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Reserva de mata atlântica é dizimada

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| FERNANDO VINÍCIUS Repórter Maragogi - Queimadas e desmatamentos estão acabando com o pouco que resta da mata atlântica na zona rural de Maragogi, município do litoral norte de Alagoas com o maior número de assentamentos no Estado. São 16 áreas oficialmente destinadas ao programa de reforma agrária e mais 14 acampamentos de agricultores sem-terra à espera da conclusão de processos que terminem por lhes garantir um pedaço de terra para plantar. A esperança de trabalhar no campo esbarrou em obstáculos como assistência técnica irregular e falta de infra-estrutura, problemas encontrados no começo do processo de reforma agrária na região. Sem condições de honrar os financiamentos contraídos com as instituições financeiras devido ao baixo retorno dos investimentos, quase 100% dos assentados ficaram endividados com os bancos do Nordeste e do Brasil. O retorno ao extrativismo foi a alternativa encontrada por alguns, retirando ilegalmente madeira para comercialização e fabrico de carvão. Excluindo os acampamentos, mais de 1.300 famílias vivem espalhadas em lotes e agrovilas dos assentamentos que ocupam partes dos 31 mil hectares de terras da zona rural de Maragogi. Durante a última semana, a Gazeta levantou a situação nas reservas de mata que ainda existem. Somente em Mangebura o percentual de 20% de manutenção da floresta nativa, meta estabelecida pelo Código Florestal, é mantido, provavelmente porque dos 610 hectares que compõem o assentamento, entre 100 e 150 ainda são cobertos por matas, justamente as mais procuradas por serem as maiores do município. Ofício ilegal Amaro José Leão de Oliveira tem um lote em Mangebura há 3 anos. Ele conta que tem gente de fora e também do próprio assentamento que deixa de plantar para ir desmatar. Ele até admite que houve uma diminuição da atividade ilegal quando a fiscalização do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária de Alagoas (Incra) apertou, mas o desrespeito à necessidade de conservação do ecossistema persiste. Não é todo dia, mas que ainda tem gente que vive disso tem, assegura Amaro. O parceleiro, denominação para o agricultor beneficiado com um lote, acrescenta que durante as reuniões na associação de moradores são feitos apelos para evitar esse tipo de problema, mas a coisa tá meio difícil por causa do tempo de escassez, disse Amaro. ### Fogo deixa marcas por todos os lados Maragogi - A escassez de chuva inviabiliza o plantio e favorece a propagação do fogo no mato ressecado pelo sol do verão nordestino. Os sinais são evidentes ao longo das estradas que cortam a zona rural de Maragogi. Há marcas de queimadas por todos os lados. O clima torna-se propício para devastar os resquícios de mata atlântica encontrados principalmente nas encostas e no alto dos morros que compõem a geografia local. Entre os que têm necessidade e os que praticam a queimada por maldade, todos saem perdendo, até os que dizem que a mata não vai se acabar, opinião comum entre os agricultores, principalmente os mais velhos. Um flagrante da cultura que não acredita no esgotamento dos recursos naturais aconteceu na última semana durante visita do assegurador ambiental do Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra), Neider Jatobá. Ele esteve no assentamento São Pedro para conferir a destruição de parte da reserva legal, denunciada pela Gazeta na edição de domingo passado, acompanhado pelo técnico agrícola José Vasconcelos Júnior, autor da denúncia. Quando os dois chegaram ao local encontraram Paulo Xavier da Silva recolhendo carvão de uma caieira e preparando outra, já com toda a madeira cortada, pronta para ir ao forno. Impedido de fugir, Xavier confessou que vive de vender carvão e que participou de diversas queimadas em outros assentamentos. Segundo ele, o interessado em se apropriar da área de reserva para transformá-la em lavoura ou pasto o contrata para tocar fogo na mata. Xavier limpa o pedaço destruído, separa a madeira que será comercializada e tem direito a fazer carvão com o que restar. No assentamento São Pedro, o sistema iria render a Xavier mais de 50 sacos. Ele declarou que vende cada um - com peso médio de 50 kg - por apenas R$ 5. Apesar de lamentar a perda das vendas já acertadas em Porto Calvo, Xavier assegura que não vai mais fazer carvão. A garantia verbal do assentado, que mora sozinho em um lote no Espírito Santo, foi suficiente para o funcionário do Incra. Segundo Xavier, ele não foi multado e nem assinou qualquer documento, sofrendo apenas uma repreensão verbal. FV ### Impunidade castiga mãe natureza De acordo com a legislação pertinente, a prática de crime ambiental é considerada um crime de qualquer ordem, passível de punição e detenção. Para Ricardo Ramalho, presidente do Movimento Minha Terra (MMT), uma organização não-governamental que incentiva o manejo ecologicamente correto na agricultura, o técnico do Incra que flagrou Paulo Xavier da Silva recolhendo carvão de uma caieira no assentamento São Pedro deveria ter lavrado um auto de infração e comunicado o fato à polícia, medidas que não foram tomadas. Ramalho explica que, além da conservação de pelo menos 20% de mata nativa, existem as Áreas de Preservação Permanente - nascentes, cursos dos rios e encostas cobertas por vegetação - que precisam ser protegidas do risco de destruição. Ele considera ineficiente a atuação dos órgãos federais diretamente envolvidos na questão. O gerente-executivo do Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) em Alagoas, Osvaldo Sarmento, alega dificuldades para fiscalizar o Estado. Nós temos apenas 12 fiscais para atender todo o nosso território e estamos em época de defeso do caranguejo e da piracema, o que dificulta mais ainda a manutenção dessas atividades, que exigem deslocamentos constantes. Sarmento também alega dificuldades de acesso aos assentamentos e alerta para os cuidados relacionados à segurança dos funcionários que fazem a fiscalização, geralmente acompanhados por técnicos do Incra a pedido do próprio Ibama. Sobre a situação na zona rural de Maragogi, Sarmento declarou será dada uma atenção especial ao município. LAMENTO Ignorando a possibilidade de punição, os inimigos da natureza seguem destruindo a mata atlântica. A fumaça na reserva do assentamento Água Fria foi percebida por volta das 13h da última terça-feira pelo agricultor Antônio Pedro da Silva. Chamei minha mulher, os meninos e mais uns amigos para tentar apagar o fogo. Só saímos de dentro da mata quando já era de noite. O esforço do grupo de 8 pessoas não foi suficiente. O incêndio voltou a acontecer no dia seguinte, quando todos voltaram à mata para tentar impedir sua propagação. Antônio Pedro acredita que o incêndio deve ter começado em Itabaiana por malvadeza, levado pelo vento até o assentamento vizinho, atingindo inclusive parte de uma plantação irrigada de banana resistente à sigatoka-negra, uma praga de cura desconhecida, experimento patrocinado pela Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (Embrapa). E só não acabou com a plantação toda e o equipamento de irrigação porque o vento mudou de posição. Se não fosse isso, até a bomba que fica lá embaixo ia ser atingida, lamentou. Seguindo o rastro de destruição, a paisagem em cima do morro é desoladora. O pequeno vale está queimado nos dois lados, formando grandes manchas negras nas encostas que antes tinham algum tipo de vegetação. FV ### Nascentes e leitos de rios agonizam A bióloga Idalina da Silva Ribeiro alerta para a destruição das nascentes e dos leitos dos rios por causa do assoreamento decorrente da destruição das áreas de reserva. Sem vegetação nas encostas, a terra desce com a chuva para o curso natural das águas. O impacto é muito forte e a tendência é de que dentro de dois, três anos não exista mais nascente onde houve desmatamento, explica Idalina. Devastar é crime, não importa se é assentado, deputado ou empresário. Dá cadeia e o certo é ser preso, diz a bióloga. A adoção de punições severas é defendida como forma de coibir a destruição em curso. Gérson Santiago Ramos, presidente do assentamento São Pedro, responsabiliza o parceleiro conhecido como Tonho do Baluá pela devastação de parte da reserva onde Paulo Xavier foi flagrado fazendo carvão. A lei diz que o assentado pode até perder o lote se praticar crime contra a natureza. No dia em que isso acontecer, acredito que as coisas podem mudar, avaliou. O coordenador do Fórum de Desenvolvimento Local Sustentável (Fdlis) Comunidade Ativa, Pedro Jeová Albuquerque, lembra que agenda local apresentada em 1998 identificava a necessidade de Maragogi ter a presença da polícia florestal. Um acordo de cooperação entre a prefeitura e a Polícia Militar trouxe para a cidade um pequeno efetivo, com todos os gastos pagos pelo administração municipal. Também contamos com a parceria do Projeto Recifes Costeiros, que dividia sua base com a unidade florestal, informou Jeová. A cooperação foi mantida durante cerca de um ano, desfeita por causa dos altos custos relativos à manutenção de todos os gastos, exceto salário dos policiais. |FV

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