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Nº 5759
Cidades

De pe�a em pe�a, grupo tenta reconstruir hist�ria

FERNANDO VINÍCIUS Repórter Maragogi - Preocupado com a falta de registros da história de Porto Calvo, um grupo de moradores da cidade começa a reunir peças para a formação de um acervo destinado ao Museu Calabar. O resgate do personagem alagoa

Por | Edição do dia 15/01/2006 - Matéria atualizada em 15/01/2006 às 00h00

FERNANDO VINÍCIUS Repórter Maragogi - Preocupado com a falta de registros da história de Porto Calvo, um grupo de moradores da cidade começa a reunir peças para a formação de um acervo destinado ao Museu Calabar. O resgate do personagem alagoano que teve sua trajetória deturpada pela versão oficial é considerado ponto de honra. Para tanto, tentam articular com órgão públicos e entidades culturais ações que resultem na recuperação de relíquias, na instalação do museu e retomada da auto-estima da comunidade por meio do conhecimento do seu passado. Liderados pelo empresário Adelmo Monteiro, 48, dono de uma casa lotérica, empresários e profissionais liberais formam um reduzido grupo de pessoas que está aos poucos recolhendo peças que contam o passar do tempo na localidade considerada por alguns historiadores como a mais antiga de Alagoas. Polêmicas à parte, certo mesmo é que muitos objetos não se encontram mais na cidade. Alguns estão expostos em casas culturais de Maceió e do Recife, outros foram vendidos ou simplesmente doados para visitantes e colecionadores de arte da Bahia e do Rio de Janeiro, por exemplo. Monteiro arruma sobre uma mesa em sua casa o que já conseguiu reunir para um dia expor ao público. São pedaços de tijolos pequenos, de cor amarelada, balas de canhão, moedas e um par de utensílios de cozinha, uma colher e um garfo com o símbolo do governo holandês, um cata-vento, e outra peça que ainda não se descobriu o uso. “Parte desse material foi doada por pessoas daqui mesmo e alguns eu mesmo consegui”, comentou com uma ponta de satisfação, convidando para ver outras investidas do grupo. Ao lado do professor de História Amaro Petrúcio Oliveira Fereira, 52, parceiro no projeto de resgate do patrimônio histórico de Porto Calvo, Monteiro mostra o ponto que está sendo escavado na tentativa de localizar um dos túneis que serviram para fugas estratégicas dos perseguidos pelos invasores. O buraco aberto na cadeia abandonada da cidade ainda não possibilitou o encontro de alguma passagem subterrânea. Apesar de o imóvel ser considerado “novo”, se comparado à história de Porto Calvo, ele representa bem a falta de preservação que praticamente eliminou da arquitetura urbana as marcas do passado. Depredado, restam apenas as paredes sem portas nem janelas. Sequer possui teto e apenas a grade de uma cela resiste à ação do tempo e dos vândalos. Adelmo conseguiu a chave para guardar no local as ferramentas usadas nos trabalhos de prospecção. Do lado de fora, o que restou das paredes serve de apoio para os varais de roupas das casas vizinhas. ### Ignorado, patrimônio guarda relíquias de tempos remotos A tentativa de encontrar passagens que levem aos lendários túneis remetem à busca do Santo Graal, o cálice usado na última ceia de Jesus Cristo. Os registros históricos são incontestáveis. Resta encontrá-los. Sobre os subterrâneos, indícios de sua existência devem ser considerados, ainda mais quando se questiona como Calabar e cerca de 100 soldados holandeses teriam conseguido entrar na igreja matriz de Porto Calvo com a cidade tomada pelo exército luso-espanhol. Usada como local de resistência durante 48 horas, a igreja onde provavelmente o filho da valente cidade foi batizado ou fez sua primeira comunhão serviu como pano de fundo para seu enforcamento sob o olhar da população. O julgamento sem direito à defesa condenou Calabar à morte, acusado de traição por entender que seria melhor para a então colônia brasileira ficasse sob o julgo do governo da Holanda ao invés da Coroa portuguesa. Degraus em alguns pontos das margens do rio sugerem acessos às aberturas feitas às margens do Manguaba, única forma de os navios atingirem Porto Calvo. A lógica indica que a provável rede subterrânea ligaria setores estratégicos da cidade: a igreja matriz, uma construção registrada em uma gravura holandesa com sua base repleta de canhões - local da atual sede da 10ª Coordenadoria Regional de Ensino - e a fortificação existente no ponto mais alto da cidade, chamado erroneamente de “Alto da Forca” quando o correto é “Alto da Força” por causa da fortaleza militar erguida pela aliança entre portugueses e espanhóis. O espaço privilegiado do ponto de vista militar é ocupado atualmente pelo Hospital Municipal, em reforma desde julho de 2005. Relatos indicam que durante sua construção, nos anos 40 do século passado, foram encontrados diversos objetos, a maioria doados pelo então prefeito Manoel Ferreira de Barros. Parte desse acervo, inclusive “restos de fardamentos”, está em exposição na sede do Instituto Histórico e Geográfico de Alagoas, em Maceió, de acordo com Adelmo Monteiro. Entradas de túneis foram irremediavelmente lacradas com a construção da unidade de saúde. Vizinho ao hospital, já nos anos 70, foi erguido outro prédio para serviços de saúde pública. Durante os serviços, novas descobertas aconteceram e mais uma vez desperdiçadas com doações para particulares da cidade e de outros locais. O patrimônio de Porto Calvo escorria como areia fina entre as mãos dos que não percebiam a importância de manter no município as relíquias de sua própria história. |FV ### De Zumbi a Calabar, templo é referência O templo que homenageia atualmente Nossa Senhora da Apresentação tem em sua fachada a inscrição com o ano de 1610. Para Audemário Lins, autor de obras sobre Calabar e Zumbi dos Palmares, a cartela indica o término de sua construção. Ele acredita que o começo da obra deve ter ocorrido em 1597, corrigindo uma informação passada aos turistas e estudantes quanto ao significado do registro. Sobre a versão de que o herói negro Zumbi dos Palmares tivesse sido coroinha da igreja, Audemário diz que não encontrou em suas pesquisas registro que atestasse a suposição. Ele acredita que “Zumbi, uma criança escrava, deve ter feito serviços de limpeza na igreja para o padre”. As observações feitas por Audemário, mais conhecido por Calabar por causa de sua dedicação à vida do conterrâneo, são frutos de “muitas horas de leitura” que lhe renderam 6 graus em cada lente dos óculos. Cansado, garante ter concluído a última investida sobre a vida do mulato filho de uma índia e de pai desconhecido. Trata-se do original ainda sem previsão de publicação intitulado “Tributo a Calabar e Arciszewiski”, este um oficial polonês que lutou ao lado do brasileiro a serviço do príncipe Maurício de Nassau. FV

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