversas com amigos famosos. Nada disso é novidade no movimentado universo da internet, mas, por outro lado, nunca se produziu tanto conteúdo deste tipo de uma só vez. Quando a situação de saúde pública estiver amenizada, vão sobrar um ou outro vídeo mais inusitado das horas e horas de shows caseiros mundo afora. Hoje, contudo, essas lives são a maneira possível de não se perder a conexão com a música não gravada e com a experiência coletiva de ouvir a mesma canção no mesmo momento. Além da lembrança do ídolo em situações mais vulneráveis que a superprodução dos palcos, programas de TV e gravações de DVD costumam esconder.

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