Cidades
Circo e arte ajudam a afastar jovens do mundo do crime

| NIVIANE RODRIGUES Repórter Os corredores da Unidade de Internação nos conduzem ao pátio onde jovens esperam ansiosos para mais um ensaio do circo. Uma preparação para a festa do Dia dos Pais, neste domingo, quando eles farão uma espécie de pré-estréia. O circo foi adquirido com verba federal, mas a lona estava amontoada em um canto da unidade desde 2003. Só agora o projeto começa a ser viabilizado e os resultados já podem ser sentidos. Ao chamado do palhaço Pirulito, filho do Birinho, um dos mais antigos donos de circo de Maceió, os jovens infratores respondem com um sorriso. Cada um tem um papel e quando estão no picadeiro é como se a Unidade fosse a própria vida. É assim com C., o jovem preso por assaltar o dono de um mercadinho no Trapiche. Vivia no Virgem dos Pobres, um lugar muito violento e onde eu tinha uma bronca. Aqui aprendi artesanato e participo do circo. Hoje tudo o que quero é sair e ir embora para São Paulo, onde espero trabalhar. Dando tudo certo, mando buscar minha família, diz. E., 18, é o equilibrista e também toca na banda de música. De tanto ensaiar e de tanta disposição, ele consegue equilibrar até um carro-de-mão no queixo, arrancando aplausos dos colegas. E. está há nove meses na Unidade de Internação Masculina por envolvimento em latrocínio no Jacintinho. A arma era do meu colega. Estava desempregado e aí entrei nessa; estou arrependido, mas tem mal que vem para o bem, afirma. Quem continua nessa vida ou vem para cá ou vai para o caixão. Aqui pelo menos tem tempo de aprender e refletir sobre a coisa errada que fez, diz E., para quem hoje só falta a liberdade. Preso 20 vezes A agitação de C., 14, não esconde o menino traquino que ele reconhece ser. Tanto é que ganhou o papel de palhaço do circo e hoje é conhecido como o Zé Colméia. Vivia nas ruas de Boca da Mata roubando o que encontrava pela frente. Minha família não me agüentou e me botou pra fora de casa. Já tinha sido preso 20 vezes porque roubava e usava drogas. Agora, depois que vim para cá, sei que a melhor coisa é a liberdade. Quero sair daqui e arrumar um trabalho, confessa. O ensaio tem a participação das meninas da Unidade de Internação Feminina, que se esmeram nas piruetas e cambalhotas para não fazer feio na apresentação. Além da arte circense, a direção da unidade, vinculada à Secretaria Especializada de Direitos Humanos, implementou outras ações para tentar reverter o quadro de reincidência que era elevado. Nosso papel é não permitir que ele retorne à unidade, reconhece o secretário de Direitos Humanos, José Roberto. Por isso investimos em programas culturais e na educação desses jovens, além de cursos profissionalizantes de serigrafia, artesanato, doces e salgados e de instalação e manutenção de microcomputadores, diz. Na unidade também está sendo montada uma biblioteca, uma padaria e uma pizzaria e há contatos com a Associação Brasileira de Inclusão Digital para que nos próximos 15 dias comece a funcionar um laboratório de informática, que deverá atender também as famílias dos infratores. ### Trabalho resgata a auto-estima Foi justamente a profissionalização e a oportunidade de mostrarem que estão dispostos a recomeçar que garantiram a três jovens egressos da Unidade de Internação uma vaga no mercado de trabalho. I., 19, R.,18, e J., 22, prestam serviço na Secretaria de Direitos Humanos, no Centro de Maceió. Trabalham com serviços gerais e ganham um salário mínimo por mês. Do passado, tudo o que esperam é esquecer. Aprenderam serigrafia, artesanato, doces e salgados, informática e mecânica de automóveis e hoje se sentem preparados para enfrentar o mercado. I. passou um ano e dois meses na unidade, onde respondeu por homicídio. Usou arma branca (faca) para matar um rival, que encontrou em uma festa no Mirante da Sereia e depois de uma briga acabou cometendo o crime. Diz que matou em legítima defesa, mas confessa estar arrependido. Com um comportamento considerado bom pela equipe da unidade, saiu e foi logo chamado para trabalhar na secretaria. Passei situações que não desejo para ninguém. Agora acho e tenho certeza de que terei um futuro melhor, acredita I., que é casado com uma auxiliar de cozinha e tem dois filhos. Amizades ruins Vida nova é o que espera também R, que a exemplo de I. se envolveu em uma briga e, drogado, não hesitou em sacar a arma e matar o rival. O revólver foi comprado para se defender dos inimigos, mas acabou levando-o para a prisão, onde ficou durante um ano. Minhas amizades eram ruins. Ia pelos outros e acabei matando. Não tinha motivo para matar; machucou a minha família e a dele. Na unidade aprendi o que não conhecia aqui fora e graças ao apoio de meus pais consegui sair dessa, diz R., que começou a fumar maconha aos 12 anos e hoje se libertou do vício. Um copo de cerveja jogado no rosto foi o motivo para J. matar. Há 3 anos e 7 meses na Secretaria de Direitos Humanos, ele lembra com detalhes o dia do crime. Estava num trio elétrico no Benedito Bentes e o cara com quem eu já tinha brigado apareceu. Aí a gente brigou de novo; ele jogou cerveja em mim e eu puxei uma faca e matei ele. Fiquei na Unidade de Internação por 1 ano e dois meses e saí em 2002, recorda. Hoje J.C. voltou a estudar, cursa a 7ª série do ensino fundamental, casou e tem um filho. Minha vida agora é tranqüila, graças a Deus. |NR