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CORRENTE DA VIDA

Doações de órgãos crescem em AL e aumentam a esperança de quem aguarda na fila por um transplante

Quatro órgãos são captados e transplantados atualmente no estado, em hospitais que são credenciados e habilitados pelo Ministério da Saúde

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Doação de órgãos salva vidas de quem precisa de transplante
Doação de órgãos salva vidas de quem precisa de transplante | Foto: Ascom Sesau

A doação de órgãos em Alagoas registrou um avanço expressivo em 2024, com um crescimento de 457% no número de doadores em comparação ao ano anterior, saindo de sete em 2023 para 39 no último ano, um salto significativo que reflete os esforços da Central de Transplantes e das equipes especializadas na captação e realização dos procedimentos. Com uma estrutura bem organizada e profissionais capacitados, o estado tem conseguido avançar na realização de transplantes de coração, rim, fígado e córnea, oferecendo uma nova chance de vida para pacientes que aguardam na fila de espera.

No ano de 2023, o estado realizou 96 transplantes, sendo 86 de córnea, três de rim, sete de fígado e nenhum de coração. Já em 2024, foram 171 procedimentos, sendo 141 de córnea, 14 de rim, 14 de fígado e dois de coração. Já neste ano de 2025, somente no mês de janeiro, foram duas captações autorizadas, com sete transplantes concretizados. Até o final de fevereiro, três captações tinham sido permitidas pelas famílias.

Os números são animadores e o crescimento da cultura da doação de órgãos não pode parar. Se de um lado tem uma fila virtual de pessoas aguardando por um transplante, do outro está uma família enlutada, lidando com a dor irreparável da perda de alguém querido e precisando decidir, em um curto espaço de tempo, sobre autorizar ou não a captação dos órgãos nesse doador.

Diante desse cenário, um fator torna-se crucial: saber o que a pessoa que acabou de morrer desejava em vida. Por isso, auto declarar-se doador para os parentes mais próximos é essencial para a efetivação do processo, afinal, somente a família tem o poder, garantido por lei, de autorizar ou negar o procedimento.

O tema da doação de órgãos ainda é cercado por tabus, já que muitas famílias evitam falar sobre a possibilidade de perder um ente querido. No entanto, a decisão de doar pode transformar a dor da perda em esperança para quem luta por uma chance de sobrevivência. Cada doador pode salvar ou melhorar a qualidade de vida de diversas pessoas, tornando este um gesto de solidariedade e empatia que ultrapassa a despedida e deixa um legado de amor.

A principal barreira encontrada hoje pelas equipes que trabalham com a captação de órgãos em Alagoas é, justamente, a autorização familiar. As negativas ainda são muitas e baseadas, basicamente, em três fatores: a alegação de que a pessoa não se declarou doador em vida; o desejo de manter o corpo do cadáver íntegro, baseado em uma questão cultural, e as crenças religiosas. Para se ter uma ideia do quantitativo de captações negadas pelos familiares, em todo o ano passado, foram 39 autorizações e 45 recusas.

Daniela Ramos fala sobre como funciona o processo de doação de órgãos em Alagoas
Daniela Ramos fala sobre como funciona o processo de doação de órgãos em Alagoas | Foto: Carla Cleto/ Ascom Sesau

A longa fila de espera

Atualmente, o estado conta com 539 pessoas na fila de espera por um órgão, sendo 523 precisando de córnea; quatro aguardando um fígado; dez carecendo de um rim e dois de um coração.

Esses são os quatro tipos de captação e transplante realizados em Alagoas. No ano passado, inclusive, o estado teve o primeiro hospital da rede pública credenciado pelo Ministério da Saúde a realizar o procedimento. Um grande avanço. Trata-se do Hospital do Coração Alagoano Professor Adib Jatene, onde são realizados os transplantes de rim, fígado e coração. Além dele, há ainda, habilitados para o procedimento, o Hospital Arthur Ramos (rim); a Santa Casa de Maceió (fígado), e o Hospital Universitário, o Instituto de Olhos de Maceió, o Instituto da Visão e o Hospital de Olhos Santa Luzia (córnea).

A coordenadora da Central de Transplantes de Alagoas, Daniela Ramos, destaca os avanços registrados no último ano em Alagoas, fruto de uma união de esforços. “Aumentamos a equipe e melhoramos a organização da procura de órgãos, que funciona 24 horas”, conta.

Ela explica como ocorre o processo de captação do órgão, até a consolidação dos transplantes. “Primeiro é preciso fechar o diagnóstico de morte encefálica e isso é feito de forma cuidadosa e responsável por meio de três etapas: duas de exames clínicos e uma de exame de imagem. Tudo para comprovar que a pessoa que morreu não tem mais nenhuma atividade elétrica ou fluxo sanguíneo. Fechado do diagnóstico, a equipe faz a entrevista familiar e, caso tenhamos o sim, iniciamos uma corrida contra o tempo, com a realização de vários exames de sorologia, teste de Covid e exames laboratoriais”, destaca Daniela, ressaltando que a família pode acompanhar de perto todo o processo de comprovação da morte encefálica, inclusive levando um médico de sua confiança.

Após todos os procedimentos necessários para garantir que os órgãos a serem retirados do doador estão saudáveis, é iniciada a etapa de envio de uma documentação robusta para o sistema nacional que gere a fila de pessoas à espera de órgãos. É esse sistema que vai apontar quem são e onde estão os pacientes que devem receber os órgãos captados. Definido isso, a equipe de transplante do hospital onde o paciente é atendido é contactada para saber da viabilidade de fazer o procedimento nele. E assim começa o processo de renovação da vida.

“A Central faz a retirada dos órgãos, indo até o hospital onde está o doador para fazer a captação, tudo no menor tempo possível. Paralelo a isso, fazemos o acompanhamento da família, dando todo o suporte e apoio desde o início do processo até a devolução do corpo, pois, para nós, a família sempre está em primeiro lugar”, completa Daniela.

Em nenhum momento, nem durante o processo e nem depois, familiares do doador e os receptores dos órgãos mantêm algum tipo de contato, e todas as informações são mantidas em sigilo pela Central de Transplantes, para evitar que isso aconteça.

Em Alagoas, são realizados transplantes de córnea, coração, rim e fígado
Em Alagoas, são realizados transplantes de córnea, coração, rim e fígado | Foto: Ascom Sesau

Salvando vidas em todo o Brasil

Mas nem todos os órgãos captados em Alagoas ficam no estado e nem todos os transplantes realizados no estado são provenientes de doadores alagoanos. Isso acontece por inúmeros motivos, como a ausência de compatibilidade e a incapacidade de a pessoa que está na fila de espera receber o órgão naquele momento específico. Dos 70 rins captados no estado no ano passado, por exemplo, somente 14 ficaram em Alagoas. Os demais foram ofertados a outras unidades da federação, para serem transplantados por lá. Nesses casos, o órgão é transportado pela Força Aérea Brasileira (FAB) ou por alguma companhia aérea que tenha uma parceria para esse fim.

Daniela Ramos fala sobre a importância de as pessoas que estão na fila não perderem a esperança. Ela ressalta que existe toda uma equipe trabalhando todos os dias, 24 horas, para que os órgãos cheguem a quem precisa. “Tem muita gente empenhada para que todos os critérios exigidos sejam cumpridos. Não percam a esperança, pois temos o propósito de salvar vidas. Trabalhamos com a vida, com a chance de as pessoas voltarem a viver”, destaca.

Ela lembra, ainda, que qualquer pessoa pode precisar de um órgão, pois essa necessidade surge a partir de doenças corriqueiras, que não são raras, como é o caso de hepatites e problemas cardíacos. Diante disso, é importante que todos se coloquem no lugar de quem espera por um órgão e declare, em vida, o desejo de ser doador.

“Para quem ainda não decidiu ser doador, pare um pouco e pense. As estatísticas mostram que de 0,5% a 1% de todos os óbitos registrados nos hospitais podem ser sugestivos para morte encefálica. Desse percentual, ainda existem as contraindicações e as recusas familiares. Ou seja, entrar na lista de quem precisa de um órgão é mais fácil do que ter um doador. Qualquer um de nós pode estar nessa lista no futuro”, reflete.

Adriana fala sobre a espera e a felicidade de receber um coração
Adriana fala sobre a espera e a felicidade de receber um coração | Foto: Arquivo pessoal

A dona de casa Adriana Pereira de Oliveira, de 50 anos, conhece bem a angústia da espera em uma fila para transplante e a alegria de receber a grande notícia de que surgiu um doador. Precisando de um coração, ela passou dez meses aguardando o órgão, após ser diagnosticada com doença de Chagas.

“Passei quase um ano na fila. Tinha doença de Chagas e vivia passando mal e desmaiando. Um dia fiz um cateterismo e acusou que eu precisava de um novo coração. O meu estava muito inchado e pressionando o pulmão, então, com muita frequência, eu ficava cansada e com muita tosse”, fala Adriana.

Ela lembra do dia em que recebeu a notícia de que tinha chegado a hora de receber o novo coração. Isso aconteceu quando Adriana se recuperava da colocação de um marca-passo, o que acabou gerando muito medo e incertezas. Mas encarou a cirurgia e, hoje, conta com alegria que deu tudo certo.

“A assistente social me ligou no dia que encontraram um coração para mim e perguntou se eu estava pronta para recebê-lo. Eu desmaiei e chorei muito depois, porque tinha medo e, ao mesmo tempo, estava feliz. Fui assim mesmo e hoje estou aqui, dezesseis anos depois, contando a história”, relata Adriana, que deixa um recado para quem aguarda em uma fila para transplantes.

“Tenha fé em Deus, tenha perseverança, tudo é no tempo dele e vai chegar a sua hora”, fala Adriana, que mora no Povoado Poxim, em Coruripe, no interior de Alagoas.

Portanto, se você ainda não se auto declarou doador de órgão, se ainda não conversou com ninguém da família sobre o assunto, manifestando o desejo de doar, importante que o faça o quanto antes, pois a única certeza que temos na vida, é justamente a morte. E não há gesto mais bonito do que ser solidário, mesmo não estando mais aqui.

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