loading-icon
MIX 98.3
NO AR | MACEIÓ

Mix FM

98.3
quarta-feira, 30/07/2025 | Ano | Nº 6021
Maceió, AL
28° Tempo
Home > Cidades

Cidades

Rodovia p�ra turismo em Mar Vermelho

Ouvir
Compartilhar
Compartilhar no Facebook Compartilhar no Twitter Compartilhar no Whatsapp

CARLA SERQUEIRA Repórter Mar Vermelho - Dona de três fontes de água mineral com qualidade nunca explorada e de um ar puro prescrito por médicos para o tratamento de doenças respiratórias, a cidade de Mar Vermelho convida ao descanso. Sua altitude permite visões raras do Estado de Alagoas, enquanto o verde das montanhas revela um pedaço de paraíso abandonado. Sem rodovia, a cidade não pôde dar passagem ao desenvolvimento e os sonhos ficaram atolados no meio do caminho. Talvez um desejo de avanço tenha lhe rendido um parentesco com a Suíça, país europeu cujo clima atrai milhões de pessoas todos os anos. A chamada ?Suíça Alagoana? abriga, numa temperatura média de 16º, um povo pacato e hospitaleiro. Em seu território estão espalhadas dezenas de lagos que compõem trilhas inéditas aos desbravadores do ecoturismo. Apesar de estar localizada a 636 metros acima do nível do mar, alguns picos ultrapassam esse limite, permitindo visões panorâmicas de serras e planícies. Num passeio rumo ao Poço Comprido ou à Pedra Branca - promissores cartões-postais da cidade - é possível ouvir nascentes de rios escorrerem entre a mata e formarem quedas d?água na paisagem. É em Mar Vermelho que nasce o Rio São Miguel, um dos maiores da hidrografia alagoana. À noite, no ponto da cidade chamado Alto da Saudade é possível visualizar Arapiraca, Palmeira dos Índios e Taquarana, num espetáculo que mistura as luzes das cidades com as estrelas, tão próximas que dão a impressão de estarem a poucos metros de distância. Mas o desleixo ou mesmo a falta de interesse político na região faz de Mar Vermelho um lugar desconhecido. Sua economia, outrora alimentada pela agricultura familiar, hoje pertence a poucos fazendeiros que forraram de capim as serras. A fauna é praticamente inexistente diante do desmatamento. Metade de seus moradores, desde a fundação da cidade, em 1962, migrou para outras regiões. Os que ficaram temem ver a cidade extinguir-se. Cheiro de sangue ou flor No livro Mar Vermelho - A História da Suíça Alagoana, da escritora Nailsa da Silva Barros, publicado em 2000, a violência dos anos 60 consta como explicação para uma das versões que dão origem ao nome da cidade. ?As desavenças eram resolvidas, à luz do dia, na ponta da faca, no porrete ou na espingarda. Era raro o mês em que não morriam dois ou três na feira?. O primeiro prefeito eleito de Mar Vermelho, Neto Lins, 84, discorda desta versão e prefere acreditar que quem deu nome à cidade foi a natureza. Na lagoa que fica na entrada da cidade, segundo ele, flores vermelhas caíam dos pés de gravatá direto na água, ondulada pelo vento, formando um ?mar vermelho?. ?A escritora deve ter se equivocado. Mar Vermelho não tem este histórico de violência?, rebate. ### Personagens são memória viva da cidade Mar Vermelho - Poucos são os registros sobre a história de Mar Vermelho. Grande parte de seus fatos está guardada na memória dos idosos que têm, em média, 85 anos e vivem em casebres, distribuídos nas pequenas ruas da cidade. Enquanto conversa, ?seu? Elpídio Antônio Farias, hoje com 88 anos, parece fixar o olhar no tempo, talvez nas lembranças de sua juventude. Desde 1938 mora na Ladeira da Liberdade, em Mar Vermelho. Natural de Santana do Ipanema, se tornou um dos maiores sanfoneiros de Alagoas. Preferido das elites políticas e de ricos fazendeiros, começou a tocar com 8 anos, acompanhando o pai. Esteve com jagunços e vaqueiros perigosos, como ele mesmo classifica. ?Já vi gente matar um só para testar o revólver?. Lúcido e dono de uma alegria encantadora, seu Elpídio mudou a expressão quando lembrou de uma cena violenta que o fez abandonar a sanfona por 22 anos. ?Tava tocando quando mataram, com uma facada nas costas, um grande amigo meu. Aí não quis mais saber de dança?. Como precisasse da música para se revelar por completo, seu Elpídio levantou e pegou seu fole de oito baixos, um raro instrumento com cem anos de idade. Já compôs com a banda de Luís Gonzaga, de quem fala com muita intimidade. ?Ele dizia que eu tocava melhor que ele, mas não tinha futuro porque nunca quis gravar?. Falou também da amizade que fez com os compositores José Calixto e Gerson Filho. ?Quando a turma de Luiz Gonzaga vinha tocar em Alagoas, mandava me buscar. Aí era oito dias de forró?. Hoje, seu Elpídio mora com a esposa numa casa apertada. Segundo ele, tem mais de cinquenta filhos espalhados no Nordeste. Com a saúde limitada, a história de seu Elpídio se confunde com a da cidade. Sem assistência, ambos caminham para o injusto anonimato. CS ### Alto-falantes em postes divertem o povo da cidade A música também traduz a satisfação de José Gomes, de 73 anos, outro personagem de Mar Vermelho que, gratuitamente, faz a alegria dos moradores há mais de cinqüenta anos. É de um quartinho na entrada de sua casa que sai o som propagado por três alto-falantes presos em postes. Em qualquer local da cidade é possível ouvir, entre as 15 e 18h, a seleção de música que José Gomes separou. ?Se viajo, todo mundo sente falta?, comenta. ?Antes eu colocava de manhã, de tarde e de noite; mas depois foram chegando as televisões e com elas, as novelas. Para não abusar, determinei horário?. Mas quando chegam as datas comemorativas, a festa dura o dia inteiro. ?Tenho música para tudo: dia da criança, da bandeira, do índio... A última homenagem foi quando o papa morreu?. Os moradores da pequena cidade podem dizer que possuem um sistema de som próprio, fundamental em casos de emergência. ?Atenção motorista da ambulância: saída urgente! Comparecer ao posto de saúde?, demonstra. ?Tenho o maior prazer em ajudar. Tem gente que chega angustiada porque perdeu uma chave ou uma carteira. Eu anuncio e quem achou vem entregar?, conta, dizendo-se apaixonado por rádio. ?Comecei trabalhando com um amplificador a válvula?. O acervo é variado. Em suas estantes é possível encontrar desde Nelson Rodrigues a Mastruz com Leite.|CS ### Condomínio é abandonado por causa de lamaceiro Mar Vermelho - Inaugurada em 1962, a estrada que dá acesso a Mar Vermelho nunca foi asfaltada. A cidade tem grande potencial turístico, já atraiu investidores, mas, no inverno, suas expectativas vão, literalmente, por água a baixo. Um condomínio com 30 casas foi abandonado por inteiro. Os donos dos imóveis visitaram a cidade, gostaram e resolveram construir, desejando usufruir do clima ameno. No inverno, desistiram, quando viram o descanso se transformar em lama. Distante 111km de Maceió, a cidade tem acesso pela rodovia AL-110, passando por Viçosa. A prefeita de Mar Vermelho, Juliana Almeida, afirmou que já foi feita licitação e, inclusive, existe empresa contratada para asfaltar a estrada. Em épocas de chuva, a cidade fica isolada. ?A rodovia não foi asfaltada ainda por questões políticas?, disse. ?O governador teve um desentendimento com o ex-prefeito e preferiu prejudicar toda a população de Mar Vermelho, brecando o projeto?. O diretor do Departamento de Estradas de Rodagem (DER), Aerson Mendonça, não concorda com a versão da prefeita. ?Não acredito nisso. O problema é que faltam recursos?. Terraplanagem O orçamento para asfaltar o trecho da AL-110 soma R$ 7 milhões. ?Parte da terraplanagem já foi feita. Faltam a pavimentação e o asfalto?, afirmou Aerson. Na penúltima casa da Ladeira da Liberdade mora José Afonso de Almeida Neto, um ex-vereador de Mar Vermelho que hoje está descrente. ?Nesses quarenta anos vimos centenas de medições topográficas. Só vendo eu acredito que a pista será asfaltada?, fala, entristecido. ?Vejo na televisão a divulgação do turismo rural, certos lugares menos bonitos que Mar Vermelho. O que falta é interesse político?, critica. A falta de expectativas fez migrar 50% da cidade. Em 1962, a população de Mar Vermelho era de 8.500 pessoas. Hoje, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o município tem 4.078 residentes. ?Muita gente foi embora. Ao invés de progredir, está acontecendo o contrário?, afirma José Afonso. Ele conta que quatro das oito fornecedoras de leite abandonaram a região. ?As granjas também estão fechando e migrando para outras cidades?. Mas, mesmo diante da impotência econômica - o município sobrevive apenas do Fundo de Participação dos Municípios (FPM) - há quem não desista de sonhar. Gustavo Orlando Torres Lins, de 59 anos, mostra, entusiasmado, o projeto de ampliação de seu restaurante. ?Quero chegar na frente dos grandes. Tem muito empresário esperando só o asfalto para investir aqui?. Ele vive do salário de professor, quer construir chalés no terreno que tem atrás do seu estabelecimento. Aerson Mendonça, diretor do DER, informou que não há previsão para o asfalto chegar. Os recursos para a obra viriam da Contribuição sobre Intervenção de Domínio Econômico que, para este ano, já está comprometida na recuperação de outras estradas. Na mesma situação estão Pindoba, Belo Monte, Carneiros e Senador Rui Palmeira. CS

Relacionadas