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Nº 5885
Caderno B

A PAIXÃO DE CRISTO

Pandemia deixa Semana Santa sem os tradicionais espetáculos teatrais; grupos relatam sensação de vazio e apostam em dias melhores

Por MAYLSON HONORATO | Edição do dia 11/04/2020 - Matéria atualizada em 11/04/2020 às 14h17

Foto: Divulgação
 

Pela primeira vez, o período pascal ficou órfão das tradicionais encenações que recontam e celebram os últimos dias de Cristo na terra. Devido ao período de isolamento social, proposto para conter a propagação do novo coronavírus, espetáculos em todo o estado foram cancelados ou adiados. Mesmo com a sensação de vazio apontada por integrantes de grupos teatrais que se dedicam à Paixão de Cristo, são mantidos sentimentos como o de “haver um propósito” e de esperança por dias melhores.


Na cidade de São Miguel dos Campos, será a primeira vez, nos últimos 23 anos, que a Semana Santa não contará com o espetáculo teatral da Associação Teatral Arte e Fé (Ataf). A vigésima quarta edição de A Paixão de Cristo no município foi adiada e ainda não tem uma nova data. Para André Vieira, diretor do espetáculo, a sensação de vazio acompanha todo o elenco e também os moradores da cidade, habituados a ter dias frenéticos nesta época do ano. Por lá, foram quatro meses de ensaio e, na verdade, um ano inteiro dedicado à realização do espetáculo, que mobiliza ao menos 210 pessoas, entre atores, figurantes e técnicos.


“Nós estamos sentindo na pele o cancelamento, a cada dia desta semana. Eu tenho 40 anos de vida, mas 24 deles são dedicados ao espetáculo. Confesso que me sinto um pouco perdido, uma sensação de vazio, de dias longos”, desabafa.


Segundo o diretor, a prefeitura de São Miguel dos Campos se comprometeu em manter o patrocínio e viabilizar uma data, mesmo fora de época, com a intenção de manter essa tradição na cidade.

“É um impacto grande na vida de muitas pessoas. São mais de duzentos trabalhando no espetáculo, mas também tem os ambulantes, o comércio local inteiro, que se prepara para os dias de espetáculo. A Paixão de cristo mobiliza a todos”, conta.

Foto: Divulgação
 


A Ataf estava com quase tudo pronto e já havia divulgado as datas para o espetáculo. De acordo com André Vieira, somente o cenário precisava de ajustes. “Por um dia não espalhamos os cartazes e panfletos na região. Estava tudo pronto”. No ano passado, outras 11 cidades alagoanas, incluindo a capital, tiveram encenações de A Paixão de Cristo.


Em Junqueiro, município do Agreste alagoano, a Associação Luz Divina preparava um grande espetáculo, em seu já conhecido anfiteatro. O diretor e produtor Jair Santos reitera a sensação de vazio e estranhamento. “Por conta do surto, acredito que não vamos realizar este ano. Inclusive, não temos previsão de uma nova data, porque não sabemos como serão os próximos dias ou até quando vai esse danado desse vírus”, lamentou o diretor, que informou que o ator Júlio Rocha (da novela Duas Caras) integraria o elenco este ano.


NOVA JERUSALÉM

No começo da semana, a Sociedade Teatral de Fazenda Nova, responsável pela Paixão de Cristo de Nova Jerusalém, de Pernambuco, lançou uma nota lamentando o cancelamento das apresentações, mas reiterando a necessidade do isolamento social. Será a primeira vez, em 53 anos, que o espetáculo não será apresentado na Semana Santa. Lá, o mega espetáculo ganhou novas datas e ocorrerá fora de época, entre os dias 2 e 7 de setembro.

“Centenas de caravanas estão chegando. dá pra sentir a energia de cada pessoa que está aqui. Suas expectativas, sua animação, sua emoção. nos bastidores, uma movimentação intensa. Os últimos retoques dos maquiadores, figurinistas que vão deixando os personagens surgirem. Até que chega a hora de reunir todo o elenco, dar as mãos e se preparar para entregar o espetáculo de imensa grandeza que vocês merecem.


São 18h e as luzes de Nova Jerusalém se apagam. Mais de dez mil pessoas estão olhando para o cenário do sermão da montanha. O coração bate mais forte, as mãos suam, os olhos enchem d’água. Este seria o início da temporada 2020, mas, pela primeira vez em 53 anos, a Paixão de Cristo de Nova Jerusalém não será encenada na semana santa. nada poderia justificar isso, a não ser o valor inestimável da vida, o dom maior de cada ser humano. Consideramos que preservar vidas é o mais importante neste momento”, diz trecho da nota.


O PAPEL DE JESUS

Foto: Divulgação
 


No universo dos espetáculos religiosos, o papel de Jesus nas encenações é um posto cobiçado por atores, que acabam ganhando reconhecimento instantâneo e ficam marcados para sempre, como é o caso do saudoso José Pimentel, eterno Jesus da Paixão de Cristo de Nova Jerusalém. Em Alagoas, Glayton Santos (foto), de São Miguel dos Campos, há quatro anos cumpre o desafio de reviver os últimos momentos de Cristo na terra - uma história que dividiu a humanidade em antes e depois. Para ele, é uma honra interpretar Jesus nos espetáculos e a preparação é física, emocional e, claro, um momento de renovação da fé.


“As pessoas passam o ano me chamando de Jesus. É algo que ficou marcado. Eu fico feliz por ser um instrumento para transmitir uma mensagem de amor ao próximo. Isso é muito importante”, contou o ator. De acordo com Glayton, apesar da sensação de vazio e da tristeza por não poder encenar a Paixão de Cristo esta semana, a esperança precisa guiar os dias de todos. O ator integra a Associação Teatral Arte e Fé há 14 anos.


“É um costume local aqui em São Miguel dos Campos, então, a gente sente. Não só as pessoas que fazem o espetáculo, mas a cidade inteira. O momento pede que a gente se guarde e, para os que estão esperando para ver o espetáculo, saibam que estamos nos preparando para apresentar, o mais breve possível, um espetáculo ainda melhor”, diz.


Para não deixar as pessoas sem uma amostra do que prepararam, os atores da Ataf gravaram trechos do espetáculo, que seriam utilizados para fins promocionais. Agora, eles lançaram algumas cenas da história de Cristo para que as pessoas possam acessar pelas redes sociais durante esta semana. Para conferir, basta acessar o Instagram ou o Facebook do grupo.


“Peço que acompanhem nossas redes sociais e saibam que, quando tudo isso passar faremos um espetáculo ainda melhor. Neste momento, a vida é a prioridade e nosso espetáculo fala justamente sobre vida, sobre o maior símbolo da vida, que é Jesus. Nosso desejo é, quando isso passar, presentear o público com muita paixão”, conclui o diretor André Vieira.

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