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Nº 5854
Caderno B

GRANDES EMPRESAS ESTÃO ENTRE SELECIONADOS DA LEI ALDIR BLANC EM AL

Artistas cobram diálogo e transparência da Secult e temem que Alagoas perca verba federal

Por DA EDITORIA DE CULTURA | Edição do dia 23/12/2020 - Matéria atualizada em 23/12/2020 às 09h10

Em abril, artistas organizaram protestos pedindo agilidade da Secult
Em abril, artistas organizaram protestos pedindo agilidade da Secult - Foto: Cortesia
 

Restam praticamente cinco dias úteis para o exercício de 2020 terminar. É esse o prazo que a Secretaria de Estado da Cultura de Alagoas tem para resolver problemas relacionados aos editais da Lei Aldir Blanc e repassar aos artistas e produtores os recursos. Do contrário, cerca de R$ 27 milhões deixarão de ser injetados na economia de Alagoas e no setor cultural.


Na última sexta-feira (18), o órgão estadual divulgou, perto da meia noite, o resultado de cinco editais: Vera Arruda, Dinho Oliveira, Zailton Sarmento, Eric Valdo e Elinaldo Barros, que contemplam diversos segmentos culturais, como teatro, fotografia, música, audiovisual e produção. Os resultados, no entanto, são questionados por artistas e produtores, na forma e no conteúdo. Até mesmo aqueles que foram aprovados no certame estão se mobilizando para cobrar mais transparência por parte do governo Renan Filho e da secretária Mellina Freitas, em relação aos recursos da Lei Aldir Blanc.


Entre os questionamentos está a finalidade cultural de empresas apontadas como selecionadas no resultado preliminar, além da ausência de evidências de que exigências do próprio edital foram cumpridas - como a divisão geográfica e cota para mulheres - além de uma série de erros nos nomes dos proponentes e até mesmo situações em que nomes de artistas comprovadamente inscritos não constam em nenhuma lista, nem como classificados, nem como inabilitados.


Além dos problemas com os editais que ainda não foram finalizados, há ainda o problema da verba que está “sobrando” nos cofres do estado. De acordo com apuração da reportagem, o que posteriormente foi confirmado pela Secult,  cerca de R$6.715.500,00 (seis milhões setecentos e quinze mil e quinhentos reais) sobrou de editais que já estão com os resultados finais divulgados.


GRANDES EMPRESÁRIOS E UM BAR RECEBERÃO VERBA EMERGENCIAL DA CULTURA

A Celebration Entretenimentos, que realiza o Réveillon Celebration, e um bar de alto padrão foram selecionados pela Secult no edital Dinho Oliveira de Produção Cultural. O Réveillon Celebration, por exemplo, receberá R$ 300 mil do dinheiro destinado à emergência no setor cultural. Já a empresa que administra o bar de alto padrão receberá R$ 100 mil reais da verba da Lei Aldir Blanc.


Além deles, a CDR Entretenimentos e nomes ligados à empresa aparecem diversas vezes como contemplados no edital emergencial, em faixas de R$ 100 e R$ 300 mil reais.


A expectativa do Fórum de Música de Maceió é que as empresas sejam desclassificadas após a fase de recursos, já que, para eles, não teriam a finalidade cultural exigida pela Lei Aldir Blanc.


“A Lei é destinada aos artistas e à cadeia produtiva que está sem infraestrutura. Por isso ficamos indignados com essas seleções. Essas pessoas estão habituadas a escrever projetos gigantes, aí chega um artista que estava batalhando, que passou o ano inteiro endividado, e tem que lutar contra uma grande estrutura para acessar um recurso que é público, que deveria ser dele”, afirma o Fórum de Música de Maceió, por meio de um comunicado.


“Não é que o Celebration não poderia participar, mas é que se trata de um erro na construção do edital. É uma empresa de entretenimento. Ele, o dono, pode ter sido até afetado pela pandemia, mas ele faz uma festa e ganha seus milhões. A gente não ganha milhões. A gente continua com os teatros fechados. Com a quantidade de casos aumentando isso vai perdurar. É justo isso? Não é justo”, continua o interlocutor do Fórum de Música, que pediu para não ser identificado.


“O que a gente gostaria é que as empresas se comprometessem em ativar a cadeia produtiva de Alagoas. Mas ele vai usar esse dinheiro, que é público, para trazer Wesley Safadão e montar um lounge vip. Para quem? Eles não são produtores, eles são empresários.”


A reportagem fez contato com a assessoria da Celebration Entretenimentos, mas, até o fechamento da edição, não recebeu um posicionamento.


ERROS NA DIVULGAÇÃO

Os resultados divulgados na última sexta-feira (18) estão disponíveis no site da Secult/AL, mas ainda não foram publicados no Diário Oficial do Estado. Portanto, ainda cabe recurso ao resultado por parte dos artistas. Na postagem em que divulga o resultado no Instagram, no perfil oficial da Secult, diversos comentários apontam erros na publicação.


Entre os erros estão: artistas que se inscreveram, mas aparecem como desclassificados por ausência de projeto; artistas que aparentemente foram selecionados, mas não têm certeza porque os nomes deles aparecem com erros ortográficos; artistas inscritos (alguns chegaram a postar o protocolo de inscrição nas redes sociais), mas que não aparecem em nenhum lista, nem como selecionados, nem como inabilitados; e, por fim, proponentes que aparecem como selecionados em diversas faixas do edital Dinho Oliveira de Produção Cultural.


“Não queremos entrar com recursos! Queremos que a @secultal retifique os erros, falhas e que peça ao menos para a equipe do @paulo.poeta [superintendente do órgão] ler o edital, antes de sair desclassificando as propostas dos artistas. O interessante é que bar da beira da lagoa e réveillon chique já estão selecionados”, diz o comentário do perfil @LeiAldirBlancAlagoas, criado, de acordo com eles, para documentar os projetos que foram prejudicados nos certames.


COTAS

A divulgação do resultado no site da Secretaria de Estado da Cultura não informa o nome dos projetos selecionados ou a adequação deles às exigências do edital feito pela própria Secult. Um critério norteador da seleção deveria ser a distribuição geográfica dos recursos. Ou seja, projetos de fora da região metropolitana também deveriam ser contemplados.


“Esperamos um detalhamento, com o nome dos projetos e a região, além do CNPJ, comprovando que a empresa está sediada naquela cidade. Há muitos empresários que se inscreveram em todas as faixas do edital de produção cultural, demonstrando uma clara falta de empatia e compreensão acerca da finalidade desses recursos. É um recurso para socorrer!”, diz a produtora Carla Farias.


MEDO DE PERDER OS RECURSOS

De acordo com levantamento realizado pela reportagem, com o suporte do Fórum de Música de Maceió, pelo menos R$ 6 milhões “sobraram” de editais que já tiveram os resultados finais publicados. Além dessa quantia, ainda entrará na conta os recursos não utilizados pelos municípios e também a verba do auxílio emergencial que não for executada pela própria Secult.


Segundo o Fórum de Música de Maceió, a lentidão com que a secretaria de cultura reagiu à Lei Aldir Blanc causou o que eles chamam de caos. Vale lembrar que Alagoas foi o último estado do Nordeste a apresentar um plano para a Lei Aldir Blanc.


“O problema em si não é o resultado. O problema é que desde o início do processo, quando a lei foi aprovada, em junho, a Secult foi deixando as coisas para o último segundo, não se programou”, pontua comunicado do Fórum de Música.


“A gente disse desde o início, sugerimos que o Estado deslocasse servidores de outras pastas para trabalhar. Porque faltou mão de obra. Quando foi a última vez que teve concurso para a secretaria de Cultura? A secretaria não tem técnicos concursados, algo importante para que ela se transforme em um órgão de Estado e não de governo. A gente já esperava esse caos. Já vínhamos avisando que isso ia acontecer”, continua.


“Todas essas coisas nos deixam apreensivos. A gente não culpa os funcionários, culpamos o governo e as pessoas que estão à frente da secretaria. Em pleno lançamento dos editais, no período eleitoral, quem assinou os editais foi uma substituta, porque Mellina Freitas [secretária de Cultura] estava ausente. Temos dúvida sobre a capacidade do Estado resolver esses problemas a tempo de pagar. É a economia que vai girar. Nos causa surpresa a maneira como o Estado está lidando algo tão grave”, conclui.


OUTRO LADO

De acordo com a Secretaria de Estado da Cultura, o resultado divulgado na última sexta-feira é preliminar e será retificado em publicação no Diário Oficial, prevista para a quarta-feira (23). De acordo com a pasta, a expectativa é que todos os recursos sejam utilizados e pagos aos artistas e produtores até o final do exercício.


“O novo resultado preliminar também irá divulgar a relação corrigida, com os recortes de cotas e territórios”, diz o órgão, por meio de nota.


Sobre a sobra de recursos, a Secult diz que um remanejamento está previsto.


“A Secretaria está finalizando os processos dos demais editais do pacote da Lei Aldir Blanc Alagoas e se constatado a sobra de recurso em virtude de vacância haverá remanejamento dos valores a fim de atendermos aqueles que tiveram maior volume de inscrições.”


Sobre a participação de grandes empresas no certame e a finalidade cultural dessas instituições, a secretaria informou que não participou da seleção.


“Os editais foram construídos com base nos diálogos realizados com todos os segmentos culturais, por meio de assembleias virtuais. Os editais foram disponibilizados para que empresas de pequeno e grande porte pudessem participar e as propostas foram analisadas por uma comissão externa, cuja decisão é independente da Secult.”

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