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Ex-modelo conta como voltou ao crime

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| CARLA SERQUEIRA Repórter Prostituta, Maria Quitéria Kika da Silva, 23 anos, amamenta o terceiro filho, João Vitor - 15 dias de nascido - atrás das grades do Presídio Santa Luzia. Presa após assaltar, ainda grávida, um restaurante e roubar um carro com dois rapazes, no último dia 19, na Via Expressa, ela teve, há 10 anos, chances de deixar as ruas. Aos 12, foi acolhida pelo Instituto Catarse. Meses depois, desfilava nas passarelas da moda. Na última quarta-feira, a Gazeta conversou com Kika. Ela concedeu entrevista com o filho nos braços e contou por que largou a breve carreira de modelo para voltar aos guetos. Me sentia uma formiga no meio de um monte de ?escorpião?, disse das glamourosas festas que participou. Durante um ano, Kika fez mais de 40 desfiles, ganhou roupas de butiques caras, recebeu o carinho de uma nova família, mas afirma que nunca recebeu cachê. Deixei tudo para viver com ele. Hoje me arrependo. Ele é José Marcos da Silva, 27 anos, fugitivo do sistema prisional. Ainda criança, ela o conheceu na Praça dos Martírios. Marcos também foi acolhido pelo Catarse. Chegou a trabalhar numa serigrafia. Há 4 anos, assassinou uma pessoa e foi condenado. Conseguiu fugir no mês de janeiro e localizou Kika no Vergel, onde dividia o aluguel com uma amiga, também prostituta. Estava no oitavo mês de gestação. Ele me falou que precisava roubar um carro e me mostrou um revólver. Dias depois, Marcos voltou a procurá-la. Veio com um amigo. Me deu dois rufinol, um remédio que dá coragem para fazer coisa ruim. Tomei, pegamos um ônibus. Na cintura, Marcos levava a arma. Perto da Federal (posto da Polícia Rodoviária Federal, na Avenida Durval de Góes Monteiro), ele disse para a gente descer. A escolha do alvo foi aleatória. Entramos num bar qualquer. Paguei duas cervejas. Chegou um coroa e ele apontou o revólver. Pegou a carteira, o celular e a chave do carro. Os três saíram em alta velocidade pela BR-316. Uma viatura nos seguiu. O dono do carro estava dentro. Ele apertava o alarme e o carro travava. Corri para o mato, mas me pegaram. Eu disse que a arma era minha para livrar o Marcos, que era fugitivo. Marcos e o amigo, Carlos Eduardo Mendes da Costa, 19 anos, ficaram na Delegacia de Roubos de Veículos. Kika ficou na Delegacia de Proteção à Mulher até sentir as contrações. Deu à luz no sábado, dia 21, na Maternidade Santa Mônica. Agora ela aguarda a sentença do juiz. Kika disse que o primeiro filho, Mateus, é de um homem que conheceu em Salvador. De carona, ela e uma amiga foram se prostituir na capital baiana. Voltou, depois de 4 meses, grávida. Hoje a criança tem 7 anos. Foi adotada. O segundo, Maxwel, é do Marcos, mora com uma senhora na Brejal. Eu pagava para ela cuidar dele, mas faltou dinheiro. Ele mora com ela agora. O mais novo é de um homem que conheceu no bar onde se prostitui, no Mercado. Este eu quero criar quando sair daqui. ### Faltam abrigos para os jovens de rua Na casa de Maria de Lourdes Rodrigues Moura, 47 anos, Maria Quitéria Kika da Silva morou por mais de 4 anos. Quando ela disse que ia embora tomei um choque. Ela tinha tudo: professora particular de Matemática e Português; freqüentava a academia Formafit, uma das mais luxuosas da cidade; tinha um quarto só para ela. Não sei o que faltou. Talvez tenha sido um emprego mais seguro. Não era sempre que tinha desfile, disse Lourdinha. Sobre os cachês, o fotógrafo André Fon, dono, na época, da agência de modelos Fox, garantiu que não deixou de pagar a Kika nenhuma vez. É lamentável que ela minta. Kika recebia o melhor cachê entre as modelos. Todas as vezes recebeu. Acredito que ela esteja querendo buscar uma forma de justificar o erro que cometeu e, por isso, esteja mentindo, disse ele. Kika, por sua vez, insistiu em dizer que nunca recebeu nada em dinheiro. Talvez se eu tivesse recebido alguma coisa, não tivesse deixado a passarela, afirmou, mesmo dizendo que hoje não sente vontade de voltar a trabalhar com moda. Me senti muitas vezes à-toa no meio da gente rica. A falsidade é muito grande. Tenho certeza que ganharam muito dinheiro nas minhas costas, acredita. Já André Fon afirma que não teria motivos para enganar a imprensa. Kika explicou como Marcos, então namorado dela, a convenceu de largar Lourdinha e os desfiles para morar com ele nas ruas novamente. Ele me dizia que moda não era para mim, que não iria dar certo. Dizia que eu não sabia falar. Eu gostava muito dele e aceitei ir morar com ele. Dei minhas roupas aos travestis e saí de casa. Sinto saudades de Lourdinha, revelou. Quando eu sair daqui, vou pedir ajuda a ela e ao Walmar (diretor do Instituto Catarse). Eles foram para mim o pai e a mãe que não tive. Quem me criou foi o mundo, disse, sem acreditar na possibilidade de encontrar um emprego. Quem vai me querer agora, depois que fui presa?, questiona. Quero sair para me prostituir e pagar o leite de meu filho. Assalto é barra pesada, é para homem. Números da miséria A professora Cláudia Malta, coordenadora do Núcleo Temático da Criança e do Adolescente da Universidade Federal de Alagoas (Ufal), revelou dados da última pesquisa feita pela instituição, em 2004, nas ruas de Maceió. Foram entrevistados 196 pessoas, entre elas, 75,5% são meninos e 25,5% meninas de rua. 70% deles têm entre 12 e 17 anos, e 30%, entre 6 e 11 anos. 54,1% estudam e 45,9% estão fora da escola. Este dado é muito preocupante porque em 2000 o percentual de meninos de rua excluídos da rede pública de ensino era 41%. Desta forma, houve o significativo aumento de 6%, o que demonstra que a política educacional está ignorando estas pessoas, avaliou Cláudia Malta. Do total de entrevistados, 61,2% trabalham nas ruas e 27% já foram presos pelo menos uma vez. Se eles foram presos, liberados e estão de novo nas ruas, a gente conclui que na área da infância e da adolescência, as políticas públicas de proteção passam ao largo dos necessitados, diz ela. Tem adolescentes nas ruas que já foram presos mais de 10 vezes. Cadê a cobertura do Estado? Direitos garantidos por lei não são respeitados. A última contagem de meninos e meninas de rua feita pela Ufal foi em 2002. Naquele ano, durante a manhã, 1.160 crianças e adolescentes foram vistos mendigando. Na noite, eram 320, e, na madrugada, 156. Os meninos encontrados na madrugada são os que realmente não têm família e dormem nas ruas. Não é muita gente. Se existissem políticas sérias, eles poderiam estar longe da marginalidade. Mas o que existe são programas fragmentados. Hoje, não existe abrigo para os jovens de rua, por exemplo, criticou. |CS ### Guardião tenta integrar famílias pobres FÁBIA ASSUMPÇÃO Repórter Há sete anos, Marcos Vieira da Silva, 23, ganha a vida limpando pára-brisas dos carros no cruzamento da Rua Tereza de Azevedo com a Avenida Fernandes Lima, no Farol. Casado, com cinco filhos, ele começou a trabalhar na rua aos 16 anos. Por dia, arrecada entre R$ 20,00 e R$ 25,00, o que lhe rende mais de um salário mínimo por mês. Só que a gente não é fichado. Mas, como falta emprego e a gente não tem estudo o jeito é ficar na rua, comenta. Assim como Marcos, pelo menos 385 pessoas em Maceió - entre crianças, adolescentes, adultos e idosos - vivem em situação de rua, como aponta uma pesquisa realizada pelo Movimento de Meninos e Meninas de Rua e o Centro Erê. Elas sobrevivem limpando pára-brisas nos semáforos, mendigando ou simplesmente perambulando pelas ruas. São essas pessoas o alvo do Projeto Guardião da Cidadania, desenvolvido em parceria pelas secretarias municipal e estadual de Assistência Social. Com um custo de R$ 70 mil, dividido entre Estado e município, o projeto tem com objetivo promover a inclusão social dessas pessoas. A secretária municipal de Assistência Social, Elisabete Marques, diz que o projeto está inserido no contexto do Sistema Único de Assistência Social, que deixa de lado a política assistencialista para promover a inclusão social das famílias. Para atingir esse objetivo, para cada segmento a ser atendido é dado um encaminhamento, tendo com foco a família. É o caso das crianças, adolescentes e adultos que trabalham hoje limpando pára-brisas nos semáforos. Segundo a secretária, existem hoje cerca de 85 limpadores de pára-brisas nas regiões do Farol, Centro, Jaraguá e orla marítima, onde se concentra o maior número de pessoas em situação de rua. Eles não serão retirados das ruas, mas passarão a trabalhar de outra maneira. Vão atuar como guardiões de trânsito, distribuindo panfletos educativos. Vinte deles já estão participando de uma capacitação na Superintendência Municipal de Controle do Convívio Urbano (SMCCU), um dos órgãos que estão dando apoio ao projeto. Cada um vai passar a receber um salário mínimo. Elisabete reconhece que muitos deles arrecadam mais pedindo dinheiro aos motoristas, mas diz que se as pessoas negarem, vai desestimulá-los. Segundo ela, o projeto visa também garantir a cidadania a essas pessoas, já que a maioria não tem documentos pessoais. Mas os desafios serão grandes. A resistência em aderir também é grande entre os meninos e meninas de rua - principalmente entre os de maior idade. Elisabete Marques salienta que 97% dos meninos e meninas de rua são usuários de droga, como a cola de sapateiro, a maconha e o crack. E cerca de 35 meninas que vivem na rua estão grávidas. A secretária afirma que primeiro passo será oferecer tratamento a esses meninos e meninas, partindo em seguida para o acompanhamento e o acolhimento. Para isso, duas ações serão fundamentais: a instalação de uma unidade de saúde e a instalação de uma Casa de Passagem. A sede do projeto vai funcionar no antigo Centro Social Urbano da Jatiúca e vai contar com o apoio de mais de 35 entidades, entre empresas, órgãos municipais, ONGs que ajudarão na manutenção e ampliação das ações do projeto. sintonia O secretário-executivo de Inserção e Assistência Social, Jurandir Bóia, disse que as divergências políticas entre Estado e município estão sendo deixadas de lado para execução do Guardião da Cidadania. Segundo ele, pelo menos no que diz respeito ao projeto está havendo uma perfeita sintonia entre as secretarias estadual e municipal de Assistência Social. O secretário reconhece que o projeto enfrenta resistência de alguns segmentos, a exemplo dos meninos e meninas de rua que vivem na Praça Floriano Peixoto. Jurandir Bóia diz que alguns deles estão participando de atividades durante o dia no Complexo Humberto Mendes, mas que outros não aderiram ao projeto. Jurandir Bóia salienta que como ainda não há um local para abrigá-los, os meninos continuam dormindo na praça à noite, mas garante que essa realidade será modificada quando for instalada a Casa de Passagem, uma masculina e outra feminina. O governo do Estado também pretende reestruturar o Humberto Mendes para dar retaguarda ao Guardião da Cidadania. O projeto está orçado em R$ 1,6 milhão e deve ser financiado pelo Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. O objetivo é tornar a unidade um centro de referência no sistema de proteção social de média e alta complexidades. Atualmente, a unidade atende apenas 47 pessoas, mas tem capacidade operacional para abrigar até 300.

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