Para Vigo Me Voy!
Cacá Diegues é homenageado em Cannes com documentário inédito
‘Para Vigo Me Voy!’, sobre a trajetória do cineasta alagoano, estreou na seção Cannes Classics


Poucos nomes brasileiros tiveram uma relação tão longeva e simbólica com o Festival de Cannes quanto Carlos Diegues. Em 2025, meses após sua morte, o cineasta alagoano voltou à Croisette, desta vez como personagem central de um documentário que reverencia sua obra e sua vida. Para Vigo Me Voy!, dirigido por Lírio Ferreira e Karen Harley, foi exibido com honras na seção Cannes Classics, dedicada a filmes históricos e documentários sobre grandes artistas do cinema mundial.
A escolha de Cannes para a estreia não poderia ser mais coerente. Diegues, cofundador do Cinema Novo, foi presença constante ao longo das décadas no festival francês: teve oito de seus dezessete longas exibidos em diferentes mostras, entre elas três passagens pela seleção oficial competitiva — com Bye Bye Brasil (1980), Quilombo (1984) e Um Trem para as Estrelas (1987). Também foi jurado da principal competição em 1981, e participou da Semana da Crítica, da Quinzena dos Realizadores e de sessões especiais.

O documentário, produzido por Diogo Dahl, é uma viagem audiovisual por mais de seis décadas de cinema, atravessando o país que Diegues filmou com beleza e contradição. A partir de entrevistas raras, trechos de filmes e imagens inéditas, Para Vigo Me Voy! reconstitui o percurso de um artista que soube transformar as urgências do tempo em linguagem cinematográfica. “É uma grande aula de cinema brasileiro”, resume o produtor. “Mais de 60 anos atravessando a história do país, desde o Brasil Colônia. E não é apenas sobre Cacá. São muitos artistas que marcaram época”.

O filme costura falas do próprio Diegues com memórias e cenas de sua última filmagem, Deus Ainda É Brasileiro, um tipo de continuação do sucesso de 2003. Há também registros de sessões especiais como a exibição de Bye Bye Brasil na Favela do Vidigal, além de encontros com artistas e parceiros de trajetória — de Antonio Pitanga e Sonia Braga a Chico Buarque e Gilberto Gil. O título do longa vem de uma canção que atravessa a narrativa e, nesta versão cinematográfica, é interpretada por Ney Matogrosso ao lado do grupo Pife Muderno.
Para Karen Harley, que dividiu a direção com Lírio Ferreira e foi montadora de Tieta do Agreste (1996), o documentário é também um gesto carinhoso. “É um filme de delicada costura entre suas últimas conversas, sua extensa e diversa filmografia e um vasto material de arquivo. Combina profundidade humana, relevância social e estética cinematográfica”, afirmou. Diegues foi, para ela, mais que um mestre do cinema, foi “um mestre da vida”.