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Nº 5852
Cidades

ESPECIALISTAS DIZEM QUE VIOLÊNCIA EM AL TEM CAUSAS ESTRUTURAIS

Números apontaram situação alarmantes em relação à população negra alagoana

Por Lucas Rocha | Edição do dia 02/09/2021 - Matéria atualizada em 02/09/2021 às 04h00

“É preciso entender que não é apenas uma estatística. O problema em essência é bem maior”, avalia o historiador Cláudio Jorge Gomes sobre os dados divulgados na última terça-feira (31), pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), referentes à violência em Alagoas. As informações são do Atlas da Violência 2021, que trouxe dados graves sobre a discrepância racial no Estado. De acordo com o levantamento, um negro tem 42,9 vezes mais chances de sofrer homicídio do que um branco em Alagoas. A diferença foi a maior do país, uma vez que no segundo estado no ranking, o Amapá, a taxa é de 9 vezes, e a taxa nacional é de 2,6. Os números do Atlas fazem referência ao ano de 2019. Ainda segundo os dados, 99% das vítimas de homicídio nesse ano no estado foram negras e 100% das mulheres assassinadas eram negras. “Não se pode separar essa análise da formação histórica social do país. O Nordeste não é apenas uma região, é também um modo de produção que reproduz até hoje valores de uma discriminação estrutural, e essas relações permanecem. O Brasil carrega até hoje as suas questões coloniais”, aponta ainda o pesquisador. Para ele, os números ainda são reflexo também do sucateamento de políticas públicas no estado. “O Brasil começou a fragmentar a assistência social, colocando em risco até mesmo o acesso a alimentação de muitas famílias. Você enche os presídios, mas não dá à sociedade uma formação de qualidade, isso estoura em algum momento”, diz o historiador.

No contexto da educação, Alberto Jorge Ferreira, presidente da Comissão de Promoção a Igualde Social da Ordem dos Advogados do Brasil em Alagoas, lembra ainda da situação da Pandemia no acesso a educação de grande parte da população carente. “90% dos alunos de periferia estão fora da rotina escolar. Não tem celular ou computador para acompanhar. Com aumento do desemprego, esses jovens acabam por se inserir em diversas situações sociais, e o tráfico se aproveita dessas situações”, revela o advogado.

Além da falta de acesso público instrução, Ferreira aponta ainda a situação da violência policial no contexto do estigma da violência no estado. Segundo ele, o racismo estrutural e a inadequação das operações técnicas aos Direitos Humanos, leva a uma leva de homicídios e situações criminais que não são devidamente apuradas e coibidas pelo estado. “É mais alguém que morreu, mais um ali, e pronto. Não há desdobramentos para coibir essas situações”, aponta. Para ele, a discussão de ações para profissionalizar e levar iniciativas culturais e educacionais são um caminho para agir efetivamente nessa discrepância social. “A maioria da população negra é periférica, não chegam ao primeiro grau e são moradores das grotas. O que falta? É o que discutimos ao longo de anos. O Estatuto da Igualdade Racial nasceu exatamente para incentivar políticas públicas e dar oportunidades, como resposta a essa realidade, que é constante. Precisamos produzir cidadãos melhores, para que daqui a 10 anos não estejamos novamente discutindo esse tema. Falta educação e acesso à cultura, para que o caminho do crime não pareça sempre o mais fácil para os jovens que não tem oportunidades”, recomenda. Em consonância, Cláudio Jorge, citando autores da área da história, diz que “para questões estruturais, apenas respostas estruturais” dão resultado. “Os dados sobre a violência também estão relacionados à corrupção de um país. Estamos sem referência política, sem identidade humanitária, o que pode ser visto inclusive nas incompreensões sobre os riscos da pandemia. É uma crise humanitária, uma violência civilizatória. Precisamos de uma segurança pública eficiente e de uma nação verdadeiramente educadora e emancipadora”, conclui.

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