As mudanças na lei federal do Estatuto do Desarmamento, feitas via decretos pelo presidente Jair Bolsonaro, voltaram a ganhar a mídia após a Quinta Turma do Superior Tribunal de Justiça (STJ) conceder, em outubro de 2019, um habeas corpus de ofício para reduzir a pena de um condenado do Rio de Janeiro por posse irregular de munições de uso restrito, com base no decreto de armas. A decisão, no entanto, chamou a atenção de especialistas alagoanos, que avaliam a ação como um ‘efeito colateral’, visto que presos e organizações criminosas podem se beneficiar diretamente devido às mudanças na lei.
Antes restrito apenas a policiais, agentes de segurança e promotores, o porte de arma foi flexibilizado agora a cidadãos que detém mandato eletivo, advogados - que atuem como agentes públicos -, jornalistas, agentes de trânsito, motoristas de veículos de carga, proprietários rurais e até conselheiros tutelares e agentes socioeducativos. As alterações feitas por Bolsonaro permitirão que 19 milhões de brasileiros possam ter porte ou posse de arma em função da categoria profissional, segundo dados do Instituto Sou da Paz, ONG nacional que contribui para efetivação de políticas públicas de segurança e prevenção da violência.
A Organização Mundial da Saúde (OMS), contudo, aponta que o Brasil ocupa a 9ª posição no ranking de homicídios e, para o advogado criminal Ronald Pinheiro, apesar dos avanços na segurança pública em Alagoas, o estado ainda possui índices de violência consideráveis. “Vejo com cautela qualquer norma que vise facilitar o acesso da população a armas de fogo. Vale lembrar, também, que as organizações criminosas podem se beneficiar da flexibilização das normas relacionadas a aquisição de armas. Nesse sentido, não acredito que a facilitação da aquisição de armas possa combater a criminalidade, podendo, inclusive, instigar a violência”, destacou. O advogado acrescenta, ainda, que a aptidão psíquica deve ser observada a partir do momento em que indivíduo demonstra o desejo de possuir uma arma. “O sentimento de insegurança é muito forte entre os alagoanos e entre os brasileiros de um modo geral. Em razão disso, as pessoas buscam formas para se sentir seguras. Mas vale lembrar que o decreto é voltado para a facilitação da posse de armas, não do porte, de modo que a percepção de segurança trazida pela arma de fogo não acompanhará o cidadão em toda a rotina diária”. “Além disso, é necessário esclarecer que só haverá legítima defesa quando forem usados meios moderados para repelir a agressão injusta, nos termos estabelecidos pelo Código Penal. Dessa forma, o cidadão alagoano não pode ser induzido a pensar que o instituto da legitima defesa poderá se aplicado sempre que a vítima revidar ataques, pois os excessos podem ser punidos’, acrescenta. Ronald também ressalta que, tanto a redução na pena quanto a permissão do porte e posse de arma, pode fomentar ainda mais a criminalidade. “Esse risco existe, pois com a inclusão de mais armas na sociedade, mais pessoas poderão portar o artefato inclusive por confundir a posse com o porte”, frisou.