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NO SERTÃO

Kraunã: o mais novo povo indígena de Alagoas

Descendentes de povos do Sertão nordestino lutam pelo reconhecimento em área às margens do São Francisco cercada por vestígios arqueológicos e tradições ancestrais

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Povo Kraunã busca o reconhecimento oficial de sua identidade e de seus direitos territoriais
Povo Kraunã busca o reconhecimento oficial de sua identidade e de seus direitos territoriais | Foto: Divulgação

No Sertão de Alagoas, uma nova comunidade indígena ressurge com força e determinação para sair do anonimato histórico. O povo Kraunã, formado por mais de 150 indígenas de 35 famílias, ocupa uma área às margens do rio São Francisco, no município de Olho D’Água do Casado. Há mais de três décadas, eles vivem em um assentamento do Incra. São descendentes de povos como os Pankararu e Funiô, de Pernambuco; Xocó, de Sergipe; Tuxá, da Bahia; entre outros do semiárido nordestino. Agora, eles buscam o reconhecimento oficial de sua identidade e de seus direitos territoriais junto ao governo federal.

O cacique Agamenon Kraunã relata a trajetória do grupo, que no passado ocupava vastas terras entre Alagoas, Pernambuco, Sergipe e a região do Raso da Catarina, na Bahia. “Com o processo de colonização e a chegada das fazendas, nossas terras foram invadidas. Aqueles que não aceitaram se submeter, migraram para o Sertão em busca de espaços onde pudessem preservar nossos rituais”, afirma.

Atualmente, os indígenas vivem em uma região rica em vestígios de sua ancestralidade, com pinturas rupestres, objetos e cemitérios indígenas que guardam a memória de seus antepassados. A oralidade é um dos pilares da cultura Kraunã, como ressalta o pajé Renato Kraunã. “Mantemos nossos rituais por meio da tradição oral, celebrando nascimentos, casamentos e cerimônias funerárias. Utilizamos o Campiô, um cachimbo sagrado, em nossos rituais”, explica.

A luta pelo reconhecimento oficial conta com o apoio da coordenação regional da Funai, que já reconhece a existência da comunidade e iniciou o processo de investigação da ancestralidade do povo.

O professor Cícero Pereira é o coordenador regional Nordeste 1 da fundação - responsável pelos estados de Alagoas, Pernambuco e Sergipe. Ele reforça a importância do caso. “No Estado, são reconhecidos 12 povos indígenas, totalizando 25.725 indivíduos, segundo o IBGE. O povo Kraunã é um dos casos mais emblemáticos. Eles buscam a regularização da identidade e a ampliação da área territorial”, afirma. Segundo ele, outras comunidades no Sertão também estão em processo de reconhecimento, mas a singularidade do território Kraunã - marcado por forte simbologia e registros arqueológicos - torna o caso prioritário.

A demanda, porém, é complexa. A Funai lida atualmente com mais de 500 pedidos de reconhecimento em todo o País e enfrenta limitações técnicas. “No Nordeste, são cerca de 150 processos, e o dos Kraunãs está em estágio avançado”, destaca Cícero.

A documentação já foi enviada à direção nacional da Funai, e uma equipe de antropólogos deve realizar o levantamento territorial.

O antropólogo Jorge Vieira, coordenador do Núcleo Acadêmico Afro-Indígena de Direitos Humanos do Cesmac, confirma a origem do grupo nos povos do Sertão alagoano, ligados aos Pankararu de Pernambuco. “São a mais nova comunidade indígena em processo de reconhecimento, em uma área marcada por elementos inconfundíveis de sua ancestralidade”, afirma. Para ele, a luta é também por território e dignidade.

A Procuradoria da República acompanha o caso. O Ministério Público Federal (MPF) designou o antropólogo Ivan Soares para o levantamento técnico e territorial da comunidade.

Entre os dias 7 e 10 de abril, líderes Kraunã estiveram em Brasília. Na Funai, eles acompanharam de perto o andamento do processo de reconhecimento e buscaram apoio de autoridades e parlamentares.

PESQUISAS

Estudos arqueológicos já confirmam a presença indígena na área ocupada atualmente. O primeiro deles foi conduzido pelo antropólogo Rogério Rodrigo dos Santos, da Universidade Federal de Alagoas (Ufal). Em artigo publicado na edição da Revista Campus, em 9 de junho do ano passado, ele destacou que “as prospecções arqueológicas realizadas até agora atestam a presença de povos indígenas na região e confirmam a ancestralidade Kraunã”.

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