A taxa de mortalidade infantil é o indicador mais sensível para avaliar como um estado cuida das suas crianças e revela que mais de 70% dos óbitos ocorrem até o 28º dia de vida, reflexo de pré-natal, parto e pós-parto que não atendem satisfatoriamente a demanda. Nesse sentido, Alagoas tem um longo caminho pela frente para oferecer esse direito às mães e aos pequenos. Até porque de cada mil nascidos, mais de 17 não chegam a completar cinco anos de idade e 14,5 morrem antes um ano de vida.
Na avaliação da especialista em saúde infantil que atua no Fundo das Nações Unidas para a Infância (Unicef), o fato de Alagoas concentrar a maioria dos serviços de alta complexidade na capital, obriga pacientes de alto risco a buscar atendimento fora de suas cidades, um trajeto que pode custar a vida do filho e da mãe. Então, a maioria das mortes de crianças que acontece nos primeiros dias estão relacionadas a falta de condições favoráveis para o pré-natal, parto e pós-parto. A regionalização dos serviços não atende plenamente às necessidades da população alagoana.
“O desafio hoje de Alagoas, como no Brasil todo, é em relação a mortalidade neonatal, que ocorre até o 28º dia de vida da criança e que é responsável por mais de 70% das mortes no período. E, a maioria das mortes, acontece nas primeiras 24 horas, em função de questões relacionadas ao pré-natal, condições do parto e pós-parto. Aí é que está o grande desafio do estado”, explica a médica Jane Santos, especialista em Saúde Infantil da Unicef.
Os dados mais recentes – de 2017, do Datasus do Ministério da Saúde – apontam que de cada mil crianças que nascem em Alagoas, 14,5 morrem antes de completar 1 ano de vida. "O Unicef participou profundamente do esforço do estado pela redução da mortalidade infantil. Alagoas já teve o título do estado com maior mortalidade infantil do Brasil e gradativamente esses índices foram caindo de forma gradual, com intensificação nos últimos anos, fruto de um esforço muito grande que envolveu a sociedade civil, especialistas, universidade, o governo e os municípios, avalia Jane Santos.
“Trabalhamos com os dados oficiais do Datasus de 2017, porque os de 2018 ainda não estão disponíveis. Em relação à mortalidade na infância (crianças com até 5 anos de idade), para cada mil que nascem em Alagoas, 17.7 morrem.. Em Alagoas, a taxa de mortalidade infantil é maior do que a média nacional que é de 13,4 e menor que a média do nordeste. A maior parte da melhora tem a ver com a expansão da atenção básica, o acesso ao pré-natal e ampliação das unidades de referência para o parto de alto risco, mas isso ainda é muito tímido, considerando a necessidade do estado”, explica a especialista do Unicef.
Humanização é acolhimento
“Não basta só ter acesso, tem que ter acesso com qualidade. Qual é a qualidade da consulta no pré-natal? E o acesso aos exames? Esses são grandes desafios que o estado precisa enfrentar. Outra preocupação do Unicef é o aumento das mortes evitáveis, relacionadas ao empobrecimento da população, de cortes de gastos sociais e outros fatores, especialmente em relação ao saneamento básico e as baixas coberturas vacinais”, explica a médica que atua no Unicef.
“A mortalidade infantil desde sempre é um marcador de como as crianças são cuidadas nos municípios, nos estados, num país. É muito sensível principalmente a essas causas vinculadas à pobreza, ao saneamento, às condições gerais. E o Brasil ainda tem muito desafio pela frente em relação a questão do saneamento”, acrescenta Jane Santos.
“O acolhimento, a humanização do atendimento é absolutamente imperativo. É preciso garantir os serviços. É preciso um trabalho intersetorial. Não dá para zerar a mortalidade infantil em função das mortes inevitáveis, mas o aceitável é de 10 mortes para cada mil nascidos vivos, até um ano de idade, segundo a OMS. O desafio é grande, crescente”, conclui.
Mortalidade em Alagoas
De acordo com o Ministério da Saúde, o cenário da Taxa de Mortalidade Infantil (TMI) no país, com queda sustentada nos últimos vinte e cinco anos, teve um repique em 2016, o que não caracteriza aumento significativo dessa taxa ou mudança da tendência de redução da mortalidade infantil. “O Brasil alcançou a meta do milênio de redução de dois terços da mortalidade infantil, segundo Relatório Nacional de Acompanhamento dos Objetivos do Milênio (ODM) 2013. O país conseguiu reduzir as taxas em 70%, já que a TMI em 1990 era igual a 47,1 óbitos por mil nascidos vivos, chegando a 13,4 em 2017. No estado de Alagoas, a taxa de mortalidade infantil foi de 14,5 no ano de 2017”, acrescenta a assessoria do MS, em nota enviada à reportagem.
Ainda segundo o Ministério da Saúde, os fatores que impactaram na redução da mortalidade infantil foram a implantação do SUS, redução na fecundidade e a melhoria das condições de vida da população - aumento do emprego, renda, escolaridade, entre outros. "É importante destacar que, em 2016, houve redução de 5,3% na taxa de nascimentos no Brasil, parte atribuída ao adiamento da gestação e, parte, ao impacto da epidemia do vírus zika. O número de nascimentos passou de 3.0 17.668 para 2.857.800, redução de 159.868 nascimentos em 2016. Com isso houve redução do denominador usado para cálculo da taxa de mortalidade infantil, o que afetou o cálculo da taxa. É também necessário esclarecer que as crianças são as que mais sofrem com as mudanças socioeconômicas", reforça o MS.
A assessoria do MS informou que “possui diversas políticas voltadas à saúde na infância. Uma delas, é a forte atuação da Estratégia Saúde da Família, que realiza atendimentos focados na Atenção Básica, principalmente domiciliares, em 98,6% do território nacional. São 42.855 equipes, em 5.497 municípios, que fazem acompanhamento do dia a dia das crianças e são capazes de solucionar em até 80% os problemas de saúde. Além disso, desde 2011, a estratégia da Rede Cegonha contribui para proporcionar às mulheres saúde, qualidade de vida e bem-estar durante a gestação, parto, pós-parto e o desenvolvimento da criança até os dois primeiros anos de vida. A iniciativa qualifica os serviços ofertados pelo Sistema Único de Saúde (SUS) no planejamento familiar, na confirmação da gravidez, no pré-natal, no parto, a fim de torná-lo humanizado, e no puerpério”.
Redução foi de 10%, diz Sesau
Segundo a Secretaria de Estado da Saúde, de 2014 a 2017, a redução da taxa de mortalidade em Alagoas foi de 10,96¨%. “No ano de 2017 a maior parte dos estados do país tiveram um boom de mortalidade, o que vinha caindo em termos de curva passou a subir e aumentar e apenas nove estados da federação, entre eles Alagoas continuou em queda. O que para a gente é muito bom e significativo, ainda mais com os índices de desenvolvimento social como o IDH e o IDHM, se a gente for comparar com o estado do Paraná, por exemplo”, disse Alessandra Viana, coordenadora do Núcleo da Saúde do Programa Criança Alagoana, da Secretaria de Estado da Saúde (Sesau).
Na avaliação de Alessandra Viana, a taxa de mortalidade infantil em Alagoas vai continuar em queda, “a gente vai continuar caindo, só que a gente teve uma queda bem mais acentuada por volta do início da década 2000 porque naquele momento a gente tinha uma taxa de mortalidade de 56 por mil, era quase absurda. Então a gente tinha que reduzir rapidamente esse número para ficar a níveis aceitáveis, aliás não existem níveis aceitáveis para o óbito infantil, mas a gente tenta reduzir ano a ano”.
Para reduzir a taxa de óbito de crianças, reforça Alessandra Viana, foi feita a pactuação junto a cada município que ele monitore e investigue seus óbitos e ele intervenha de forma efetiva na assistência ao pré-natal que hoje entre as causas de óbito infantil muitas delas estão relacionadas à inadequada assistência ao pré-natal. “Na assistência ao parto o investimento está sendo muito positivo no governo do Estado, além do Hospital da Mulher que foi recém-in augurado e a gente não tem como medir o impacto dele, mas a gente já contratualizava com outras instituições o acesso a parto dentro do estado de Alagoas, principalmente no município de Maceió”, declara.
Ainda segundo a representante da Secretaria de Estado da Saúde (Sesau), há – atualmente – uma rede mais organizada de assistência ao recém-nascido. “A gente sabe que a partir do momento que a gente intervém na causa, o problema vai deixar de acontecer. Se faço intervenções no pré-natal já reduzo situações que vão acarretar no parto prematuro, por exemplo. A nossa meta é chegar um momento que não morra nenhuma criança por óbito evitável. Essa é a nossa meta”, explica a enfermeira Alessandra Viana.
De acordo com avaliação da Organização Mundial de Saúde (OMS), a taxa de mortalidade infantil permite analisar a disponibilidade, a utilização e a eficácia dos cuidados de saúde, em especial da atenção ao pré-natal, ao parto, ao recém-nascido e à criança no primeiro ano de vida, sendo frequentemente utilizada para definir políticas públicas direcionadas à saúde materno-infantil. Já o Unicef informa – em publicação – a maioria das crianças menores de 5 anos morre devido a causas preveníveis e com tratamento, como as complicações durante o parto, pneumonia, diarreia, sepse neonatal e a malária.