Alagoanos consideram “pequeno” o avanço com relação a liberação da produção e uso de medicamentos à base da cannabis, medida aprovada pela Anvisa na última terça-feira (3). Para ativistas, juiz e pai de paciente a recusa da regulamentação do plantio para o tratamento medicinal dificulta o acesso para pessoas carentes e favorece a indústria farmacêutica. “Eu avalio como positiva e fico perplexo que a liberação só tenha acontecido agora. É uma estupidez o Brasil estar tão atrasado com a política pública destinada a fabricação de medicamentos, é realmente lastimável. Poderíamos avançar mais e permitir o plantio da maconha, pelo menos, para fim medicinal. Acho que o país tem todas as condições para o plantio. Isso forneceria tecnologia às nossas indústrias e, evidentemente, ganharíamos em termos financeiros porque não precisaríamos importar a cannabis”, crítica juiz Alberto Jorge, professor de Direito. Estudos científicos realizados em âmbito global comprovam a eficácia da planta no tratamento de dezenas de doenças. “A cannabis medicinal tem tido sucesso em casos que a medicina tradicional não tem muito a oferecer. Pacientes com autismo, Alzheimer, doenças degenerativas como paralisia supranuclear progressiva, doenças autoimunes que levam ao quadro de dor crônica, esclerodermia, artrite, síndromes dolorosas persistentes são algumas das doenças em que a medicina canabinoide consegue dar alívio sintomático e, muitas vezes, até regressão de quadros que dentro da medicina tradicional não teriam muito sucesso no tratamento”, pontuou à Gazetaweb a médica PhD Ana G Hounie, atuante em São Paulo.
DIFICULDADES
Um pai que, por motivos de segurança a reportagem preferiu não identificá-lo, revelou que faz o tratamento do filho de seis anos de idade de maneira ilegal. A criança teve paralisia cerebral após um tratamento de pneumonia, no Hospital Geral do Estado. O pai alega que houve negligência médica e a situação se agravou. Como o tratamento não existe pelo Serviço Único de Saúde e raros são os casos em que os médicos alagoanos concedem a receita, o pai se aventurou e procurou ajuda de ativistas e produtores da medicação em outros estados do Brasil e, assim, ele conseguiu o óleo de maneira artesanal. Segundo o pai, a medicação tem surtido efeito. “Meu filho tinha umas 20 crises de epilepsia por dia, com o uso do remédio as crises zeraram. Já sentimos uma melhora desde os primeiros 12 dias. Só que o custo é muito alto, não temos condições de arcar com esses valores, por isso quero autorização para plantar e eu mesmo produzir, pois é um procedimento simples”, revelou o pai. Agora a luta da família é encontrar um médico que acompanhe a criança e prescreva a medicação. “Com a receita tenho condições de entrar com recurso judicial. Não vou fabricar a medicação antes de ser aprovado pela Justiça porque eu não quero prejudicar a minha família nem a mim”, disse.
LUTA
“Esse modelo aprovado liberou a venda de remédio da farmácia, mas não liberou o cultivo [nem para pacientes, nem para a indústria], então às empresas que querem manipular esses remédios tem que comprar maconha importada, às poucas associações que plantam no Brasil tiveram que entrar com ações judiciais. Então esse procedimento na justiça continua sendo necessário ou o paciente vai ter que se submeter a pagar custos altíssimos para adquirir o remédio”, criticou Daiane Rose, Integrante do Coletivo Marcha da Maconha, estudante de Pedagogia. O juiz Alberto Jorge se mostra favorável também ao uso recreativo da maconha. Segundo ele, a regulamentação pode ser uma forte ferramenta de combate ao tráfico. “Acho que deveria ser utilizada [maconha] para o uso recreativo, mas infelizmente isso ainda é uma realidade distante. Temos um grande atraso com relação a outros países, até mesmo os conservadores como os Estados Unidos”. O Fórum Permanente de Combate às Drogas se mostrou favorável apenas ao uso medicinal. “O Fórum é contra a legalização da maconha para o plantio e a recreação, mas entendemos que ela salva vidas no âmbito medicinal, neste quesito somos favoráveis. Entendemos que que o Brasil tem dificuldades na educação, saúde e fiscalização desta demanda, por isso somos contra a legalização da planta”, disse Noélia Costa, presidente do Fórum.