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Festa da padroeira � o �nico evento da regi�o

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FERNANDO COELHO Uma igreja situada sob um grande pé de cajueiro no alto de uma duna é a única construção de alvenaria de Pixaim. É também a única edificação que mobiliza todas as pessoas do povoado para retirada da areia que se acumula ao redor. É nela que ocorre a Festa da Imaculada Conceição, padroeira de Pixaim e grande homenageada no único festejo oficial da região. A festa ocorre no sábado mais próximo do dia 8 de dezembro, mas, em função das eleições do ano passado, foi transferida para o próximo mês de maio. No evento, uma das ovelhas do rebanho da comunidade é sacrificada e oferecida para a Santa. No dia da celebração, tocadores do zabumba chegam às cinco e meia da manhã, soltando fogos e entoando músicas animadas. “A festa é importante porque mostra traços da religiosidade local e também é um fator de retorno ao território. Tem muita gente que já foi embora e volta para a festa”, explica a antropóloga Madalena Zambi. Um dos mais animados para o evento é Aladim Calisto, 70 anos. “Eu tenho muito amor a isso aqui, é muito bonito e sossegado. Na cidade, você sai e não sabe se volta. Aqui é assim, quanto mais a gente caminha, mas aquilo pede para a gente caminhar. A maior felicidade que eu tenho aqui é a saúde e a natureza. Pra ficar bom, só faltam duas coisas: trabalho e energia elétrica”, confessa. Segundo Madalena Zambi, de um modo geral as pessoas de fora se referem a Aladim como uma espécie de líder da aldeia. No entanto, para os moradores, ele é uma pessoa bastante respeitada mas sem o status de líder. “Conversando com ele, eu tive o primeiro contato com a comunidade. Nesse encontro, quando estávamos nos despedindo, ele me disse: ‘Quando você voltar aqui, eu vou saber porque já conheço seu rastro na areia’. Essa última fala dele foi decisiva para que eu tomasse a decisão de fazer meu trabalho sobre Pixaim”, confidencia a pesquisadora. Aladim é irmão de “Seu Dié”. Sua prole é composta de doze filhos e mais de trinta netos. “Minha mãe nos criou aqui e eu criei todos os meus filhos aqui também”, fala com orgulho. Com nome de gênio e força de vontade nata, o pescador tem ainda um chiqueiro onde todas as ovelhas do povoado – que vivem soltas nas dunas – são recolhidas aos sábados para contagem. Todas são marcadas para facilitar a identificação dos donos. A casa de Aladim é das poucas onde a placa de energia solar funciona. Mesmo assim, ele reclama dos políticos, que em época de eleição passam falando em melhorias como luz elétrica e trabalho. “Eles prometem tanta coisa e nunca fazem nada”, delata. A fartura de outros tempos é lembrada com saudade. “Quando a gente plantava arroz, a coisa era outra. Nos dias de feira, quatro barcos, com quase trinta pessoas cada, saíam para Piaçabuçu. Hoje, é um só barquinho com uma ou outra pessoa”. Inverno Os meses de inverno trazem um pouco de esperança e modificam a paisagem e a relação com o lugar. Para os nativos, a vida fica menos sofrida e é possível cuidar melhor dos animais, do jardim e de plantações sazonais de frutas e pequenas hortas. Persistentes, alguns habitantes tentam plantar o arroz, mas sempre em áreas pequenas, sem maquinário adequado ou sem um sistema de irrigação eficaz: raramente obtêm sucesso. *** APA dificulta sobrevivência nas dunas A singularidade de Pixaim se tornou a própria condenação para as pessoas que vivem ali. Essa é a idéia defendida pela antropóloga Madalena Zambi. Sua pesquisa promove uma discussão sobre a tentativa de exploração turística do povoado, e busca rever a validade dos conceitos que prescrevem uma Área de Preservação Ambiental (APA), na qual a comunidade está inserida. Segundo a pesquisadora, com a criação da APA de Piaçabuçu, em 1983, e sua posterior implantação pelo Ibama, a partir de 1989, os nativos de Pixaim ficaram expostos ao constrangimento na exploração do solo e dos recursos disponíveis, que antes eram usados livremente por todos. Assim como o povoado, os territórios abarcados pela APA passaram a ser merecedores de proteção ambiental especial e o uso dos subsídios naturais pelos tradicionais usuários ficou vinculado a prescrições definidas em lei. Madeira Um dos principais problemas que a APA trouxe para a comunidade foi a proibição do corte de madeira. “Eles têm que construir casas a cada quatro anos, mas a APA proíbe e não oferece alternativa”, diz a antropóloga. “Isso gera desconforto e apreensão para os moradores quando eles precisam reerguer ou construir novas moradias. Precisamos ficar atentos porque, mesmo que haja boa intenção na criação de áreas protegidas em nome da conservação da biodiversidade e da natureza, a tutela da lei coloca em risco, no caso do Pixaim, a identidade e o patrimônio local”. A antropóloga lembra ainda que a APA é uma categoria de unidade de conservação que reconhece a importância da presença humana em seu interior, e que uma de suas finalidades é a melhoria da qualidade de vida das pessoas que vivem nela e em seu entorno. “É preciso que esse reconhecimento seja ampliado, para dar conta dos sinais que expressam a existência humana desta comunidade que não estava flutuando em um espaço indefinido. Estava aqui na foz”, teoriza. Na ótica de Madalena Zambi, com a criação da APA, as pessoas, de um modo geral, lançaram um olhar específico sobre o povoado. “No entanto, foi um olhar mediatizado por normas e critérios institucionais. A partir daí, Pixaim foi organizada dentro de um mundo maior do qual ela já era parte”, complementa.

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