'SANKOFA'
Mostra no Museu Palácio Floriano Peixoto reúne esculturas e instrumentos que celebram a memória coletiva afro-brasileira
O Museu Palácio Floriano Peixoto (Mupa), no Centro de Maceió, se transforma em território de memória, arte e resistência


A exposição “Sankofa – Sou quem foram todos antes de mim!”, do artesão e luthier alagoano Rodrigo Arapuá, propõe uma imersão sensível e potente na ancestralidade afro-pindorâmica por meio de instrumentos musicais e esculturas entalhadas em madeira.
Com mais de 15 anos de trajetória, Rodrigo reúne peças que carregam histórias e espiritualidade.

“Cada instrumento que construo é um mensageiro. Eles falam de quem eu sou, mas também de quem veio antes. O som de um agogô, o corpo de uma rabeca, a boca de uma carranca… tudo tem memória”, afirma o artista.
Nascido Rodrigo Pedrosa de Freitas, ele cresceu entre festas populares, rodas de capoeira e sambas de roda. O aprendizado, conta, começou em casa.
“Meu avô era um fazedor de coisas. Já meu tio e meu irmão mais velho me mostraram como trabalhar com madeira. Mas o primeiro instrumento eu fiz sozinho, ainda adolescente. Peguei o que tinha, errei muito, mas entendi que aquilo era meu caminho.”

Hoje, aos 36 anos, Arapuá é um dos nomes mais promissores da luthiaria ancestral em Alagoas. Seu trabalho mistura técnica, escuta e espiritualidade.
“A madeira fala. Antes de cortar, é preciso conversar com ela. Sentir o tempo certo de cada peça. Eu não fabrico instrumentos — eu acolho sons que já existem no mundo”, explica.
O nome da exposição vem do termo africano “Sankofa”, que significa “voltar para buscar o que ficou para trás”. A escolha não foi por acaso.

“É um chamado. Vivemos em um país que tenta nos desconectar das nossas origens. Com essa exposição, eu digo: ‘estou aqui, mas também fui lá’. Carrego meus ancestrais comigo. Sou quem foram todos antes de mim.”
As peças expostas vão de djembês a calimbas, de bongôs a rabecas, passando por esculturas como carrancas e objetos de uso ritual. Para Arapuá, essas criações não são apenas belas — são vivas.
“Quando alguém toca um xequerê meu, está tocando também uma história. É som, é cura, é afirmação.”
PROGRAMAÇÃO CULTURAL
Durante os dias de exposição, o Mupa também será palco de apresentações culturais que integram a proposta da mostra:
29/07, às 9h – Kizomba Cultural – Musicalidade Regional, com Mestre Gama, Gama Júnior, Mestre Wilson Santos, Daniel Ginga e Rodrigo Arapuá.
30/07, às 14h – Intervenção Poético-Musical, com Abides Oliveira, Gi Silva e Arapuá.
31/07, às 9h – Pagode Alagoano / Coco de Roda, com Os Verdelinhos, Comunidade Azul e Arapuá.
“A programação também é parte da exposição. Porque Sankofa não é só ver. É ouvir, sentir, dançar. É se permitir reencontrar com aquilo que sempre foi nosso”, afirma.
Em entrevista à Gazeta sobre o que espera do público que visitar a mostra, Rodrigo responde com simplicidade e afeto: “Se uma criança preta passar por aqui, ouvir o som de uma rabeca e se encantar, eu quero que ela saiba: aquilo também é dela. Que ela pode criar, tocar, entalhar o mundo com as próprias mãos”.