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SEM TER O QUE COMEMORAR

Desvalorização, frustrações e adoecimento: Um retrato dos professores de Alagoas neste dia 15 de outubro

Categoria sofre com baixos salários, falta de investimento, retirada de direitos, pressão para cumprir metas e adoecimento em Alagoas

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Professores alagoanos sofrem com baixos salários e sobrecarga
Professores alagoanos sofrem com baixos salários e sobrecarga -

Neste 15 de outubro, Dia do Professor, os profissionais que têm a missão de educar e formar cidadãos em Alagoas, mais uma vez, não têm nada a comemorar. A categoria se sente desvalorizada e tem assistido a um verdadeiro desmonte da educação não só no estado, mas em todo o país. Como consequência, tem adoecido e saído de cena, deixando as salas de aula para buscar tratamento médico.

Não há números precisos sobre o afastamento de professores em Alagoas, mas sabe-se que são muitos os profissionais longe do ofício de ensinar devido a questões de saúde. Segundo a presidente do Sindicato dos Trabalhadores da Educação de Alagoas (Sinteal), Consuelo Correia, doenças psicológicas, como a Síndrome de Burnout e a depressão, estão entre os principais problemas de saúde enfrentados pela categoria no estado.

“O sindicato não tem números reais, mas temos um quadro muito grande de profissionais adoecidos e afastados. Muitos professores com Síndrome de Burnout, que acabam entrando em depressão, ficando nervosos e sem querer mais entrar em sala de aula. O motivo seria, além da desvalorização, a pressão para bater metas [e alcançar bons resultados nos índices educacionais] e a grande quantidade de alunos indisciplinados, que não respeitam o profissional que está à frente da sala de aula”, afirmou Consuelo.

Quando cita desvalorização, Consuelo se refere aos baixos salários e à falta de investimento na formação e qualificação dos professores. “Temos um dos piores salários do Nordeste na rede estadual. Alguns municípios de Alagoas pagam melhor que o estado, pra você ter uma ideia. Sofremos com a desvalorização profissional. E isso já tem se refletido nos jovens. Quando entramos em uma sala de aula e perguntamos quem ali quer ser professor, ninguém levanta a mão. Ninguém mais quer seguir essa carreira. As salas das licenciaturas estão esvaziadas”, afirma, destacando que a categoria não tem o que comemorar. “Neste 15 de outubro, é difícil achar algo para comemorar diante da realidade que vivemos hoje”, completa.

Mas a desvalorização não passa somente pela questão salarial e de investimento em qualificação. Passa também pelo reconhecimento de direitos. Com a contratação temporária de monitores pelo governo do estado, os profissionais que assumem as vagas têm todos os direitos conquistados pela categoria, negados.

Para se ter uma ideia, Alagoas conta atualmente com cerca de 7.800 professores concursados na rede pública estadual. Já o número de monitores contratados chega a 4.900. São quase cinco mil profissionais da educação sem o direito à progressão na carreira e outros quesitos.

“Isso só traz a precarização da profissão, pois os professores acabam desmotivados. O governo fez concurso no ano passado, mas com poucas vagas, mesmo sabendo que a demanda era bem maior. Para o estado, é bem mais vantajoso contratar monitores, pois fica barato, já que eles não têm direto algum e podem ser colocados para fora a qualquer momento. Isso tem desvalorizado muito a profissão”, relata.

A secretária de Comunicação e integrante do Coletivo de Saúde do Trabalhador do Sinteal, Patrícia David, confirma que o sindicato não tem dados relativos ao número de professores afastados das funções, mas destaca que essa situação é sempre usada quando a categoria tenta negociar benefícios, como reajuste salarial, com o governo.

“Falou em mesa de negociação, esse assunto é sempre colocado, pois o governo fala que não dá pra conceder reajuste porque tem muito profissional afastado por doença, que precisa ser substituído. O que a gente sabe é o que pesquisas nacionais mostram: o que mais tem atingido os profissionais da educação são os problemas de saúde mental, como depressão e síndrome do pânico. Antes era a questão da voz, hoje é a questão psíquica”, afirma Patrícia.

Ela aponta como um dos motivos do afastamento as constantes cobranças para que as escolas atinjam metas e tenham, a cada ano, um melhor desempenho, mesmo que não haja um investimento nesse sentido. Quem está doente e não é afastado em definitivo, é retirado da sala de aula e assume outras funções dentro da escola, na portaria, na biblioteca etc.

“É o que chamamos de profissional readaptado. Ele está doente, mas continua trabalhando. É uma forma de mascarar o adoecimento. Ao serem mudados de função, muitos se sentem deslocados e acabam tendo o quadro piorado. É uma forma de adiar o afastamento. O adoecimento hoje vira um meio de o servidor ser penalizado”, conta Patrícia, destacando que o Sinteal tem feito palestras, rodas de terapia integrativas e tem tentado chegar junto dos profissionais para dar apoio.

Patrícia conta que a pressão psicológica, para que as escolas obtenham bons resultados no Ideb, é um dos motivos do adoecimento. Ela diz que a “punição” para quem não atinge a meta é não receber o valor equivalente a um vencimento, o chamado 14º salário. O detalhe é que, desde que esse “benefício” foi estipulado, o governo do estado ainda não honrou com esse compromisso com os professores.

“Na escola que atingir a meta, os trabalhadores recebem uma bonificação, que é o 14º salário ou o 15º, quando é ano de rateio. É um salário a mais, que faz a diferença para quem é professor, já que a categoria não tem reajuste. Então, todos ficam contando com esse valor. O problema é que, até hoje, ninguém recebeu. Já saiu até a relação, mas, até agora, as pessoas não receberam. Tem dois anos que isso foi prometido. O governo do estado criou a expectativa nas pessoas, mas não pagou”, pontuou.

Educação em baixa

A presidente do Sinteal fala ainda dos projetos que têm trazido uma piora para a qualidade do que é repassado para os alunos em sala de aula. Segundo ela, a educação hoje foca apenas no mercado de trabalho e acaba esquecendo de formar o cidadão pensante.

“A gente assiste hoje a um desmanche do papel de ensinar, de educar. As reformas pelas quais a educação passou fizeram com que os alunos sejam preparados apenas para o mercado de trabalho e para tirar boas notas nas avaliações do governo, como o Ideb. O que vemos no Brasil é uma liquidação das licenciaturas. Os professores estão sendo demonizados pela sociedade. Com a Lei da Mordaça, fomos chamados de pervertidos, disseram que íamos ensinar as crianças a fazer sexo. Também fomos acusados de fazer balbúrdias nas universidades. Estão tentando apagar o papel dessa figura que tem a função essencial de formar todos os profissionais”, desabafou.

Consuelo diz ainda que a escola pública tem tudo para dar certo, desde que haja investimento e valorização profissional. Ela destaca, no entanto, que quem pensa e executa as mudanças na educação do Brasil não tem filhos na escola pública. “Não há investimento na valorização desses profissionais, nos laboratórios, na estrutura física da rede. A escola pública dá certo, desde que se garanta a valorização do profissional. Hoje, o professor apenas sobrevive com o que ganha”, pontua.

Diante desse cenário, Consuelo afirma que a valorização profissionais tem se dado, hoje, apenas dentro da própria categoria. “Se nós, educadores, enquanto profissionais da educação, não nos colocarmos para cima, apesar de tudo, quem o fará? Então, temos cobrado uma unidade para que nos fortaleçamos enquanto categoria”, diz.

A Gazeta entrou em contato com a Secretaria de Estado da Educação (Seduc) mas, até o fechamento desta matéria, não obteve respostas para os questionamentos.

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