LUTO NA CULTURA
O silêncio da sanfona: Alagoas perde Xameguinho, mestre do forró
Ícone nascido em Atalaia morreu ontem, aos 62 anos; legado de meio século formou gerações e levou a música alagoana para o mundo


Sebastião José Ferreira Maximíno, o Xameguinho, um dos mais respeitados sanfoneiros de Alagoas e referência nacional no universo do forró, morreu nessa segunda-feira (30), aos 62 anos, em Maceió. A causa provável, segundo familiares, foi um infarto sofrido em casa, durante a madrugada.
Natural da cidade de Atalaia, Xameguinho tinha mais de meio século dedicado à música. Começou a tocar aos 12 anos, motivado pelo pai, que trouxe para casa um rádio onde o garoto descobriu sons que o acompanhariam pela vida inteira: Luiz Gonzaga, Trio Nordestino e Jackson do Pandeiro. A paixão musical foi precoce e intensa, como ele mesmo recordou certa vez em uma entrevista ao G1 Alagoas: “Eu já tinha uns 12 anos quando ele comprou uma outra sanfoninha, e eu já conseguia fazer algo parecido com aquilo que eu ouvia. No outro dia, ele saiu pelo povoado dizendo que eu sabia tocar. Quando foi à noite encheu de gente lá em casa para me ver tocar. Eu me escondi dentro das bananeiras, porque eu não sabia”, relembrou Xameguinho.
Desde aqueles primeiros acordes, o músico cresceu em talento e prestígio. Ao longo da carreira, compôs arranjos para grandes artistas como Geraldo Cardoso, Mestre Zinho, Kara Veia e Mano Walter. Seu reconhecimento ultrapassou fronteiras, chegando a palcos da Europa, consolidando-o como um dos maiores nomes da sanfona brasileira.
A notícia da morte do artista gerou comoção profunda no meio musical alagoano. Joelson dos Oito Baixos, também mestre sanfoneiro e amigo próximo, descreve a perda com pesar profundo e sincero: “Chameguinho era um grande sanfoneiro, um grande acordeonista. Uma pessoa nota 10. Todo mundo considerava ele, todo mundo amava. Era um menino de ouro, parecia uma criança. Muito bom, muito puro”, lembra Joelson, emocionado.
A amizade entre os dois era marcada pela música e momentos descontraídos. “A gente andava junto demais, tomava muito uísque junto, farrava muito. Não consigo nem falar, fico emocionado”, acrescenta Joelson, que, por razões médicas, não pôde ir ao velório, mas fez questão de manifestar solidariedade diretamente à família.
Nome destacado da nova geração do forró, Anderson Fidellis tem no encontro com Xameguinho uma marca pessoal e profissional significativa. Para ele, a generosidade do mestre abriu caminhos fundamentais:
“Xameguinho é um tipo de artista que aparece para criar um espaço. E foi isso que ele fez. Criou o seu ambiente, criou o seu jeito de trabalhar e influenciou muita gente com isso. Inclusive eu”, explica Fidellis.
O jovem artista ainda recorda, com leve humor e profundo respeito, os ensinamentos que recebeu no estúdio onde Xameguinho sempre oferecia a sanfona como instrumento acessível a quem estivesse disposto a aprender.
“Às vezes ele aparecia de surpresa no estúdio e eu me avexava. Levava um susto. Pensava: ‘Meu Deus do céu, tô aqui gravando uma coisinha e, de repente, tem Xameguinho observando’. Eu errava, errava muito, mas corrigia depois. E ele sempre ali, dando aquela força.”
Na visão de Fidellis, o legado de Xameguinho transcende palcos e gravações: “Ele deixa esse legado do ensino, do cuidado, do amor. É uma coisa que está fazendo falta hoje: o apoio da geração mais veterana”, pontua.
O velório de Xameguinho ocorre desde as 14h de ontem. O enterro está marcado para as 9h desta terça-feira (1º), na Capela 3 do Campo Santo Parque das Flores, em Maceió.