Brasília, DF – O secretário especial da Receita Federal, José Barroso Tostes Neto, pediu nesta quarta-feira (18) cautela com as mudanças no projeto que altera o Imposto de Renda. Para ele, há risco de isenções previstas nas discussões incentivarem a pejotização. “É preciso ter muita cautela com tratamentos diferenciados, especialmente com isenção, agora que estamos reintroduzindo a tributação dos dividendos. Para não manter essas vantagens que existem hoje e que levam à ampliação dessa estratégia de pejotização”, afirmou Tostes. Ele deu as declarações em evento virtual promovido pelo banco Santander. A pejotização ocorre quando pessoas físicas criam empresas e firmam contratos com outras para mascarar um vínculo empregatício, fazendo ambos os lados pagarem menos impostos. “Não há como argumentar e defender uma única pessoa que presta serviço ser equiparada a uma sociedade empresarial normal, que emprega diversos trabalhadores e exercem atividade de forma mais complexa”, afirmou. Na visão de Tostes, o projeto de lei enviado pelo governo afetava essa estratégia ao prever uma taxação de 20% dos dividendos (parte do lucro distribuído ao acionista). A legislação isenta o instrumento desde 1995. O texto do governo previa apenas uma isenção para R$ 20 mil em dividendos recebidos pela pessoa física ao mês, mas desde que o montante fosse pago por micro ou pequena empresa. Após reclamações do empresariado, o relator do projeto, deputado Celso Sabino (PSDB-PA), ampliou as isenções. O mais recente substitutivo oficial do relator isenta totalmente dividendos de empresas do Simples, além de micro e pequenas empresas optantes do lucro presumido (regime simplificado). Além disso, expande a isenção em outros casos -como para empresas que distribuem dividendos dentro do grupo econômico, além de flexibilizações para fundos de investimento. Tostes afirmou que Sabino prevê algumas travas no texto, mas mostrou preocupação com o tamanho que essas isenções podem alcançar. “Se essas isenções forem muito ampliadas, há risco de estímulo à pejotização”, disse. Tostes ainda disse que interesses políticos podem acabar se sobrepondo. “Sabemos que nem sempre o melhor do ponto de vista técnico é o melhor do ponto de vista político, e isso certamente está sendo considerado nas discussões feitas em torno do projeto de lei”, afirmou Tostes. O projeto de lei tem sido alvo de críticas desde que foi apresentado pelo Ministério da Economia. Primeiro, porque empresários reclamaram do aumento da carga tributária devido à tributação de dividendos. Depois, cortes feitos no IRPJ (Imposto de Renda sobre a Pessoa Jurídica) para agradar a iniciativa privada fizeram estados e municípios verem perda de arrecadação. O Imposto de Renda é administrado pela Receita Federal, mas partilhado com os entes subnacionais. Diferentes versões do projeto foram produzidas a partir das mudanças. Mais alterações estão previstas por emendas parlamentares. O presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), já tentou por três vezes votar o projeto do Imposto de Renda em plenário.
Em busca de apoio dos municípios, chegou a ser feito em reuniões com Congresso e representantes do Ministério da Economia um acordo para maiores repasses da União aos prefeitos e redução de reajustes para professores. Mas, em meio às reclamações e dúvidas sobre a perda de arrecadação pública, até mesmo a liderança do governo preferiu adiar a análise para a semana que vem. Diante do tempo e da energia usada para aprovar um projeto sob crítica também de diferentes analistas, Tostes responsabilizou o Congresso por haver a discussão neste momento. Para o secretário da Receita, o debate deveria ter começado pelo projeto que muda a tributação sobre o consumo -que está estacionado na Câmara há mais de um ano. “Não temos dúvida de que a reforma deveria de fato se iniciar pela tributação do consumo. Sempre defendemos isso”, disse Tostes. “Ocorre que esse projeto de lei, e aí por uma posição exclusiva do Parlamento e que absolutamente não teve nossa concordância, ficou parado sem nenhuma tramitação”, afirmou. Tostes lembra que a comissão especial da reforma tributária –extinta em maio– deu prioridade a duas PECs (proposta de emenda à Constituição) que previam fusões mais amplas de tributos. Com isso, o projeto do governo que fundia apenas PIS e Cofins na CBS (Contribuição sobre Bens e Serviços) ficou em segundo plano.