Cidades
COVID-19 PODE SER LETAL ENTRE CRIANÇAS E ADOLESCENTES
Até o fim de maio, 140 pacientes da doença em Alagoas eram menores de 10 anos e mais de 400 tinham até 19 anos


A atualização do número de infectados pelo novo coronavírus mostra a gravidade da doença, que chegou de forma preocupante na faixa etária fora do chamado grupo de risco. Em Alagoas, até o fim de maio, quase 140 pacientes eram menores de 10 anos. Somado aos que têm até 19, ultrapassa os 400 infectados, a maioria desenvolveu a forma mais leve da doença, a Síndrome Gripal (SG). No mesmo período, quase cem crianças e adolescentes morreram no país com Covid-19, sete deles evoluíram para óbito no estado. A reportagem pergunta à pediatra do Hospital Hélvio Auto, Auriene Oliveira, se pelo que tem acompanhado em relação à pandemia, é possível dizer as razões desse vírus ser letal nesses grupos (crianças e jovens). “A letalidade na faixa etária pediátrica é menor que nos adultos. Fato que vem sendo investigado por vários grupos de pesquisa, mas se olharmos apenas estes dados do boletim teremos uma letalidade alta. Mas ainda temos pouca testagem principalmente nas crianças. Mesmo porque as crianças apresentam quadros leves em sua maioria ou são até assintomáticas”, explica. E os bebês são mais suscetíveis ao Covid-19? a médica Auriene explica que as crianças são tão propensas quanto os adultos a se infectarem pelo novo coronavírus e o número real de crianças infectadas ainda é subestimado. “Além disso ainda precisamos levar em conta que até agora as crianças com a suspensão das aulas estavam protegidas em casa. Com o número de casos em adultos aumentando já vemos claramente o maior número de crianças acometidas”, declara. Segundo a pediatra, a história do novo coronavírus ainda vem se desenhando para a comunidade médica. “À medida que os casos surgem vamos conhecendo melhor seu modo de ação, órgãos mais acometidos, grupos mais propensos e o motivo disso, como grupos de risco que permanecem diabéticos, hipertensos, pacientes com doença crônica de base, jovens obesos, cardiopatas. Um grupo que vem se desenhando como fator de risco é o grupo das gestantes pela maior possibilidade de fenômenos tromboembólicos”, analisa Auriene Oliveira.
Casos já descritos na Europa, segundo a médica, apresentam acometimento gastrointestinal nas crianças em geral com boa evolução. “Mas precisamos ficar atentos. Ainda não temos certeza da transmissão oral fecal. Alguns estudos mostram que elas eliminam o vírus nas fezes por algumas semanas, mas não sabemos se em quantidade de cópias virais suficientes para transmissão. Outro alerta, crianças apresentando casos similares a Doença de Kawasaki- uma doença que acomete vasos de médio calibre - causa edema de mãos e pés, manchas no corpo, conjuntivite não purulenta e febre diária e prolongada . Essa doença quando não tratada a tempo pode acometer coronárias provocando aneurismas de coronárias”, explica Auriene.
CASOS EM ALAGOAS

Nos boletins epidemiológicos do mês de maio, a Secretaria de Estado da Saúde (Sesau) traz a relação de óbitos por infecção pelo novo coronavírus. Dentre eles de um recém-nascido em Maceió; uma menina de dois meses, em Maragogi, e de outro bebê, de 7 meses, em Arapiraca. Também a morte por Covid-19 de um garoto de 5 anos em Rio Largo e de adolescentes de 13, 15 e 16 anos. Dois desses casos ocorreram em Maceió e um em Paripueira.
A Gazeta pergunta ao infectologista Fernando Maia se é possível saber o motivo desse vírus ser letal crianças. “O que a gente sabe é que os casos graves acontecem principalmente em pacientes idosos e pacientes que tenham alguma outra comorbidade, ou seja que tenha alguma outra doença além do coronavírus. E com as crianças não é diferente, as que têm alguma doença associada tendem a fazer forma grave e eventualmente podem acontecer óbitos em crianças. Isso não é impossível, mas pelo total de casos graves você vê que o número de casos graves é significativamente menor do que os de adultos”, afirma. De acordo com ele, a suscetibilidade dos bebês é igual a de qualquer pessoa, ou seja, de ser infectado. “Mas seguem a lógica de crianças maiores, dificilmente elas adoecem e fazem a forma grave. Não há mudança, aparentemente não. Mas acontecem casos que nós chamamos fora da curva, mas a maioria é de idosos e pessoas com comorbidades”, finaliza o infectologista Fernando Maia.
DADOS DO MS
Em resposta à reportagem, o Ministério da Saúde informou dados até o dia 23 de maio, que explica que a distribuição dos óbitos de Síndrome Respiratória Aguda Grave (SRAG) por Covid-19 por faixa etária. O levantamento aponta que 69,4% tinham mais de 60 anos e 63,0% apresentavam pelo menos um fator de risco. A cardiopatia foi a principal comorbidade associada e esteve presente em 7.318 dos óbitos, seguida de diabetes (em 5.627 óbitos), doença renal (1.218), doença neurológica (1.159) e pneumopatia (1.061). Em todos os grupos de risco, a maioria dos indivíduos tinha 60 anos ou mais, exceto para obesidade. “No período correspondente foram confirmados 916 casos de SRAG por COVID-19 em crianças e adolescentes (considera-se zero a 18 anos de idade), dos quais 662 (72,3%) ocorreram em crianças de até doze anos incompletos e 254 (27,7%) em adolescentes de doze anos completos até dezoito anos. Ainda, dos 548 (59,8%) casos de SRAG pela Covid-19 que apresentavam registro de evolução, 449 (69,9%) evoluíram para cura e 99 (15,3%) para óbito”, informa o MS. No grupo das crianças, de acordo com o ministério, a maior frequência de casos de SRAG pela Covid-19 ocorreu no sexo masculino, com 370 (55,9%) casos. Já no grupo dos adolescentes, o sexo feminino foi o mais frequente, com 142 (55,9%) casos. “No que diz respeito às condições pré-existentes nas crianças e adolescentes que tiveram SRAG pela Covid-19, 400 (43,7%) casos apresentaram alguma comorbidade, sendo 270 (67,5%) crianças e 130 (32,5%) adolescentes. As mais frequentes foram as neurológicas nas crianças e a asma nos adolescentes. Quanto aos sinais e sintomas apresentados, febre e tosse foram os mais frequentes nos dois grupos, com respectivamente 73,6% e 64,5% de acometimento no grupo de crianças e 76,4% e 74,4% no grupo de adolescentes”, destaca o MS.
QUASE CEM ÓBITOS
Dos 295 casos de SRAG pela Covid-19 em crianças e adolescentes que foram internados em Unidade de Tratamento Intensivo (UTI), 219 (74,2%) eram crianças e 76 (25,8%) eram adolescentes. Entre as crianças, 159 (72,6%) fizeram uso de suporte ventilatório, 52 (23,7%) não usaram e para 8 (3,7%) delas, a informação estava ignorada ou em branco. Das que usaram esse suporte, 93 (58,5%) crianças usaram do tipo invasivo e 66 (41,5%) usaram o não invasivo. Dos adolescentes que foram internados em UTI, 54 (71,0%) fizeram uso de suporte ventilatório, dos quais 36 (66,7%) eram do tipo invasivo e 18 (33,3%) do tipo não invasivo. Ainda, 17 (22,4%) deles não utilizaram tais suportes e 5 (6,6%) tinham a informação em branco ou ignorada. “Do total de crianças e adolescentes, 548 (59,8%) registraram evolução, sendo 402 (73,4%) crianças e 146 (26,6%) adolescentes. Das crianças, 340 (84,6%) evoluíram para cura e 62 (15,4%) para óbito e, no grupo de adolescentes, 109 (74,7%) evoluíram para cura e 37 (25,3%), para óbito, o que totaliza 449 curas e 99 óbitos. Considerando a população de crianças e adolescentes, a mediana de dias entre os primeiros sinais e sintomas e a cura foi de 8 dias, a mediana de dias entre os primeiros sinais e sintomas e a internação na UTI foi de 2 dias e a mediana de dias entre o início dos sintomas e o óbito é de 8 dias”, detalha Boletim Epidemiológico Especial da Covid-19 do Ministério da Saúde.