Cidades
Riqueza e mis�ria contrastam em bairro de Macei�

EDNELSON FEITOSA Jacarecica é hoje um bairro de contrastes. De um lado, a riqueza das mansões e dos carros de luxo; do outro, a miséria de pessoas que circulam, vivem e comem do lixo. Gente sem esperança e com medo de perder sua última e única fonte de subsistência: o Lixão da Cobel, ameaçado de transferência pelo poder público. Os catadores de lixo são pessoas simples, transparentes em seus sentimentos. Não existe raiva ou ressentimento pela vida paupérrima que levam. Dona Antônia Paulo dos Santos, 42, que há oito anos mora na favela do Lixão, não tem o menor constrangimento de afirmar que come lixo e mostrar duas panelas cheias de peixe que apanhou no Lixão na última quarta-feira. Faz mal não. Jamais uma pessoa daqui morreu porque comeu alguma coisa de lá, argumentou ela. No barraco onde reside, vivem outras 14 pessoas marido, filhos e netos. Para fartar tanta gente, precisa apanhar comida em grande quantidade. Não falta o que a gente comer. Peguei peixe e macarrão (que os supermercados jogam no lixo, em virtude de estar com prazo vencido). Todo dia faço isso, continuou ela. Ana Lúcia dos Santos, 29, é outra favelada que sobrevive do Lixão da Cobel, onde chegou há mais de cinco anos para morar com o marido e cinco filhos menores. O barraco foi construído com madeira, apanhada lá mesmo no Lixão, e barro. Gastei apenas com as telhas, afirmou. Ela avalia ter gasto cerca de R$ 800,00 e se diz feliz por ter onde viver, pois estava passando fome em São Miguel dos Campos, sua cidade natal. Manoel Odilon Ferreira da Silva, 46, começou agora a catar lixo, faz pouco mais de seis meses. Veio da zona rural de São Miguel dos Campos, onde cortava cana, para a casa de seu irmão José, um catador de lixo. Trabalho por lá está cada vez mais escasso, declarou ele, referindo-se à área canavieira. Aqui, temos o que comer e dá para conseguir mais ou menos R$ 50,00, por quinzena, assegurou ele. Zezinho, de um ano, observa a presença da imprensa sem entender nada. Segura um pedaço de peixe que tinha acabado de ser preparado pela avó Antônia. Chora com a presença do fotógrafo. Cícero, de 7 anos, que mora na casa vizinha, indiferente à reportagem e com um pedaço de folha de revista, faz um avião para brincar. Parecia ignorar até a demora de sua mãe, Josefa, em preparar o almoço daquele dia: peixe, arroz e farinha, para a família uma verdadeira fartura. Júlio Verçosa dos Santos, que compra lixo dos catadores, há quatro anos também mora na favela. Ele reclama da Prefeitura de Maceió, alegando que os trabalhadores de lixões são respeitados em todos os estados. Somente aqui é que somos tratados como animais, não recebemos uma casa, mesmo que modesta, e ainda sofremos ameaças de sermos afastados de nosso meio de sobrevivência. Ele garante que a maioria das quase 300 famílias que hoje ocupam a favela do Lixão vai morrer de fome, se forem retiradas do local proposta que se encontra em estudo pela prefeita Kátia Born. Os outros vizinhos do Lixão da Cobel, que moram em mansões avaliadas em meio milhão ou mais , não discutem a questão, pelo menos com os miseráveis da área ou mesmo a imprensa. Eles são empresários, políticos e fazendeiros. Anônimos por opção, preferem declarar ser um absurdo a presença do Lixão naquele local, por causa dos problemas de saúde que podem afetá-los, defendendo sua mudança imediata para um lugar bem longe daquele bairro, que está se transformando numa das áreas mais nobres de Maceió.