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MOSAICO DA FÉ

O mural de milagres do Santuário Virgem dos Pobres

Centenas de placas de automóveis, homenagens e ex-votos ilustram tradição que atravessa décadas em Alagoas; fiéis buscam local para externar gratidão pelas graças alcançadas

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Santuário dispõe de um verdadeiro mosaico de milagres.
Santuário dispõe de um verdadeiro mosaico de milagres. | Foto: Ailton Cruz

Em 21 de janeiro de 1988, Cristina Silva de Lima, então com 4 anos de idade, viajava com os pais, os avós maternos e a irmã gêmea de Maceió para Juazeiro do Norte, no Ceará. Foi na cidade de Jati, já em território cearense, que um acidente de carro mudou completamente os rumos da família. Cristina perdeu o pai, a avó materna e a irmã. Mesmo diante das perdas imensuráveis, José de Oliveira, o avô de Cristina que sobreviveu ao acidente, não perdeu sua fé em Nossa Senhora. Pelo contrário. Aprofundou sua devoção à Virgem dos Pobres.

Em vez de questionar por que tamanha tragédia atingiu sua família, a fé foi eternizada com uma placa de agradecimento pelas vidas salvas, fixada no Santuário Virgem dos Pobres, na Mangabeiras, em Maceió.

Assim como José de Oliveira, centenas de fiéis encontram no Santuário um local para depositar gratidões por livramentos ou graças alcançadas, bem como intenções e súplicas à Nossa Senhora. Lá, é considerado um espaço sagrado onde milagres acontecem.

Quem sobe a ladeira íngreme que dá acesso ao Santuário e, em seguida, as escadarias que o edificam, já se depara com centenas de placas espalhadas por um paredão rochoso.


Frases como “Agradeço à Virgem dos Pobres pela graça alcançada”; “Pela vida de Lourdes”; “Pelo sucesso da cirurgia de Lucas”; “Pela aposentadoria conquistada”; “Pela gravidez e parto de Waldjane” compõem o mosaico de fé.

Há placas automotivas, peças em mármore, modelos em acrílico. Banners e fotografias também integram as homenagens. Algumas placas, datadas de 1991, resistem ao tempo. Outras, de 2025, mostram que a tradição permanece viva.

“Termos sobrevivido foi um milagre”, aponta Cristina, hoje com 42 anos. Ela conta que, toda primeira quarta-feira do mês, o avô ia ao Santuário em sinal de devoção.

“Em determinados dias, meus tios buscavam meu avô, e a gente ia com ele. Eu me lembro de ficar

procurando onde haviam coloca do a placa da gente”, relata. Para ela, o gesto do avô é uma demonstração de afeto e gratidão. “Não tenho dúvidas de que Nossa Senhora sempre intercede por seus filhos. Um gesto de agradecimento é o mínimo. Meu avô ia ao Santuário mesmo quando precisou usar cadeira de rodas, depois de amputar uma perna. Ele sempre teve esse carinho e gratidão”.

ASSIM NASCE UMA TRADIÇÃO

“A placa significa: ‘EU sou grato eternamente’. Ela é colocada para que não se apague a memória de

uma graça alcançada. É para ficar na memória”, resume o cônego Claudinier José, pároco do Santuário Virgem dos Pobres, ao explicar o simbolismo da prática.


Na década de 1960, o Santuário era um sítio pertencente à Santa Casa de Misericórdia, administrado por religiosas de uma congregação belga que o utilizavam como local de descanso.


Foi pelas mãos dessas irmãs que a devoção à Virgem dos Pobres chegou a Maceió. Na Bélgica, país de origem das religiosas, foram registrados os relatos do aparecimento de Maria sob esse título.

A imagem que hoje está no Santuário foi trazida da Bélgica nos anos 1970. “O povo queria ver a imagem e queria uma missa. O monsenhor da época iniciou, na primeira quarta-feira de cada mês, essa missa em honra à Virgem dos Pobres”, relata o pároco.

A tradição às quartas-feiras permanece com celebrações eucarísticas desde as 6h30 até as 19h, sendo o dia de maior movimento de fiéis no Santuário.

“A missa era embaixo de uma mangueira. E assim vai se criando a estrutura da igreja. O primeiro nome era Colina Sagrada da Mangueira, mas o que ficou na boca do povo foi Santuário Virgem dos Pobres.”

Embora o local já fosse reconhecido popularmente como Santuário desde a chegada da imagem, a oficialização só ocorreu em 6 de novembro de 2024. Hoje, o espaço é também um dos pontos de peregrinação do Jubileu 2025.

Já a tradição das placas começou nos anos 1980. “As primeiras eram artesanais, colocadas no canto. Como não existia a parede que temos hoje, muitas se perderam. Até que surgiu a ideia de construir a barreira para fixar as placas ali”, conta o pároco.

DEVOÇÃO MARCADA PELA FÉ

A moradora de Paripueira Luciene Albuquerque é uma das fiéis devotas da Virgem dos Po

bres. Foi a ela que atribuiu o sucesso da cirurgia do irmão, de 62 anos.

No início de janeiro, ele foi diagnosticado com um tumor no cérebro. Passou pelo Hospital Geral do Estado e depois foi transferido para uma unidade no interior. Luciene diz ter enfrentado uma via crucis para conseguir viabilizar a cirurgia.

Em uma das tentativas, o irmão chegou a entrar na sala de cirurgia, sem sucesso. No meio do processo, perdeu a mãe, em 21 de maio, tornando tudo ainda mais difícil.

“Em 31 de maio, fui à missa no Santuário. Era o novenário da Virgem dos Pobres. Pedi com fé que

ela intercedesse pela cirurgia do meu irmão. Chorei naquele momento. Senti a presença de Nossa Senhora”, diz Luciene.

Em 21 de junho, recebeu a boa notícia: o irmão foi transferido para outro hospital em Maceió, com cirurgia marcada para o dia 23. “Foi um sucesso. Meu irmão não ficou com nenhuma sequela”.

Para agradecer, levou duas fotos do irmão, antes e depois da cirurgia, e as colocou no paredão de homenagens. Ela promete voltar ao Santuário a cada 15 dias.

“Maria, Virgem dos Pobres, representa tudo para mim, especialmente por esse milagre. Foi uma fase muito difícil: minha mãe e meu irmão internados ao mesmo tempo. O Santuário foi um lugar de conforto e oração. Quando a tempestade passou, ficou o luto, mas também a gratidão.”

Padre Claudinier explica que o título Virgem dos Pobres não se refere apenas à pobreza material, mas às carências que habitam a alma humana.

“Posso ter dinheiro, mas ser pobre de paz em casa, de saúde, ver meus filhos nos vícios, em sofrimento. Virgem dos Pobres abrange tudo. Por isso, muitas pessoas vêm aqui chorando e angustiadas”, conclui.

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