A catarinense Fernanda Torres, cirurgiã-dentista, 37 anos, faleceu no dia 18 de maio, vítima da Covid-19. Estava grávida de sete meses de Maria Flor, uma gestação que se tornou de risco. Casada há doze anos com o médico José Luna Filho, teve um filho, que hoje está com onze anos. Veio morar em Alagoas em 2007, pouco tempo após o casal se conhecer no Rio de Janeiro. “Particularmente, acho que foram os doze melhores anos da minha vida e é por isso que ela faz tanta falta. Até agora a ficha ainda está caindo. A saudade é grande, a tristeza é grande. A angústia da perda é grande. A sensação de impotência de você não poder fazer nada. Você não pode estar ali junto, não pode estar perto. É um absurdo, porque poderia ser uma decisão pessoal ficar ao lado da pessoa. Acho que a presença pode fortalecer a pessoa de alguma forma. Não poder acompanhar, machuca quem está fora, machuca quem está doente. É uma sensação de que você poderia ter feito algo mais e não conseguiu fazer. Estou tentando voltar a minha rotina, mas para mim a saudade só aumenta”, declara o médico José Luna. Luna também teve Covid e pensou que poderia desenvolver a forma grave da doença. “Quem me levou à Unimed foi Fernanda, pensei que eu iria ficar, mas foi ela quem ficou. Na minha opinião a presença do familiar é determinante para melhora do paciente. É preciso humanizar. A gente se sente pior que um leproso, talvez isso seja o pior de tudo. É difícil conviver com a saudade. Ela amava a vida, não sabia dizer não. Isso é o que mais dói”. Para quem vive a dor de uma perda precoce, não dá para entender tanta pressa de voltar à rotina quando o vírus ainda é uma ameaça. “Vejo uma vontade muito grande das pessoas de retornarem a uma vida normal, mesmo com todos os riscos. Só sabe quem perdeu um ente querido. Fernanda tinha a vida toda pela frente, uma morte precoce. Inclusive a morte da minha filha que vinha de uma melhora e de repente, numa manhã, ela teve uma piora absurda. A Covid é traiçoeira, quem você pensa que vai sair bem não consegue. O que pode ter piorado a situação dela foi a cesariana, que foi necessária naquele momento, mas talvez tenha sido o ponto fundamental para que ela possa ter piorado como piorou”, finaliza José Luna, lembrando que o estilista Audifax Seabra, morto também após infecção pelo novo coronavírus, em junho, fez o vestido de formatura de Fernanda.
PARAIBANOS QUE BUSCAVAM VIDA MELHOR AL
O professor universitário Nelson Vieira perdeu a mãe, o tio e o avô para o novo coronavírus. Nada pode reparar tanta dor. No intervalo de menos de trinta dias os três morreram e, por coincidência ou não, estavam juntos quando decidiram viajar à Paraíba poucos dias antes de adoecerem. “Se ficar pensando, fica deprimido. Ficam os momentos bons do que a gente viveu com eles, mas é muito difícil superar”, declara. A família saiu da Paraíba, décadas atrás, para tentar uma vida melhor em Alagoas. Severina Vieira da Silva, a mãe de Nelson, tinha 65 anos, era hipertensa e diabética. Uma paraibana forte, de fé. Adorava reunir a família, os netos - são doze. Tinha um sonho, ver um deles formado em Medicina, o Rubens, que tem 17 anos. Ela faleceu no dia 22 de abril. O tio de Nelson, Severino Pedro da Silva, tinha 60 anos, um apaixonado pelo fluminense e forró, como bom nordestino da Paraíba que era. Ele faleceu no dia 17 de maio. Já Severino Vieira da Silva tinha 96 anos, avô de Nelson. Era um homem forte. Agricultor e pai de cinco filhos, o xodó da família. Chegou a ficar quase recuperado da Covid-19, a equipe médica cogitou alta do hospital, mas a morte da filha foi um momento muito difícil de dor. Ele acabou não resistindo. Faleceu no dia 15 de maio.
A PERDA DA VÓ
A estudante universitária Layza Bispo perdeu a avó de 74 anos, no dia 30 de maio. A pernambucana Leonora Maria da Silva - desde criança morava em Alagoas - ficou internada por 30 dias e apresentava poucos sintomas do novo coronavírus. Teve somente alteração do quadro respiratório, mas como tinha problemas cardíacos, não desconfiou que se tratava de Covid. O primeiro atendimento ocorreu numa Unidade Básica de Saúde (UBS) em Jacuípe, onde morava. “Lá foi medida a saturação dela e foi percebido que estava muito mais baixo do que deveria. Então minha vó foi para Maceió, onde ficou internada após a luta por um leito no Sistema Único de Saúde (SUS). A progressão do vírus é tão rápida que ela piorou muito em menos de 24 horas”, declara a universitária. As lembranças são muitas de dona Leonora, uma senhora lúcida que cuidava das plantas, de ir à feira e à igreja. Mãe de três filhos, que sustentou costurando, e vó de oito netos. “O que mais a minha família sentiu foi não poder se despedir dela. Retirar ela foi difícil porque Jacuípe é muito longe. Dá a sensação de que poderia ser feito mais, ter abraçado. A gente não sabia que não ia mais ver ela. É horrível. Isso a gente ainda está processando para poder seguir em frente. A gente tinha apego muito grande. Ela que sempre cuidou das minhas coisas e faço faculdade muito mais por causa dela, porque tive o apoio”.