Cidades
AL est� fora, mas cuidado com mudan�a

| CARLA SERQUEIRA Repórter Começa hoje mais um horário de verão no Brasil. Em Alagoas, os relógios não mudam, mas a rotina de algumas pessoas vai ficar descompassada. Afrânio Jorge da Rocha trabalha há 23 anos no aeroporto de Maceió. Seus dias são pautados pelos horários de chegada e partida de aviões. Ele comanda uma equipe de 12 carregadores. Todos vão ter que chegar mais cedo ao trabalho. No começo a gente se perde um pouco, mas depois acostuma, diz ele. A representante de uma companhia aérea afirma que são os passageiros os mais atrapalhados. Todos têm de ficar atentos. O avião parte de lá uma hora na nossa frente e chega adiantado com relação ao nosso horário. Nos primeiros dias sempre tem alguém que perde vôo, alerta Jaqueline Nascimento, que coleciona 10 anos de experiência. Na visão médica, o incremento de uma hora não interfere na memória biológica. É mais uma questão de hábito. As horas do dia e da noite interferem na liberação de alguns hormônios, mas a diferença de 60 minutos não chega a provocar uma inversão no organismo, explica o neurologista Ronald Mendonça. Mas àqueles que, por natureza, perdem a hora, é bom redobrar a atenção. O horário de funcionamento de alguns serviços aqui em Alagoas vai estar submetido aos ponteiros do Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Até a zero hora do dia 19 de fevereiro, estas regiões estarão uma hora à frente do Norte e do Nordeste. Quem gosta de evitar filas e prefere chegar no final do expediente bancário, é bom ir se acostumando desde já. Amanhã, as agências abrem às 9h e fecham às 15h. Quem vai utilizar serviço dos Correios também precisa apressar a entrega de correspondências. Os carros de coleta vão passar nas agências uma hora antes que o habitual. Já as Casas Lotéricas abrem normalmente, das 8h às 18h, mas agora os jogos no Estado devem ser feitos duas horas antes dos sorteios. Nas agências do Multibank não haverá mudança no atendimento aos usuários. E só para reforçar, a programação das emissoras de televisão também é antecipada. Com exceção do jornal Bom Dia Alagoas, da TV Gazeta, que começa às 6h30, os demais programas serão exibidos uma hora mais cedo. Este é o 30º horário de verão instituído no Brasil. O primeiro foi em 1931. Há 20 anos o País corre o risco de apagar nos meses mais quentes do ano. A Gazeta conversou com especialistas e descobriu o quão vulnerável está o sistema brasileiro de geração e transmissão de energia. A corrida agora é rumo às fontes alternativas. Indústrias recorrem aos ventos e até ao bagaço de cana para afastar prejuízos. ### Falta de conservação causa desperdício Quando o homem conseguiu extrair energia elétrica da força dos rios, imaginou que havia descoberto algo inesgotável. No Brasil, a partir de 1883, mais de cem usinas foram instaladas ao longo de sua hidrografia. As indústrias se multiplicaram, as cidades cresceram. Vieram os eletrodomésticos, os artigos digitais e uma demanda hoje ameaçadora. Vieram também os impactos ambientais; e a limitação das hidrelétricas, responsável pelo fornecimento de quase 90% da energia utilizada no País, foi constatada pelo governo federal que agora lança programas de incentivo para a exploração de outras fontes. O potencial hidráulico dos rios brasileiros, especialmente os do Nordeste, está praticamente esgotado, afirma o engenheiro eletricista Vladimir de Abreu, assessor da presidência da Companhia Energética de Alagoas (Ceal). Ele explica que a necessidade do horário de verão é grande. Entre outubro e fevereiro, as nossas linhas ficam muito carregadas e o risco de haver um desligamento é maior, diz ele. Em abril de 2001, todos os brasileiros foram obrigados a diminuir o consumo de energia doméstica, no chamado racionamento. O pico do sistema, como dizem os técnicos, chegou a 56 mil MW (mega watt) na época. Hoje, de acordo com o Operador Nacional do Sistema (ONS), entidade de direito privado responsável por coordenar a geração e transmissão de energia elétrica no País, o consumo nos horários de ponta está na média de 52 mil MW. Caso o Horário de Verão não seja adotado, o Brasil pode chegar de novo aos 56 mil MW e desligar mais uma vez, segundo o órgão. Outro dado preocupante tem a ver com o desperdício. Cerca de 1/3 da produção de energia elétrica brasileira é perdida ao passar por fios mal conservados, conforme relata o professor Josealdo Tonholo, coordenador do grupo de Eletroquímica da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Investiu-se muito pouco em outras fontes de energia e quase nada no sistema de transmissão. O simples fato de não haver a troca de lâmpadas públicas por outras mais econômicas ou a ausência de manutenção nos fios, provoca um desperdício de 20% da produção de energia do País, diz ele. Estamos perdendo muito dinheiro. Os transformadores de 20 anos atrás são os mesmos que estão funcionando hoje, quando já existem outros bem mais econômicos, afirma o professor Tonholo. Indiferentes Alagoas e os demais estados do Norte e Nordeste não fazem diferença no processo. Nos meses mais quentes, o sol tarda a desaparecer nas cidades mais distantes da linha do Equador, localizadas nas regiões Sul, Sudeste e Centro-Oeste. Se por aqui escurece às 18h, independente de estação climática; durante o verão no Sul, por exemplo, a noite só chega depois das 19h. De olho na oferta extra de luz natural, o governo federal decreta o novo horário para folgar o Sistema Interligado Nacional (SIN) de energia elétrica, fracionando o uso. Milhões de pessoas saem mais cedo do trabalho e a demanda de energia doméstica deixa de coincidir com a demanda de energia pública, quando, por exemplo, a iluminação das vias e ruas é acionada. A economia na verdade é muito pouca, gira em torno de 1%. O mais importante é que no final do dia, quando a solicitação de energia é maior, a demanda é fracionada e aí aumenta a confiabilidade do sistema, explica o engenheiro Vladimir de Abreu. Para as indústrias brasileiras, o verão significa tensão. É por isso que muitas delas estão investindo em pesquisa e produzindo a própria energia. |CS ### Consumo de energia cresce 4,7% ao ano O horário de verão por si só não anula o risco de novos apagões no Brasil. A corrida rumo às fontes alternativas não é à-tôa. De acordo com o Ministério de Minas e Energia, o consumo de energia elétrica no Brasil deve crescer 4,7% ao ano, até 2009. Sabendo disso, indústrias investem em pesquisa para se tornarem independentes das hidrelétricas e afastar prejuízos vultuosos. Estamos desenvolvendo eletrodos que vão possibilitar redução de 2% a 3% no consumo de energia, diz o professor Josealdo Tonholo, coordenador do grupo de Eletroquímica da Ufal. Ele atua na Braskem, a maior fábrica de cloro e soda do Brasil, instalada no Pontal da Barra, e também grande consumidora de energia no Estado. Para se ter uma idéia, a indústria consome quase o mesmo que a cidade de Maceió inteira, revela, explicando que a economia na ordem de 3% significa iluminação para uma cidade com 20 mil habitantes. As usinas de açúcar e álcool do Estado também estão ligadas na economia. Com o bagaço da cana que produzem, elas geram a eletricidade de que necessitam, fazendo crescer no Brasil as termelétricas. Elas já são utilizada no País, mas com uma participação pequena dentro do Sistema Interligado Nacional (SIN). A expectativa do Ministério de Minas e Energia é ver a contribuição das termelétricas saltar de 9,2% para 25% até 2009. A partir do vapor, a energia é fabricada. Para isso são mais usados carvão e gás natural. Mas o que tem pautado as discussões entre especialistas é a utilização da biomassa como combustível. Formada por resíduos de origem vegetal, a biomassa quando carbonizada não polui o meio ambiente, uma vez que os gases produzidos retornam para as plantas no processo de fotossíntese. O efeito estufa, que tem provocado grandes catástrofes naturais, é rigorosamente nulo com o uso da biomassa, diz o engenheiro José Carlos Maranhão, proprietário de duas usinas de cana em Alagoas. A entrada de novas fontes renováveis de energia no Brasil vai evitar, segundo o governo federal, a emissão de 2,5 milhões de toneladas de gás carbônico por ano na atmosfera. Já para as indústrias, essas fontes vão significar mais lucros. A energia elétrica chega a encarecer o produto em até 50%, revela o pesquisador Josealdo Tonholo. A partir do próximo ano, duas usinas alagoanas vão vender a energia que extraem do bagaço de cana para a Eletrobrás. No Nordeste, outras fontes de energia começam a se espalhar. No Ceará estão as experiências mais bem-sucedidas na extração de energia elétrica dos ventos, a chamada energia eólica. Outra alternativa é a energia solar. O professor José Leonaldo de Souza, do Departamento de Meteorologia da Ufal, acredita que os estados nordestinos vão se tornar grandes potências no fornecimento de energia. O petróleo vai acabar e o futuro será a energia produzida a partir do Sol. Mas para isso é preciso investimentos, salienta. CS