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Cidades

Mais de 400 pessoas aguardam transplante de órgãos em Alagoas

De janeiro a novembro deste ano, apenas 66 procedimentos foram realizados no Estado

Por regina carvalho | Edição do dia 07/12/2019 - Matéria atualizada em 07/12/2019 às 06h00

Em Alagoas, cada cidadão pode salvar ou transformar a vida de seis pessoas, com a doação de córneas, rins, fígado e coração, órgãos que podem ser transplantados no estado. Um ato grandioso de solidariedade que não combina com números tão baixos: 429 pacientes aguardam na fila e apenas 66 transplantes foram realizados de janeiro a novembro deste ano no estado. 

Do total de 429 pessoas que aguardam transplante de órgãos, em Alagoas, um espera por coração; 195 deles por rim e 233 aguardam córnea.

Dados de janeiro a setembro de 2019 que constam na estatística da Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO) apontam uma realidade difícil: mais de 36 mil pessoas aguardam na lista de espera no Brasil. Mais de 23 mil por rim, quase 11 mil por córnea, 1,1 mil por fígado e 260 por coração. Desse total, mais de 700 são pacientes pediátricos. 

Mesmo com dados preocupantes, a coordenadora da Central de Transplantes de Alagoas, Daniela Ramos, lembra que desde 2016 houve redução da taxa da recusa familiar – ou seja – de famílias que disseram não à doação. “Era 71% em 2016 e 2017 e 2018 conseguimos manter os 44%. Em relação aos transplantes, como só existe transplante se houver doação”, afirma. Em 2017 foram realizados em Alagoas 134 transplantes, já em 2018 foram 104 e, de janeiro a novembro deste ano, apenas 66, sendo 54 de córneas, cinco de coração e sete de rins. 

“Por que é tão baixo? Acredito que é a falta de informação de como funciona em vida e o que precisa para ser doador. Hoje no Brasil basta avisar a família. Algumas pessoas ainda alegam a questão religiosa, mas acho que o maior índice é o desconhecimento da causa mesmo. Para ser doador, não é preciso deixar nada por escrito, e sim comunicar à família, pois somente os parentes podem autorizar a doação. Para mudar este quadro e permitir que cada vez mais pessoas que estão na fila dos transplantes possam voltar a desfrutar de uma vida confortável, é essencial inserir a temática da doação no cotidiano das pessoas e desfazer mitos que ainda circulam entre a população”, explica Daniela Ramos. 


O gesto do Gugu


A decisão do apresentador Gugu Liberato, que manifestou em vida o desejo de doar seus órgãos, deve refletir no aumento do número de doações no Brasil. Após confirmação da morte, ao menos 50 pessoas nos Estados Unidos foram anunciadas como possíveis beneficiadas. “O caso do Gugu dar realmente um boom na doação. Tem muita gente na rede social perguntando sobre as doações, pegando as informações. É um ato de amor. Mas é preciso lembrar que só tem transplante se tiver doação. Se o processo não estiver todo organizado e a família não autorizar a gente não consegue fazer nada”, reforça a coordenadora da Central de Transplantes. 

Segundo Daniela Ramos, todos os hospitais que têm Unidade de Terapia Intensiva (UTI) e atendem pacientes críticos têm obrigação de notificar à Central de Transplantes as suspeitas de morte encefálica. “Toda a rede tem que funcionar bem. A equipe do hospital precisa estar atenta e começar uma corrida contra o tempo. Quando o cérebro para é questão de minutos para os outros órgãos pararem, por isso tem que ser tudo muito rápido”, explica.

A coordenadora reforça que a necessidade de um transplante pode ocorrer não somente para o paciente que tem uma doença rara. “Há também diabetes, hipertensão não tratada, doença de chagas e hepatite C, que podem precisar. Então, qualquer um está sujeito a isso e às vezes só cai na real quando acontece com um de nós, a necessidade pode acontecer”, lembra.


Paciente espera há sete anos

O segurança particular aposentado e morador de Marechal Deodoro, Edmilson Ângelo Jorge, de 42 anos, está na fila de espera por rim há sete anos. Apesar de todo esse tempo, ainda tem esperança de resolver a insuficiência renal crônica quando houver doação do órgão. “A gente fica desgostoso, não é chamado, não acontece nada. Vejo que às vezes não tem essa força de vontade para ajudar os outros”, conta. Edmilson faz diálise três vezes por semana na Santa Casa de Misericórdia de Maceió, mas disse que também vai tentar o transplante em Pernambuco. 

“O tempo vai passando, a pessoa vai se acabando e vai aparecendo mais doença. Acho que essa situação passa muito pelo governo, que só faz campanha em cima da hora e não é nada disso que a gente vê nas propagandas. Tenho pressão alta e os rins paralisaram. Não vejo a fila andando e não tenho ajuda. Ou você se vira ou você morre”, explica Edmilson Ângelo. 

Cada autorização pela doação pode beneficiar, em Alagoas, duas pessoas com as córneas, mais duas pessoas com o recebimento de rins, um beneficiado com coração e um com fígado. A quantidade de beneficiados só não é maior porque não há transplantes de tecidos e ossos em Alagoas. “A morte é única. Portanto, a condição para que seja doador de múltiplos órgãos é entrando nesse processo completo e irreversível da parada de todas as funções do cérebro, que precisa passar por um protocolo e fechar o diagnóstico por três médicos diferentes”, disse a coordenadora da Central de Transplantes de Alagoas, Daniela Ramos.


Paciente desiste de Alagoas

Após sete anos, o policial militar Fábio Roberto Clemente da Silva – 38 anos – perdeu a esperança, desistiu de aguardar na fila do transplante de Alagoas e fez cadastro em Pernambuco há seis meses.  “Aqui a fila não anda. Continuo morando em Alagoas, mas me inscrevi em Recife e como a fila é única e não pode ficar em dois estados abri mão de ficar aguardando aqui. Fiquei sete anos aguardando e vendo que ninguém recebe. No ano passado, em Recife, foram feitos 270 transplantes, enquanto que aqui é muito pouco”, afirma.

Fábio descobriu insuficiência renal há sete anos e meio e faz diálise três vezes por semana na Santa Casa de Misericórdia de Maceió. “Geralmente a média de espera por transplante em Recife é de um a dois anos. A cada três meses tenho que fazer exame de sangue para renovar meu cadastro lá. Na minha opinião a fila não anda aqui porque um paciente de hemodiálise custa em torno de R$ 6 mil a 7 mil reais, isso é o que o plano paga por diálise. Já o transplante recebe de uma vez, não sei qual o valor. Na minha opinião é mais interessante manter um paciente o resto da vida numa máquina pagando essa mensalidade”, lamenta. 


Taxas de doações melhoraram, afirma ABTO


O portal da Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO) revela que no último trimestre houve melhora nas taxas de doação e de transplante de alguns órgãos, em relação aos trimestres anteriores e ao ano passado. Segundo a entidade, a taxa de notificação dos potenciais doadores cresceu 4,2% e a taxa de efetivação voltou aos 33%, resultando num aumento de 4,1% na taxa de doadores efetivos.

“É interessante salientar que o aumento da taxa de doadores efetivos nos últimos anos deveu-se quase, exclusivamente, ao aumento da notificação de potenciais doadores, mantendo-se estável a taxa de efetivação, portanto não houve melhora significativa nas taxas de autorização familiar, de diminuição das contraindicações, de determinação de morte encefálica em relação aos protocolos iniciados e de manutenção do potencial doador”, explica a ABTO. 

Ainda segundo a ABTO, deve-se registrar com cautela o aumento de 29% na taxa de transplantes renais com doador vivo não parente, que variou de 4,8% a 7,1% nos últimos dez anos e agora atingiu 7,8% dos transplantes renais com doador vivo. O transplante hepático (10,4 pmp), apesar do aumento da taxa de doadores, apresentou queda de 1,6%, observada nos transplantes com doador vivo (8,9%) e falecido (1,0%). A taxa de transplantes hepáticos com doador vivo não parente permanece elevada (15%). O transplante cardíaco, que diminuiu neste trimestre, apresentou taxa 6,1% maior que a do ano passado (1,8 pmp).

 “Os transplantes que acontecem na Santa Casa de Maceió são de coração e rins, também de rins ocorrem no Hospital Chama, em Arapiraca, Hospital Memorial Arthur Ramos e no Hospital Vida, em Maceió; de córneas, no Instituto da Visão, Instituto de Olhos e no Hospital Santa Luzia. O transplante é todo financiado pelo SUS”, acrescenta Daniela Ramos, coordenadora da Central de Transplantes de Alagoas.

A Central de Transplantes de Alagoas é a unidade responsável pela coordenação das atividades de transplantes a nível estadual, promovendo a inscrição de potenciais receptores de órgãos e tecidos. Tem como atribuição comunicar ao Sistema Nacional de Transplantes (snt) as inscrições efetuadas para a organização da lista nacional de receptores; receber notificações de morte cerebral ou morte por coração parado e determinar o encaminhamento e providenciar o transporte de órgãos e tecidos para os centros transplantadores, instituições de saúde autorizadas pelo SNT. 

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