Cidades
Fam�lia se diz dona do Bebedouro

De pequeno povoado no fim século 13, onde se banhavam viajantes e seus animais na confluência de riachos, a reduto de grandes casarões habitados por importantes figuras políticas, econômicas e intelectuais no século 20. E de reduto de grandes casarões a lugar ocupado por camadas pobres da população alagoana, no século atual. Bebedouro é um bairro ?que tem história?, como afirma o professor João Ribeiro Lemos em seu livro ?Bebedouro: Comunidade de História e de Fé?. E o bairro cresceu tanto que, em 2000, a lei municipal 4.952 definiu que eram novos bairros os sítios conhecidos como Chã da Jaqueira e Chã de Bebedouro, hoje mais populosos que o bairro que lhes deu origem, com cerca de 16 mil e 11 mil habitantes, segundo dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística de 2007. Bebedouro hoje possui pouco mais de 10 mil habitantes. ### César diz ter documentos registrados em nome do pai Nas escrituras de 1970, guardadas por Roberto César Moreira dos Santos, estão resumidos assim os bens dos quais ele é um dos herdeiros: terras localizadas ?a partir da Lagoa Norte [hoje Lagoa Mundaú] e fundos da Companhia de Água de Maceió, na Gruta da Jaqueira?. Os detalhes, terreno por terreno, casa por casa, seguem nas dezenas de páginas dos documentos registrados em nome do pai Natalício dos Santos ? cuja parcela foi dividida com a esposa Irene Moreira dos Santos, morta em 1998 ? e da avó Laura Lins. ?Eu lembro que eu era adolescente e o pessoal fazia fila aqui para pagar os aluguéis e os foros. Isso começou a parar lá pelos anos de 1980, quando ocorreu uma morte na família por causa da disputa de terras?, conta Roberto. Morador da Chã de Bebedouro desde 1957, o vendedor de pães Felipe dos Santos, hoje com 72 anos, lembra que, antes de comprar o terreno onde morava, fez diversos pagamentos à família Moreira. ### ?Dona? da comunidade está viva ?Ô Iaiá, vem ver! Ô Iaiá vem cá! Venha ver como é bonito uma pessoa no arraiá?. Dona Laura da Rocha Lins é hoje uma senhora centenária, debilitada pela idade e que passa a maior parte do tempo sentada na cadeira de balanço, grudada em sua bengala de madeira. Como se os pensamentos vagassem no espaço e no tempo, não responde a quase pergunta nenhuma e a algumas outras poucas diz não lembrar do que se trata. So cuidados da ex-nora, que foi casada com o neto Pedro Paulo dos Santos, ainda lembra de cantigas entoadas no passado. ?Canta, dona Laura!?, pede a cuidadora. ?Eu amei, estou amando uma casa de besouro, tô amando um moreninho por deboche e desaforo. Meu amor brigou comigo, me chamou ?malamanhada?, eu também chamei a ele ?cara de bode mijada??, canta Dona Laura, antes de soltar uma gargalhada de apenas um dente. ### Sujeira em riacho preocupa herdeiros No caminho por onde ele passa hoje, há um rastro de sujeira e destruição. Algo bem diferente das lembranças que os herdeiros da família Moreira têm da infância, quando ele corria ?limpinho? entre as terras de Bebedouro. O Riacho do Silva virou sinônimo de problema, em parte por culpa da população, que parece não enxergar os problemas causados pela enxurrada de lixo em suas águas. Por outro lado, a Prefeitura de Maceió por algum tempo parece ter esquecido da limpeza no seu curso. Quem viveu em épocas mais remotas sabe a importância do riacho para a comunidade local, que acabou fixando dezenas de residências às suas margens. Ou basta ler o resultado das pesquisas feitas pelo professor João Ribeiro Lemos, publicado no livro ?Bebedouro?, no qual conta sobre a construção do primeiro serviço de água canalizada no bairro, ?utilizando-se das nascentes do Riacho Luis da Silva, localizado no antigo Petrópolis, hoje Juvenópolis, onde se encontra o Parque Municipal de Maceió?. ### Construções desordenadas são comuns Outro problema que, segundo moradores locais, atrapalha o fluxo das águas do Riacho do Silva é a construção desordenada de casas às suas margens. A merendeira Maria Alves, 44, mora há 13 anos na Rua Marquês de Abrantes, a algumas dezenas de metros do curso do riacho e critica o aterro e a venda de lotes que está sendo feita em frente à sua casa, do outro lado da rua. São terrenos de 126 metros quadrados cada um, que, de acordo com o que ?ouviu dizer?, estariam a maioria já vendidos. ?Eu soube que tem só uns dois ou três ainda pra vender. Mas quem compra isso não sabe o que a gente passa aqui no inverno com as chuvas?, repreende a merendeira. A amiga Mércia da Silva, 36, diz que até já vendeu uma casa na região para morar com a mãe, na Chã da Jaqueira. ?Entrava água todo ano, rachava tudo, móveis e paredes. Até que uma vez eu perdi tudo, só sobrou a geladeira e eu vendi o terreno?, conta . ///