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Igreja reconhece for�a de Padre C�cero

FÁTIMA ALMEIDA Repórter O bispo de Penedo, dom Valério Breda, não emite opinião sobre se a posição da Igreja quanto ao Padre Cícero foi um erro. Era uma figura questionada, com duas tradições historiográficas: uma que o via como um santo; outra que o condenava. A Igreja não quis se pronunciar. Ele foi a Roma por ter sido citado no suposto milagre da beata Maria Araújo, diz ele. Dom Valério é de opinião que os fatos mais importantes desse novo processo de canonização não estão na avaliação da veracidade ou não do sangue que jorrava da boca da beata Maria Araújo, quando recebia a hóstia das mãos de Padre Cícero, fato que reforçou e espalhou a sua fama de milagreiro, motivo da sua ascensão perante o povo, e queda perante a Igreja. Essa questão do sangue não tem mais como provar. Mas a mobilização espiritual que até hoje é inspirada pelo Padre Cícero não pode ser ignorada, reflete o bispo de Penedo. Fora da Igreja Apesar da fé, um sentimento de exclusão incomoda os devotos de Padre Cícero. Eles praticam a fé católica, são devotos fervorosos da Virgem Maria, mas não encontram, na Igreja, as imagens do santo de sua devoção. Como nunca foi canonizado, Padre Cícero só tem altar na casa dos seus devotos. Mas eles são milhões. E mesmo dentro da Igreja, já não é mais tabu falar no nome do Padre Cícero, como antigamente. Muitos padres já falam nele. O bispo do Crato, quando assumiu, louvou Padre Cícero em seu discurso. O pároco do Juazeiro também é muito sensível a esse movimento de fé em torno de Padre Cícero, diz dom Valério Breda. INJUSTIÇADO Mas para os devotos, o débito é maior. Os padres rezam para ele como quem reza para um morto, diz Ivanilde Batista. A Igreja foi muito severa com Padre Cícero, ao suspender seus votos. Havia muita inveja, muita incompreensão em torno dele, diz Dilma Ferreira. Ele foi muito injustiçado. Espero que seja canonizado perante a Igreja, porque para nós ele já é santo, diz Dona Mocinha. Na avaliação de Dóia, a Igreja deve a reabilitação de Padre Cícero e a sua canonização, transformando-o em santo, de fato e de direito. Queria alcançar essa graça antes de morrer!, diz ela, com esperança nas boas novas sobre o processo reaberto pela Igreja. De fato, Padre Cícero não foi canonizado pela Igreja, mas é tido como santo por sua imensa legião de fiéis espalhada pelo Brasil, sobretudo no Nordeste. Calcula-se que cerca de um milhão de pessoas visitam o Juazeiro todos os anos, para pedir a bênção ao Padim Cícero. ### Vida dedicada à fé, amor e trabalho Padre Cícero Romão Batista nasceu em Crato (Ceará) no dia 24 de março de 1844, filho de Joaquim Romão Batista e Joaquina Vicência Romana, conhecida como dona Quinô. Aos sete anos de idade começou a estudar. Aos 12 anos fez voto de castidade, influenciado pela leitura da vida de São Francisco de Sales. Em 1860, foi matriculado no Colégio do Padre Inácio de Sousa Rolim, em Cajazeiras - Paraíba, mas demorou pouco por lá. Teve que interromper os estudos, em 1862, para cuidar da mãe e das irmãs solteiras, devido à morte prematura do seu pai, vítima de cólera-morbo. A morte de Seu Joaquim, que era comerciante no Crato, deixou a família em situação financeira difícil. De tal forma que para ingressar no Seminário de Fortaleza, em 1865, Cícero Romão Batista precisou da ajuda de seu padrinho de crisma, o coronel Antônio Luiz Alves Pequeno. Foi ordenado no dia 30 de novembro de 1870 e retomou ao Crato. No Natal de 1871, convidado pelo Prof. Semeão Correia de Macêdo, Padre Cícero visitou pela primeira vez o povoado de Juazeiro (então pertencente a Crato), e aí celebrou a tradicional Missa do Galo. O padre visitante, de 28 anos de idade, impressionou os habitantes do lugar. E houve recíproca. Depois de alguns meses, no dia 11 de abril de 1872, ele fixou residência definitiva no Juazeiro e iniciou a melhoria da capela do lugarejo, dedicada a Nossa Senhora das Dores. SONHO Muitas biografias relatam que a decisão do Padre Cícero em se fixar moradia no povoado de Juazeiro foi devido a um sonho (ou visão) que teve. Contam que certa vez, ao anoitecer de um dia exaustivo, após ter passado horas a fio a confessar as pessoas, ele recolheu-se para descansar. No sono, teve um sonho com Jesus Cristo e os doze apóstolos sentados à mesa. De repente, o local é tomado por uma multidão, carregando pequenas trouxas, a exemplo dos retirantes nordestinos. Cristo, virando-se para os famintos, falou da sua decepção com a humanidade, mas disse estar disposto a fazer um último sacrifício para salvar o mundo. Porém, se os homens não se arrependessem depressa, Ele acabaria com tudo de uma vez. Naquele momento, Ele apontou para os pobres e, voltando-se inesperadamente ordenou: E você, Padre Cícero, tome conta deles! O padre levou a tarefa a sério. Uma vez instalado, entregou-se ao intenso trabalho pastoral que o tornou conhecido, com pregação, conselhos e visitas domiciliares, como nunca se tinha visto na região. Para auxiliá-lo no trabalho pastoral, Padre Cícero resolveu recrutar mulheres solteiras e viúvas para a organização de uma irmandade leiga, formada por beatas, sob sua inteira autoridade. O MILAGRE A primeira manifestação dos poderes milagrosos atribuídos a Padre Cícero aconteceu em 1889, quando a hóstia consagrada colocada na boca da beata Maria de Araújo transformou-se em sangue. O fenômeno, de início, foi tratado com cautela pelo padre, mas se repetiu outras vezes. Foi visto e estudado pelos médicos Marcos Madeira e Idelfonso Lima e pelo farmacêutico Joaquim Chaves, que atestaram ser um fato inexplicável à luz da ciência. A notícia chegou ao conhecimento do bispo de Fortaleza, Dom Joaquim José Vieira, que chamou Padre Cícero para prestar esclarecimentos e mandou instalar uma Comissão de Inquérito para investigar os acontecimentos. Padre Cícero Romão Batista morreu no dia 20 de julho de 1934, aos 90 anos. Calcula-se que cerca de 70 mil pessoas compareceram ao seu sepultamento, em Juazeiro |FA