ABANDONO
Antigo prédio do Detran está há mais de 10 anos entregue ao descaso e abandono
Prédio já foi estratégico para o ecossistema na região


Seis lagoas de um lado, restingas intactas do outro e a Praia da Avenida à frente. O antigo prédio do Departamento Estadual de Trânsito de Alagoas (Detran), situado em área rica em biodiversidade no sul de Maceió, que já foi estratégico para o ecossistema na região, definha há mais de uma década sob o abandono.
Localizado na Avenida Duque de Caxias, no Pontal da Barra, o imóvel pertence à Marinha do Brasil. Por 36 anos, abrigou inicialmente a escola de aprendiz de marinheiro, conhecida como Campus Tamandaré, órgãos de trânsito e da Polícia Civil sob posse do Governo do Estado. Em 2014, a retomada pela União marcou o início de seu declínio.
Desde 2003, a Marinha buscava a posse, concretizada em outubro de 2014. O acesso à praia, antes utilizado para lazer pelos moradores do sul de Maceió, restringiu-se ao uso militar autorizado.
Na época, a Capitania dos Portos anunciou a reativação da escola de aprendizes-marinheiros, visando aumentar o efetivo militar com a 5ª unidade do tipo no Brasil. O investimento inicial previsto era de R$ 25 milhões para pessoal, com planejamento a ser concluído em 2015.
"O benefício (...) é muito maior do que o fato de ir à lagoa e ter o seu direito de ir e vir restrito", afirmou o então capitão dos Portos, Antônio Braz.
Quinze fuzileiros navais chegaram a visitar o prédio, acompanhados por servidores do Detran. Contudo, nenhuma obra foi iniciada. Atualmente, apenas equipes do Batalhão de Operações Policiais Especiais (Bope) utilizam a área externa para treinamentos.
Embora da Marinha, o prédio pode ser usado pelo Estado ou Município com projetos apresentados à União. Questionado, o Governo Estadual apenas informou que a área pertence à União.

O município de Maceió, via Iplan, possui diretrizes para destinar o prédio à pesquisa ambiental. Maria Luísa de Carvalho Viégas Machado, diretora do Iplan, destaca o Plano de Gestão Integrada da Orla Marítima de Maceió (2023-2024), que sugere o local para pesquisas, apoiando projetos socioambientais existentes para preservar o Complexo Estuarino Lagunar Mundaú Manguaba (CELMM), bioinovação e desenvolvimento socioeconômico.
A edificação é uma Unidade Especial de Preservação Cultural (UEP), exigindo respeito à sua integridade física e arquitetônica. A sugestão de uso para pesquisa surgiu na etapa participativa do PGI, que apontou a ociosidade do imóvel como geradora de insegurança e poluição visual, enquanto sua estrutura e localização foram vistas como ideais para bioinovação e desenvolvimento social.
Maria Luísa ressalta que ainda é uma possibilidade futura, dependendo de articulação com o Comitê Gestor do PGI e diálogo com os órgãos responsáveis.
Para o arquiteto e urbanista Dilson Ferreira, o antigo Detran tem potencial estratégico para abrigar o Instituto do Meio Ambiente (IMA) e a estrutura estadual de licenciamento ambiental, integrando também o LABMAR da UFAL. A proposta se justifica pelo valor ambiental da área, com restinga original, lagoas e rica biodiversidade.
"A requalificação da área permitiria a criação de um parque ecológico urbano ou uma unidade de conservação ambiental", integrando o prédio reformado para pesquisa, fiscalização, extensão universitária e visitação pública, sugere Ferreira. Ele também vê potencial para sediar o CEPRAM e outros órgãos ambientais, como um Centro Ambiental Integrado para licenciamento, monitoramento, fiscalização, ciência, educação ambiental e contato com o ecossistema preservado.
"Maceió não apenas ganharia um equipamento público de excelência, mas também fortaleceria sua política ambiental", afirma Ferreira.

Os impactos do abandono incluem abrigo para animais e vetores de doenças, além de problemas estruturais e de segurança, com risco de desabamentos e ocupações vulneráveis. O abandono também representa um passivo imobiliário, atraindo usos inadequados e degradando o entorno, gerando insegurança e ameaça à saúde pública.
Ferreira critica a ideia de um empreendimento hoteleiro na área, no extremo da cidade, onde a Lagoa Mundaú encontra o mar. "Implantar um empreendimento imobiliário ali seria um desastre ambiental", colocando em risco a última faixa de restinga virgem da cidade, uma área de preservação ambiental.
Em nota, a Marinha informou que o imóvel foi restituído para seus "interesses estratégicos", sendo propriedade da União sob sua total responsabilidade. O espaço compõe área adequada para "Experimentos Doutrinários da Força, exercícios simulados de Operações Litorâneas de caráter naval, exercícios de ações de Garantia da Lei e da Ordem e exercícios de apoio ao Estado, no âmbito da Defesa Civil", contribuindo para o treinamento da tropa.