O jogo de palavras adotado pelo governo Renan Filho (MDB), no apagar das luzes de sua gestão, construiu uma narrativa que passa a ideia para o leitor menos atento de que o reajuste salarial anunciado para categorias do serviço público representa aumento de renda. Na verdade isso ocorreria se ocorresse reposição salarial – em geral resultado da soma da inflação com percentual de ganho real. Não é o caso. Embolada com outras pautas históricas da maioria das categorias como Plano de Cargos e Carreiras (PCCs), a proposta do governo é defasada desde sua nascença. Tudo isso por uma questão simples. Nos últimos cinco anos ele não reconheceu o direito legal de repor perdas inflacionárias. Conforme o Índice de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA), que é o parâmetro oficial para medir a inflação no país, o percentual de perdas foi de 25,9%. É isso que deixou de ir para a conta dos servidores públicos, em especial nos momentos em que Renan, nem seus técnicos recebiam nenhuma categoria. O dano, porém, é ainda maior, pois somando-se perda sobre perda o percentual ultrapassa os 30%. Esse número, porém, é ainda mais impactante se lembrarmos que a inflação do período de 2021 – que deveria ser resposta esse ano – ultrapassou os dígitos ficando acumulada em 10,06%. Ou seja, os 15% de percentual geral anunciado pelo governo, na prática, supostamente deixaria 4,64% de ganho real. Porém, que não cobre as perdas dos anos anteriores. Mas os números são cruéis para os servidores. Basta ver que há dois anos, o governo anunciou que daria 4,6% que nunca foram acrescidos a folha. Ou seja, o percentual anunciado de forma geral, na verdade recupera o que foi prometido mas nunca cumprido. O diretor do Sindicato dos Trabalhadores da Educação em Alagoas (Sinteal), Lucas Soares, confirmou à Gazeta que este ano a categoria terá “zero de ganho real”. “Esse ano mesmo não teremos ganho real, apenas a recomposição inflacionária. Durante os outros do governo Renan nós amargamos perdas muito grandes. A falta de ganho real acaba desgastando a categoria, fazendo com que ela adoeça mais, tenha mais dificuldade financeira, problema de organização social, o que faz com que muita gente se afaste e abandone a carreira. É sim real que a falta de um salário digno e falta de qualidade de vida para os trabalhadores e trabalhadoras da educação”, confirmou Lucas.
PREVIDÊNCIA
Ao mesmo tempo em que ignorou a situação dos servidores, em relação ao índice inflacionário, o governo aplicou o aumento da alíquota previdenciária para 14%, em 2020. Deste modo, quem já vinha com perda de renda, incluindo os aposentados, sofreu outro baque com a mudança. Nem os servidores que estavam dentro do teto salarial da Previdência, antes isentos, escaparam do corte em seus vencimentos. Depois de muita pressão e desgaste político, o governo anunciou uma revisão na linha de corte. Para atender a exigência da lei, pós-reforma da previdência, o governo impôs um duro golpe nos servidores que vinha acumulando perdas, em plena pandemia, no momento em que a economia ficou estagnada, com alta do desemprego e os preços avançando.
REPERCUSSÃO
Mesmo quando alardeou o envio de projetos para atender demandas que duraram todo o seu governo, sem solução, o governo evitou o debate. De acordo com a presidente da CUT, Rilda Alves, o regime de urgência atrapalhou a construção de um texto com tranquilidade e levando em conta a real necessidade dos servidores. Quando o conjunto de matérias chegou ao legislativo estadual Rilda e outras lideranças fizeram uma verdadeira peregrinação nos gabinetes e em especial aos membros das Comissões de Constituição e Justiça, Administração e Finanças, antes que pudessem dar o parecer final ao texto. A falta de dados, a escolha do relator, o deputado Paulo Dantas e a pressa usada como estratégia pelo Palácio República dos Palmares não foram poupadas.
O deputado Cabo Bebeto foi mais incisivo e disse que Renan “maltratou os servidores” durante sete anos e que por isso deixará um legado negativo de ter sido o pior governo para as categorias. “Os policiais e bombeiros foram enganados com a Previdência Social, quadro organizacional, agora acabou o carnaval e jogam a tropa para São João, enganando todos mais uma vez”, afirmou Bebeto.
Sobre as demais categorias, ele lembrou que em muitas funções as letras de progressão variam de 3% a 30% para a mesma atividade. E como o modo escolhido foi o de atropelar os debates na avaliação do parlamentar muita gente continuará prejudicada.