Baixa escolaridade favorece a gravidez precoce
Uma pesquisa de conclusão de curso realizada em 2003 pela estudante de Medicina da Universidade Federal de Alagoas Eugênia Romeiro Ribeiro, sob a orientação do professor Carlos Henrique Tavares, mostra que as condições biossociais como a baixa escolaridad
Por | Edição do dia 07/03/2004 - Matéria atualizada em 07/03/2004 às 00h00
Uma pesquisa de conclusão de curso realizada em 2003 pela estudante de Medicina da Universidade Federal de Alagoas Eugênia Romeiro Ribeiro, sob a orientação do professor Carlos Henrique Tavares, mostra que as condições biossociais como a baixa escolaridade, exclusão social, repetição do fato (quando a mãe da adolescente também foi mãe precocemente) criam um ambiente propício à gravidez na adolescência. O trabalho foi focado em garotas que tiveram bebês no Hospital Universitário entre setembro de 2002 e janeiro de 2003 e mostra que 80% dessas meninas vieram de uma família com renda familiar inferior a dois salários mínimos. A maioria tinha baixa escolaridade. 71% não haviam completado o Ensino Fundamental. Pelo menos 77% confirmaram ter tido orientação sexual das mães, e apenas 17% receberam essa orientação na escola. Aí vem outro dado considerado importante. Entre essas mães que orientaram as filhas, pelo menos 62,2% também tinham baixa escolaridade. Pelo menos 42% dessas mães também foram mães na adolescência. Ainda de acordo com a pesquisa do HU, 51% dessas adolescentes não freqüentavam a escola quando engravidaram e 30% deixaram de estudar por causa da gravidez. 73% realizavam algum tipo de trabalho e dessas, 93% perderam o trabalho ao engravidar. A pesquisa mostrou ainda que 29% dessas adolescentes já tinham separado de seus parceiros quando tiveram os bebês. 51% viviam em regime de casamento informal. Apenas 20% tinham uma união oficializada, mas 73% não planejaram a gravidez. 35,5% dessas adolescentes iniciaram a vida sexual antes dos 14 anos de idade. A pesquisa mediu também o sentimento dessas adolescentes na gravidez. 60% apresentaram sentimentos negativos como tristeza, arrependimento, medo, preocupação. 40% apresentaram sentimentos positivos como alegria e realização. Pacientes de risco Por que a adolescente é uma paciente de risco? Muitas são as avaliações, algumas contraditórias em relação a isso, segundo o médico Carlos Henrique Tavares. Mas num aspecto parece haver consenso: a maioria, por descuido, desinformação ou tentativa de esconder a gravidez, procura tardiamente ou não realiza o pré-natal. Para a enfermeira Ângela Tenório, do HU, falta um trabalho maior com as adolescentes, abordando a sua sexualidade, orientando para a prevenção de gravidez e de doenças sexualmente transmissíveis e, principalmente, para a necessidade do pré-natal. Os motivos que elas apresentam explicam mas não justificam, porque hoje tem equipes dos Programas de Saúde da Família em todos os bairros. Segundo ela, os riscos reduziriam bastante com o pré-natal. Lígia Gregório e Elenice Dantas aprenderam muito tarde a importância desses exames, capazes de detectar problemas na gestação e acompanhar o desenvolvimento do bebê. Por motivos diversos, as duas se esquivaram dos exames durante a gravidez e entregaram a gestação à própria sorte. Elenice alega que procurou o posto de saúde no 5º mês, mas como não realizou os exames solicitados pela médica, ficou com vergonha de voltar e levar um carão. Seu bebê nasceu prematuro, com baixíssimo peso (1, 25g) e ainda não teve alta. Para Lígia a lição foi mais dura. Abandonada pelo companheiro e com o plano de saúde cortado por ele, acomodou-se diante da necessidade de procurar um posto de saúde pública. Só no sétimo mês, com fortes dores na região do tórax, procurou um médico. Estava com uma infecção que já tinha afetado o bebê. Ficou internada para tratamento, mas quando saiu se descuidou dos remédios. A infecção avançou e rompeu a bolsa. Sua filha nasceu com 8 meses, 2,2kg, mas está na UTI há 18 dias, com infecção generalizada. Em sua pouca idade, Lígia acumulou experiências boas e ruins. Afirma que engravidou porque quis, estava apaixonada e se sentia amada, mas apesar de ter sido abandonada, nunca pensou em abortar. Hoje ela contempla a filha por meio dos vidros que isolam a UTI Neonatal do HU e comenta com a sabedoria de quem aprendeu com a própria experiência. Hoje eu sei que chorei muitas lágrimas sem importância. As lágrimas mais verdadeiras, que expressam meu sofrimento mais verdadeiro eu choro hoje, enquanto torço para minha filha sobreviver. Além da não realização de exames de pré-natal, outros fatores contribuem para aumentar o risco do parto de adolescentes. A pouca idade pode não ter permitido ainda o total desenvolvimento da pélvis, dificultando a passagem do bebê, mas se soma a isso uma série de condições psicológicas e sociais que afetam a jovem parturiente, desde a não aceitação pela família, o sentimento de abandono, o medo, a insegurança, a desorientação e a solidão e ainda as próprias mudanças físicas decorrentes da produção hormonal que acontecem na adolescência. Alguns estudos mostram que as adolescentes compõem um grupo de alto risco obstétrico por apresentarem um elevado nível de complicações quando comparadas às demais, que favorecem o nascimento de bebês prematuros e a probabilidade (quanto menor a idade), de gerar um bebê com baixo peso. (FA)