Projeto de lei prev� o fim da pris�o para usu�rio de drogas
FÁTIMA ALMEIDA Em breve, o uso de drogas no Brasil não será mais caso de cadeia. Projeto de lei aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara Federal estabelece o fim da pena privativa de libertade para o usuário, substituindo-a por pe
Por | Edição do dia 29/02/2004 - Matéria atualizada em 29/02/2004 às 00h00
FÁTIMA ALMEIDA Em breve, o uso de drogas no Brasil não será mais caso de cadeia. Projeto de lei aprovado pela Comissão de Constituição e Justiça (CCJ) da Câmara Federal estabelece o fim da pena privativa de libertade para o usuário, substituindo-a por penas alternativas, como a prestação de serviços comunitários. A medida tem o apoio de representantes de instituições diversas em Alagoas, a exemplo da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) e Centro Erê de Apoio à Criança e ao Adolescente de Rua, mas a falta de instituições para tratamento de toxicômanos habituais pode ser um problema no Estado. Quando as novas regras entrarem em vigor, após a sanção presidencial, o encaminhamento do usuário de drogas para centros de tratamento e desintoxicação é uma das alternativas que podem ser recomendadas pelo juiz. O problema é que em Alagoas não tem nenhuma instituição pública para esse fim, observa o assistente social Cristiano Montenegro, coordenador do Centro Erê. Mesmo no hospital psiquiátrico Portugal Ramalho, que tem uma ala de tratamento para drogados, segundo ele, é muito difícil conseguir uma vaga. Sem contar que, na opinião de Cristiano, não é o mais recomendável o tratamento de usuários de drogas com pacientes portadores de doenças mentais. São problemas diferentes e devem ser tratados como tal. O usuário de drogas, seja criança, adolescente ou adulto, deve ter um tratamento especializado para o seu problema, observa. Na opinião do secretário de Defesa Social, Robervaldo Davino, o Estado vai ter que pensar em formas de criar esses centros de tratamento, que ele considera uma saída excelente. A própria lei deve trazer mecanismos que facilitem isso, diz ele. De fato, o texto aprovado na CCJ da Câmara permite que o governo federal, estados e prefeituras criem estímulos fiscais para pessoas físicas e jurídicas que colaborarem na prevenção ao uso de drogas e para empresas e entidades que criarem programas de reinserção social de usuários. Nesse sentido já caminha o deputado federal Givaldo Carimbão (PSB), presidente da Frente Parlamentar Antidrogas do Congresso Nacional. Ele informou que está adquirindo uma fazenda no município de Craíbas (AL), que será doada a uma instituição (provavelmente da Igreja Católica, com quem já iniciou os contatos, por intermédio de dom Valério Breda, bispo de Penedo). O parlamentar garante que dentro de seis meses Alagoas terá o seu primeiro centro de tratamento de drogados. Redução de presos A unanimidade entre os entrevistados é encontrada em um ponto: o fim da pena privativa de liberdade para os usuários de drogas vai reduzir a superlotação dos presídios, embora, segundo o secretário Robervaldo Davino, não seja significativo o número de pessoas mantidas em cárcere por causa do uso de drogas. Geralmente quando eles ficam presos é por outros motivos: crimes praticados quando se drogam ou antes de se drogar. Alguns roubam para comprar o entorpecente. Ele prefere não dar sua opinião sobre o teor do projeto, alegando que não conhece o seu conteúdo, mas admite que o tratamento, se realmente acontecer, é o melhor caminho. O presidente da OAB-AL, Marcos Mello, destaca que pelo Código Civil, o toxicômano habitual (viciado em drogas), assim como o alcoólatra, é considerado uma pessoa incapaz para efetuar negócios jurídicos, mas não pode ser tratado como um criminoso nem ser preso só por ter acendido um cigarro de maconha. Criminoso é o traficante, que alicia pessoas tornando-as dependentes. Este sim, tem que ser confinado, defende o advogado. Ele observa que a pessoa mantida presa só pelo uso de drogas acaba encontrando uma escola de crimes no presídio e corre o risco de sair com problemas mais sérios, por causa do convívio com criminosos diversos. Destaca, entretanto, que a extinção da pena privativa de liberdade para o usuário de drogas não significa que o uso está liberado. Continua sendo uma contravenção, mas com penas mais leves. Não é justo que o usuário, que é uma vítima, tenha a mesma pena do traficante. O certo é mandá-lo para tratamento e o projeto de lei aprovado na Câmara estabelece a responsabilidade do Estado com a ressocialização do drogado. Ele determina que o Sistema Único de Saúde (SUS) ofereça instalações para tratamento de dependentes, observa o deputado Givaldo Carimbão. Segundo ele, já está comprovado que o tratamento psicoterapêutico pode chegar até a um índice de 80% de recuperação, enquanto na cadeia, a recuperação de viciados em drogas não chega a 1%. A metodologia das cadeias não é para recuperação de toxicômanos, complementa ele. Novas regras Na prática, alguns juízes já trocam a prisão pela obrigatoriedade do tratamento ou por penas alternativas no Brasil, mas pela lei em vigor (nº 6.368/76), quem for pego em flagrante usando drogas deve ser levado para a delegacia, onde é registrada a ocorrência e o usuário é preso. O confinamento previsto é de seis meses a dois anos. O traficante pode pegar de três a 15 anos de cadeia. O texto em tramitação altera essa relação não só com o fim do confinamento do usuário de drogas, mas com penas mais severas para o traficante. Para ele, o tempo mínimo de confinamento passa a ser de cinco anos, enquanto que para o usuário, que passa a ser visto muito mais como vítima do que como criminoso, a pena máxima é de cinco meses de prestação de serviços em programas comunitários, entidades educacionais e assistenciais e hospitais que trabalham, preferencialmente, com prevenção e recuperação de usuários e dependentes de drogas. Ele pode ser obrigado a freqüentar programas educativos e ser orientado a passar por um tratamento de desintoxicação. O texto define, ainda, que o usuário flagrado com drogas não pode ser levado à delegacia. O próprio policial pode lavrar um auto de infração e encaminhar o usuário a um juiz ou a um juizado especial, na presença de um representante do Ministério Público. Caberá ao juiz avaliar se a droga apreendida destina-se apenas ao consumo ou caracteriza tráfico. O texto não estabelece o quantitativo para fazer essa distinção.