Tema polêmico
Academia Alagoana de Letras promove debate sobre linguagem neutra
Considerado complexo, assunto divide até especialistas no assunto; palestra na AAL será aberta ao público

Dando continuidade às ações que comemoram o ‘Ano Jorge de Lima’, a Academia Alagoana de Letras promove, na próxima quarta-feira (8), às 9h30, na Casa Jorge de Lima, a palestra “Linguagem Neutra - Abordagem linguística e jurídica”, ministrada pelo Prof. Dr. Roberto Sarmento, que dará enfoque na linguística; e pelo Prof. Dr. Marcos Bernardes de Mello, que dará enfoque na questão jurídica.
Considerado um tema polêmico, mas que vem ganhando grande repercussão devido a adesão nas redes sociais e até mesmo do cerimonial do governo federal, a utilização da linguagem neutra ou “não binária” é uma reivindicação constante de parte da comunidade LGBTQIAP+. A reivindicação é feita pelas pessoas que não se reconhecem com nenhum dos gêneros e não se sentem contempladas com os artigos femininos e masculinos, optando pela substituição do “a” e “o” por um “x”, “e” ou “@”.
De acordo com o presidente da Academia Alagoana de Letras, Alberto Rostand Lanverly, é necessário debater o tema. Levá-lo para a AAL é uma forma de promover um maior conhecimento. Lanverly ainda afirma que a intenção da palestra não é “tomar partido”, mas sim proporcionar mais esclarecimento. acerca do assunto, que divide as pessoas.
“A gente tem que se preocupar que a língua brasileira seja uma língua de todos, que atenda a todos e que seja apresentado o melhor para o povo. Ao longo dos séculos, a língua portuguesa passou por diversas mudanças e essa pode ser mais uma”, disse ele.
Recentemente, em Rondônia, o Supremo Tribunal Federal derrubou uma lei que proíbe a linguagem neutra na grade curricular, nos materiais didáticos das escolas públicas e privadas do Estado e em concursos públicos. Com isso, o Prof. Dr. Marcos Bernardes de Mello, baluarte da literatura jurídica em Alagoas, terá como foco de sua palestra a decisão do STF e as consequências trazidas para a sociedade.
“É uma violação da língua portuguesa! Na palestra, irei falar sobre minha visão, pois, para mim, a decisão do STF com a Lei de Rondônia foi errônea, não há nenhuma inconstitucionalidade. A língua é um pilar da nação e quero chamar atenção para os aspectos jurídicos”, disse ele.
Apoiador do uso da linguagem neutra, o professor da Universidade Federal de Alagoas e coordenador do grupo de estudos em Linguística Aplicada/Queer em Questões do Sertão Alagoano, Ismar Inácio, afirma que é preciso pensar nas pessoas que não se reconhecem nem no gênero feminino e nem no masculino.
“A ‘linguagem neutra’ neutralizaria a binariedade de gênero nos usos linguísticos. Ou seja, ao invés de ‘menin-o’ ou ‘menin-a’, usamos ‘menin-e’”, diz.
“É importante considerar que essa ideia de neutra vem dos próprios sujeitos que reivindicam esses novos usos linguísticos na nossa língua. Ou seja, não é uma nomeação advinda das pesquisas acerca da temática. Essa observação é importante, porque consideramos essa reivindicação como válida.”, explicou o docente.
Segundo ele, para se construir um mundo respeitoso é importante reconhecer “todes es sujeitos”, principalmente dentro do Brasil, que por 14 anos seguidos é o país que mais mata pessoas trans e travestis.
“Entendemos que quem discorda do uso da linguagem neutra, na verdade discorda e se afasta de toda e qualquer transição de gênero, qualquer suposta infração de gênero, qualquer dissidência de sexualidade, discorda de qualquer afastamento da norma, da binariedade de gênero”, opina o professor.
Em contrapartida, a professora de língua portuguesa e literatura, Maria Beatriz Brandão Sá, acredita ser improvável a incorporação da linguagem neutra à Língua Portuguesa de forma espontânea e de forma orgânica.
“O uso recorrente é quem determina as modificações e evoluções de uma língua. Acredito que a linguagem neutra virou modismo nas salas de discussão; e que, daqui a alguns anos, continuará no patamar de neutralidade que atende apenas aos conceitos de gênero”, explica.
“Vejo a linguagem neutra como uma variação linguística social, justamente porque não pretende abolir os indivíduos, mas contemplá-los em suas diversidades, portanto, inclusiva no que objetiva ser. O problema está na exclusão dos deficientes visuais, por exemplo, porque não temos escrita própria e devidamente sinalizada para esse entendimento por esse segmento populacional. Ou ainda pelos deficientes auditivos, quando ocorre o seu emprego na linguagem oral, porque não existe na Linguagem Brasileira de Sinais os movimentos tradutores do Sistema ILE, por exemplo, nem do @ tão usado entre os usuários dos meios digitais”, conclui Maria Beatriz.
A discussão é aberta ao público e visa aproximar a população das ações da Academia Alagoana de Letra.
* Sob supervisão da editoria de Cultura.