ECONOMIA AZUL
Algas além das praias: Fenômeno natural pode ser reaproveitado
Elas costumam ter como destino o lixo, mas poderiam ser usadas em produtos alimentícios e de beleza


É comum encontrar quem goste de caminhar na praia, mas poucos sabem que podem estar pisando em um material valioso para a economia azul. As algas arribadas, uma espécie de alga marrom, aparecem frequentemente no litoral brasileiro, inclusive em Maceió. No entanto, em vez de serem aproveitadas, essas algas costumam ter um destino pouco nobre: o lixo.
A faixa de algas que surge nas praias é um fenômeno natural. Sem raízes fixas, elas se desprendem dos recifes e são levadas pelas correntes até a areia. Por causa da aparência escura e da possível presença de matéria orgânica em decomposição, os sargaços, como são conhecidos, acabam sendo tratados como resíduos. Entretanto, com uma abordagem baseada na economia azul—modelo que busca desenvolvimento sustentável utilizando recursos marinhos de forma consciente—essas algas poderiam ter um destino mais produtivo.
A professora da UFAL, Dra. Élica Coelho Guedes, que pesquisa algas marinhas em Alagoas desde 1990, destaca que os argumentos para a remoção do sargaço são, muitas vezes, equivocados. “Alga não tem cheiro! O que pode estar misturado a elas—como matéria orgânica deixada por banhistas ou restos de animais—é o que pode causar mau odor”, explica.
Aproveitamento comercial e desafios da coleta
Em vez de serem descartadas, essas algas poderiam ser utilizadas na produção de cosméticos, alimentos, adubos e rações. No entanto, para uso em produtos alimentícios e de beleza, é necessário coletar as algas vivas, ainda fixadas nos recifes, ou utilizar algas cultivadas. Já no caso das algas arribadas, estudos indicam que elas são viáveis para adubação de hortaliças e produção de ração animal, desde que a coleta seja feita corretamente.
“O maior desafio para o aproveitamento comercial dessas algas é a forma de coleta. É fundamental minimizar a retirada de areia junto às algas. Em nossas pesquisas, a coleta é sempre manual, seguida de limpeza e lavagem antes dos estudos”, destaca Élica.
A ALURB (Autarquia Municipal de Desenvolvimento Sustentável e Limpeza Urbana) afirma que a coleta na faixa de areia é contínua e realizada manualmente pela equipe de limpeza diária. No entanto, quando há acúmulo excessivo de algas em decomposição, maquinário é utilizado, o que pode inviabilizar o reaproveitamento desse material.
Impactos ambientais da remoção excessiva
A retirada frequente dessas algas exige atenção, pois pode gerar impactos ambientais significativos. “A remoção excessiva pode interromper o ciclo natural de decomposição das algas, prejudicando organismos que dependem desse material como alimento ou abrigo”, alerta a professora.
O professor da UFAL Emerson Soares, biomédico e engenhe
iro de pesca, reforça essa preocupação. “Vários organismos marinhos utilizam as algas como fonte de alimento e refúgio. A retirada pode ser feita, mas não em grandes quantidades e sem prejudicar algas que ainda não atingiram a maturidade reprodutiva”, afirma. Atualmente, segundo a ALURB, a coleta de algas é feita exclusivamente por maquinário, sem um controle detalhado da quantidade removida ou da frequência das operações, o que pode impactar os ecossistemas locais.
Projeto aposta no uso sustentável das algas
Com foco na sustentabilidade, a professora Élica desenvolve um projeto em parceria com escolas para aproveitar as algas como adubo orgânico. “Já temos um trabalho aprovado para ensinar estudantes do ensino médio a coletar e preparar essas algas para a produção de adubos. As hortaliças cultivadas serão utilizadas na alimentação escolar, criando um ciclo sustentável e educativo”, revela a pesquisadora.
Unindo respeito ao meio ambiente e inovação produtiva, iniciativas como essa podem transformar um recurso descartado em uma oportunidade para o desenvolvimento sustentável.