IBGE
Retrato da fé: católicos caem 7% e evangélicos crescem 52% em Alagoas
Dados do Censo 2022 mostram que o maior avanço foi das religiões de matriz africana, com 391% de alta

A profissão de fé dos alagoanos têm mudado ao longo do tempo. Nos últimos 13 anos, entre 2010 e 2022, o número de católicos reduziu 7,6%, o de evangélicos aumentou 52%, espíritas cresceram 11,6% e as religiões de matriz africana dispararam 391%. O grupo dos “sem religião” também cresceu em Alagoas, uma alta de 2,9%. Os dados fazem parte do Censo 2022 e foram divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) nessa sexta-feira (6).
Em relação à população total do estado, os católicos são maioria, com 1.708.615 fieis, o que representa 64,16% de todos os alagoanos. Evangélicos são 609.355 (22,88%), espíritas são 17.288 (0,65%), e candomblecistas e umbandistas somam 10.597 (0,4%). Os sem religião são 247.848 (9,31%).
Os municípios alagoanos com maior percentual de católicos são: Monteirópolis (95,61%), Senador Rui Palmeira (93,77%) e Mar Vermelho (92,7%). Os com menos católicos são: Roteiro (28,44%), Maragogi (33,17%) e Matriz de Camaragibe (36,86%). No caso dos evangélicos, os maiores percentuais estão em Maragogi (42,78%), Porto Calvo (42,22%) e Campestre (41,21%). Os menores percentuais estão em Monteirópolis (2,87%), Pariconha (4,97%) e Senador Rui Palmeira (5,15%).

O presidente da Assembleia de Deus no estado de Alagoas, reverendo José Orisvaldo Nunes de Lima, recorre à bíblia para explicar os números e cita a passagem de 1º Coríntios 3:6, que diz: “Deus deu o crescimento”. “A igreja alagoana é operosa, os ministros, apesar dos poucos recursos do nosso estado, são verdadeiros heróis, tanto no evangelismo quanto na construção de templos. Entretanto, se Deus não põe sua benção, os resultados seriam pífios”, enfatiza.
Sobre o crescimento de ministérios independentes entre os evangélicos, Orisvaldo Nunes cita uma passagem do Novo Testamento onde é dito: “Mas que importa? O importante é que, de qualquer forma, seja por motivos falsos, seja por motivos verdadeiros, Cristo está sendo pregado, e por isso me alegro”. Ele afirma que o seu pensamento é o mesmo do apóstolo João. “Quando Cristo voltar, vai julgar-nos e dará a cada um de acordo com as intenções do seu coração”.
O presidente pontua que a Assembleia de Deus original é pertencente ao pentecostalismo clássico, cuja mensagem principal é a salvação da alma e a transformação da vida efetuada pela obra redentora de Cristo na cruz do Calvário. “Todavia, nos últimos 40 anos, surgiram muitos grupos cheios de bizarrices e engodos, se passando por pentecostais; com os tais, não temos comunhão. Inclusive, algumas, infelizmente, trazem, indevidamente, o nome de Assembleia de Deus”, diz.
Ainda em relação ao crescimento do número de evangélicos, o reverendo aponta uma mudança no perfil desses fieis. A Assembleia de Deus, por exemplo, sempre trabalhou com as massas, que constituem sua maioria. “Entretanto, por graça de Deus, temos chegado a bairros de nível mais elevado, e ali estabelecido casas de oração. Nossos jovens têm transmitido o evangelho nas faculdades, e hoje, já há muita gente de nível elevado em nossas igrejas. Entre nós pentecostais clássicos, há um grupo de homens de negócios chamado ADONEP, cujo carisma é pregar o evangelho para as camadas sociais mais elevadas da sociedade”.

O padre Rodrigo Rios, diretor de comunicação da Arquidiocese de Maceió, diz que a Igreja Católica reconhece a diminuição no número de fieis e aponta mudanças culturais e secularização como algumas das causas. “A sociedade contemporânea vive um processo de secularização, com menor influência religiosa no cotidiano. Podemos ver isso na retirada de símbolos religiosos em locais públicos e até vandalização dos mesmos, como aconteceu, infelizmente, várias vezes em nossa capital nos últimos anos”, explica.
Outro ponto citado por Rios é o crescimento de outras denominações. “O avanço de igrejas protestantes (evangélicas), especialmente as pentecostais e neopentecostais, atrai fieis com propostas mais flexíveis ou imediatistas. Vivemos em um país com desigualdades sociais, então um discurso que prometa prosperidade chama mais atenção”.
Além disso, ele aponta a falta de engajamento dos batizados e uma crise de valores e individualismo. “Muitos que se declaram católicos não têm uma vivência ativa da fé, seja por falta de formação doutrinal, seja por distanciamento da comunidade eclesial. Então, acabam deixando o catolicismo por conta de serem superficiais. A cultura atual valoriza mais o subjetivismo espiritual do que a pertença institucional, levando muitas pessoas a se identificarem como aqueles que acreditam em Deus, mas não em religião”, pontua.
O padre conta que a Igreja Católica tem adotado estratégias pastorais para reevangelizar e fortalecer a fé de seus fieis, como investimentos em catequese criativa, missões populares e uso de redes sociais. Ele fala ainda em acolhimento e formação e diz que as paróquias estão buscando ser mais acolhedoras, com grupos de oração, círculos bíblicos e acompanhamento pessoal.
A juventude também está no foco na Igreja Católica, de acordo com Rios, movimentos como a JMJ (Jornada Mundial da Juventude), que aconteceu no Brasil em 2013, e iniciativas como Encontro de Jovens com Cristo (EJC), Segue-me e retiros específicos para jovens buscam dialogar com as novas gerações.
Além disso, o padre destaca o compromisso social da igreja, que, de acordo com ele, reforça sua presença em ações de caridade, defesa dos marginalizados e diálogo com as realidades urbanas, mostrando que a fé se traduz em gestos concretos. “Exemplo disso em Maceió é a Pastoral Carcerária, que atende os reclusos no Sistema Prisional”, conta.
“Apesar dos desafios, a Igreja Católica continua sendo a maior denominação religiosa do Brasil e está empenhada em renovar sua missão, sempre à luz do Evangelho e do Concílio Vaticano II”, finaliza Rios.

O babalorixá Pai Célio, que é Célio Rodrigues, avalia que o aumento tão expressivo no número de adeptos a religiões de matriz africana é uma vitória contra o medo. “Antes as pessoas tinham medo. Tinham medo no trabalho, entre os amigos, com a vizinhança”. Como exemplo desse cenário, ele cita o fato de que os terreiros eram feitos, a maioria, no fundo das casas, escondidos. “As pessoas estão se empoderando da sua religiosidade. Andam de branco, botam a sua conta”, declara.
Pai Célio é escrivão de polícia aposentado e filho de uma evangélica com um homem de axé. A herança religiosa é mais antiga, vem da avó paterna. Ele relata que herdou o terreiro aos 16 anos, hoje tem 63 anos. Ele diz se orgulhar do terreiro com mais de 13 hectares e que conta com sala de leitura e de informática, além de ser oficialmente um museu. Célio fala ainda que o local está cheio de árvores sagradas.
“Sou de Iemanjá, sou um homem de Iemanjá, muito bem realizado com tudo na minha vida. Paralelo a isso, eu fiz a minha vida, né? Sou escrivão de polícia aposentado, sou professor de história, sou pesquisador, historiador, e tenho pós-graduação em história da cultura afro-brasileira”, detalha. O babalorixá diz que não imaginava chegar onde chegou.
Sobre os novos adeptos à religião, ele traça um perfil. “Hoje, o nosso povo de terreiro é formado por jovens, que estão na faculdade, fazendo mestrado, doutorado, concurseiros. Eles são o futuro do terreiro, porque sem o jovem, nós não vamos ter anciãos do terreiro. E nós sabemos que toda prática do terreiro é ensinada pelos mais velhos. Então, os jovens de hoje vão ser os mais velhos de amanhã”.