Cidades
Alagoanos s�o libertados de trabalho escravo em SP

FÁTIMA VASCONCELLOS A Procuradoria Regional do Trabalho de São Paulo descobriu, no município de Monte Mor, durante um trabalho de fiscalização realizado no Sítio Taquara Branca, prática de trabalho escravo com uma família alagoana. Entre os pais, filhos e genros eram 16 pessoas que estavam há dois anos trabalhando em uma plantação de tomate, pelo qual recebiam, juntos, R$ 660 por mês, o equivalente a R$ 40 por pessoa. ?Fomos postos em liberdade depois que o procurador do Trabalho Ronaldo Lima detectou a irregularidade e interferiu a favor da nossa libertação?, revelou Celestino Avelino Silva. Ele explicou que estava desempregado com toda a família, em Arapiraca, quando Cláudio Donizete Ross Matheus prometeu trabalho para todos, em uma propriedade agrícola que teria arrendado em Monte Mor, no interior de São Paulo, distante 40 quilômetros de Campinas. ?Na época, a gente estava sem perspectiva. Por aqui tentamos tudo, sem sucesso. Então acreditamos na promessa e fomos embora cheios de esperança, em 17 de agosto de 2001. O serviço era fazer o plantio de tomate. Os patrões disseram que no primeiro momento era fase de experiência. Acontece que até hoje nunca fomos decentemente remunerados. Cheguei a reclamar, eles prometiam regularizar a situação, mas depois fizeram apenas a proposta de que trabalhássemos para ficar com a metade da produção, como ?meeiro? não dá para sobreviver decentemente. É uma relação de trabalho injusta e desigual?, explicou Celestino, que voltou ontem, com o sobrinho José Cláudio Nunes dos Santos, que também trabalhava na propriedade. A Procuradoria do Trabalho de São Paulo foi quem embarcou os dois no vôo da TAM, cujo desembarque ontem, no aeroporto Zumbi dos Palmares, ocorreu às 12h30. Celestino disse que levou uma queda na porta de casa e quebrou a perna. Devido ao seu estado, o médico recomendou que a viagem não fosse feita de ônibus e ele teria que viajar com um acompanhante. Os demais membros da família, sendo duas crianças (respectivamente de um ano de idade e três) mais 12 adultos saem hoje, às 16 horas, de São Paulo, de ônibus e devem chegar em Alagoas na próxima quinta-feira. Celestino e Cláudio foram recebidos no aeroporto pela procuradora do Trabalho, Adir de Abreu, que conduziu Celestino para avaliação médica e depois ofereceu transporte para ambos chegarem à cidade de origem. Eles são de Arapiraca, do bairro Nova Esperança. ?Se é para continuar desempregado, a gente fica aqui, mas com liberdade. Tivemos sorte que a Justiça do Trabalho nos libertou. O sonho agora é ter todos de volta?, afirma Celestino. Relatório revela que família estava vivendo em condições subumanas O procurador do Trabalho em Alagoas, Alpiniano do Prado, disse que a prática do trabalho no sistema escravagista é crime inafiançável, mas que o caso está sendo investigado na Jurisdição onde houve a ocorrência, como manda a legislação. ?À Procuradoria local compete apoiar os trabalhadores, pois são alagoanos. Mas a firma envolvida não é daqui, a relação trabalhista se deu fora do Estado. Portanto, apenas nos cabe prestar assistência na vinda desse pessoal. Também vamos manter contatos com os procuradores que estão apurando o fato, em Monte Mor, a fim de manter a sociedade informada acerca do desfecho da história, já que foi uma prática irregular de trabalho?. A procuradora do Trabalho Adir de Abreu, que foi receber os trabalhadores ontem, no aeroporto, disse que a prática do trabalho em regime análogo ao modo escravagista fica caracterizado quando não há remuneração; quando o serviço é executado por pressão, havendo em troca apenas a alimentação, que é, aliás, uma condição para manter os trabalhadores vivos, em condições de desempenhar a atividade que gera riqueza ao suposto patrão. ?É cedo para falarmos qualquer coisa. Vamos nos inteirar oficialmente do que aconteceu, inclusive solicitar informações ao procurador que flagrou o caso, em Monte Mor (SP), para maior esclarecimento do assunto?. O relatório da Diligência, assinado pelo procurador Ronaldo Lima dos Santos, confirma que os alagoanos foram encontrados em condições subumanas de trabalho, na plantação de tomate do Sítio Taquara Branca, em Monte Mor, distante 40 quilômetros de Campinas. O local não possui condições de habitação, higiene, segurança e medicina do trabalho. O serviço era exercido sob as mais variadas intempéries, com radiação solar, chuva, frio, vento, etc; não havendo no local sequer água potável, banheiros, vestuários, refeitório ou qualquer instrumento para descanso. Foram encontrados pelo procurador diversos agrotóxicos ao ar livre, sem local para armazenamento, sendo que os trabalhadores, inclusive crianças e adolescentes, os aplicavam sem qualquer equipamento de proteção. O comando das atividades era exercido pelo encarregado do sítio, Cleiton Rodrigues Ribeiro, contratado do arrendatário da propriedade, Cláudio Donizete Ross Matheus. Cláudio era quem repassava o dinheiro para os 16 alagoanos: R$ 660 para ser dividido por todos, o que correspondia ao valor de R$ 40 por trabalhador. Com essa renda, os trabalhadores viviam na mendicância, recebendo alimentos e roupas fornecidas pela vizinhança. A falta de dinheiro também impedia o retorno da família para a cidade natal, Arapiraca. Para dormir, os trabalhadores tinham uma residência coletiva sem a menor infra-estrutura e cujo aluguel era pago por Cláudio Donizete Ross Matheus, no valor de R$ 120.