IMPACTO NO TURISMO
Entre a calçada e a caldeira: restaurantes de Maceió enfrentam dilemas diante do aumento da população em situação de rua
Clientes, donos de bares e funcionários relatam abordagens frequentes — muitas vezes pacíficas, mas outras marcadas por insistência ou comportamentos imprevisíveis

A presença cada vez maior de pessoas em situação de rua nas imediações de bares e restaurantes de Maceió tem gerado preocupação entre empresários e clientes. O cenário, que reflete questões sociais, como o aumento da desigualdade, a falta de moradia e a dependência química, tem se tornado uma preocupação constante para quem vive do turismo, da gastronomia e da convivência urbana.
Clientes, donos de bares e funcionários relatam abordagens frequentes — muitas vezes pacíficas, mas outras marcadas por insistência ou comportamentos imprevisíveis. A sensação de insegurança tem afastado parte da clientela, afetando o movimento em regiões turísticas como a orla da Ponta Verde, o Centro e bairros residenciais como o Farol. Supermercados também relatam a mesma realidade nas suas entradas, especialmente no período da noite, quando o fluxo de pessoas em situação de rua tende a aumentar.
Para Marcus Batalha, presidente da Associação Brasileira de Bares e Restaurantes em Alagoas (Abrasel-AL), o cenário exige atenção e ação coordenada. “O número cada vez maior de pedintes nas imediações dos estabelecimentos e, em alguns casos, dentro dos próprios restaurantes, vem gerando muita insegurança entre os clientes”, afirma.
Segundo ele, empresários têm relatado uma sensação de vulnerabilidade que se reflete diretamente no movimento dos negócios. “Esse sentimento gera um efeito em cascata, afastando os clientes desses estabelecimentos”, explica. A entidade tem buscado diálogo com autoridades municipais e estaduais. “Esperamos ações de acolhimento para aqueles que estão aptos para tal e de segurança pública para os transgressores”, pontua.
No bairro do Farol, o empresário Renato Farias, dono de um bar da região, diz que a situação se agravou nos últimos meses. “A gente entende que ninguém está na rua porque quer, mas a situação está complicada. Tem gente dormindo na calçada, usando drogas na frente dos bares, abordando os clientes com insistência”, desabafa. Segundo ele, além de prejuízos financeiros, o problema afeta a imagem da cidade. “Maceió vive do turismo, e essa realidade impacta quem vem de fora.”
A cliente Daniela Lima, fisioterapeuta que costuma frequentar bares na orla, também compartilha seu desconforto. “Já fui abordada por uma pessoa em situação de rua dentro de um restaurante. É uma situação triste e delicada, mas o poder público precisa agir com mais firmeza e humanidade.”
Em resposta à situação, o Governo de Alagoas lançou a maior ação integrada de acolhimento já realizada no estado. Sob liderança do governador Paulo Dantas, a operação reúne políticas públicas nas áreas de assistência social, saúde, habitação e segurança. A oferta de vagas nos abrigos estaduais será triplicada, saltando de 160 para 480, o que eleva a capacidade total do sistema para 600 vagas.
Além do acolhimento, o plano inclui a concessão de aluguel social no valor de R$ 800 a pessoas cadastradas pelas equipes técnicas e a ampliação da entrega de moradias definitivas. Na área de segurança, ações integradas resultaram em 102 abordagens policiais, 13 atendimentos psicossociais e 19 prisões — sendo 9 em flagrante e 10 por mandado judicial.
A secretária de Estado da Assistência e Desenvolvimento Social, Kátia Born, enfatiza que o cuidado vai além do abrigo físico. “Acolher também é cuidar da saúde mental e dar condições reais de reconstrução de vida”, afirma. Segundo ela, uma frente específica foi criada para atender pessoas com transtornos mentais e dependência química, com suporte da rede psicossocial estadual.
Na Praça Sinimbu, no Centro, 28 famílias já foram encaminhadas para acolhimento institucional, com apoio da Prefeitura. O setor empresarial apoia as medidas. “A ação do Governo de Alagoas é fundamental não apenas para garantir segurança aos maceioenses e visitantes, mas também para criar um ambiente mais favorável à economia, especialmente aos bares, restaurantes e ao turismo”, reforça Marcus Batalha.
A Prefeitura de Maceió, por meio da Secretaria Municipal de Desenvolvimento Social (Semdes), afirma manter equipes da Abordagem Social atuando diariamente com busca ativa em todas as regiões da capital, oferecendo atendimento imediato e encaminhamento ao acolhimento. De acordo com a pasta, há abrigos disponíveis na parte alta e baixa da cidade, além de três Centros Pop nos bairros do Jaraguá, Prado e Benedito Bentes. Contudo, muitos dos abordados acabam rejeitando o acolhimento.
Apesar dos esforços, o presidente da Abrasel reconhece que a solução passa por ações continuadas e parcerias. “Cada caso é tratado de forma individualizada, já que os perfis desses moradores são distintos. O setor sempre esteve de portas abertas para trabalhar junto ao poder público na qualificação e capacitação dessas pessoas e sua possível inserção ao mercado de trabalho”, conclui.