Economia
Sururu alagoano � exportado para a BA

CARLA SERQUEIRA Repórter Apesar de esgotos sanitários invadirem, diariamente, suas águas, o sururu continua farto na Lagoa Mundaú. A cadeia produtiva do molusco envolve milhares de famílias em Alagoas. Da favela Sururu de Capote, no Dique Estrada, cerca de duas toneladas do alimento viajam, toda semana, rumo a Salvador, onde o prato exótico da sururuzada compete com a consagrada culinária baiana. Desempregado, o mineiro Arnaldo Silva viu na exportação do sururu uma porta para a sobrevivência. Tive que criar uma atividade que desse certo, conta por telefone, enquanto retorna, em seu caminhão, à capital alagoana para buscar a mercadoria. Morando em Alagoas há 12 anos, percebeu a abundância do sururu nas lagoas do Estado e resolveu investir na atividade. Há 10 anos, Arnaldo é exportador. De três casamentos, seis filhos nasceram. Tenho que sustentar todo mundo. Até agora tem dado certo, comenta. A venda do sururu rende para ele em torno de R$ 1 mil por mês. Comprei meu caminhão e tenho um motorista que me acompanha nas viagens. Na capital Baiana é o próprio Arnaldo quem revende o sururu. Lá eu viro ambulante, afirma. Em algumas vezes ele revende para supermercados, mas na maioria dos casos, é na rua mesmo onde o alimento é anunciado e negociado. O sururu é procurado em toda parte. Mas para ser revendido por Arnaldo, o sururu tem que estar fresco e não pode estar esfarelado. Para atender ao padrão de qualidade exigido pelo exportador, os moradores da favela Sururu de Capote trabalham duro, todos os dias, para preparar a carga. Desde crianças até idosos se dedicam à atividade, seja pescando, dispinicando, cozinhando, ensacando ou congelando o pescado. A miséria que compõe o ambiente da favela chega a ganhar um ar de cooperativa, de micro-empresa. Antes do dia clarear, saem os homens em suas canoas. Por volta das 8h, as mulheres esperam, em seus barracos, as latas de sururu que encomendaram. Sentadas em rodas e com tábuas nas pernas, elas começam a limpar o sururu. Quando o sol se põe, a hora é de cozinhar o pescado para que a casca se solte do alimento. Por fim, cada quilo de sururu é ensacado. Tudo tem que está pronto até segunda-feira, dia que Arnaldo Silva compra a mercadoria. ### Exportação envolve homens e mulheres Os moradores da favela Sururu de Capote se dividem em grupos para negociar o sururu que pescam. Um deles é encabeçado por Ednelson Cordeiro dos Santos, que trabalha com mais 16 pessoas. Cada um faz a sua parte e no final, todo mundo recebe pelo que fez, conta ele. A primeira tarefa é a mais difícil, e por isso, a mais cara. O ofício é o de pescador. Às 3h da madrugada, três canoas, pertencentes ao grupo de Ednelson, deixam a favela Sururu de Capote e seguem uma hora de viagem lagoa adentro, até encontrar o melhor local para extrair o sururu. É uma tarefa pesada, conta o pescador Gilberto da Silva, de 48 anos. Todo dia, só ele retira da lagoa 25 latas [grandes, de querosene]. Por cada lata ele recebe R$ 5. Mas depois que eu pago as dispinicadeiras, sobra quase nada. O que a gente ganha é mixaria, releva. Jaqueline da Silva Santos, de 19 anos, é uma dispinicadeira. O trabalho dela é tirar a lama e o resto de planta que vêm presos ao sururu. O trabalho é totalmente manual. Ela passa o dia inteiro para limpar quatro latas. Cada lata de sururu limpo rende a Jaqueline R$ 1. Não gosto de dispinicar, não. Mas é o jeito. Durante o dia, a qualquer hora, o trabalho das dispinicadeiras - na maioria das vezes, são as mulheres que executam esta parte da tarefa - pode ser observado entre as ruelas da favela. Estão, quase sempre em grupo, nas portas dos barracos, limpando o sururu ainda com casca. Em trechos da pista do Dique Estrada é possível testemunhar a última etapa do preparo para a venda do sururu. Com fogo artesanal, o molusco é fervido para que a casca se solte. É aí que entra Josivaldo Lima Gomes, 19. Sua função é peneirar o sururu, eliminando os restos de casca que ficam presos ao alimento; e ensacar. Pesamos 1,1kg porque, quando o sururu é congelado, ele encolhe e perde peso, disse, afirmando que, se não estiver na medida certa, Arnaldo Silva, o exportador que compra toda a produção e leva para a Bahia, acaba não fechando negócio. Os moradores da favela Sururu de Capote se sentem orgulhosos em exportar o sururu alagoano para outros Estados, mas reclamam da falta de apoio do governo. Deveria ter um galpão para todo mundo trabalhar tranquilo; quando chove, a produção tem que parar, reclama o pescador Gilberto da Silva. CS ### Prioridade do governo é cultivar ostras no Litoral Sul Apesar de ocupar uma população excluída socialmente e totalmente à mercê da criminalidade, o governo do Estado não prioriza o apoio à pesca de sururu. Os olhos institucionais estão voltados para o cultivo da ostra e algas por ser uma atividade mais lucrativa. Em parceria com o Projeto Oceanus - uma Organização Não-Governamental (ONG), o Governo assinou um convênio com o Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID) para incentivar a aqüicultura sustentável em Alagoas. O coordenador do Projeto Oceanus, Daniel Costa, disse que a ONG também tem o interesse de trabalhar com o sururu. Estamos estudando a viabilidade de implantar um projeto direcionado à pesca do sururu, afirmou, explicando que a ONG já começou a analisar a cultura na lagoa do Roteiro, na Barra de São Miguel, que, segundo ele, produz o melhor sururu do Estado. Lá estão os maiores, observou. O secretário de Desenvolvimento Econômico de Alagoas, Arnaldo Cavalcante, reconheceu a importância de apoiar os pescadores de sururu da lagoa Mundaú, mas afirmou que o projeto que está na pauta é mesmo o que se refere à criação de ostras. O sururu é um artigo importante para o Estado, até pelo seu valor histórico, disse ele, mas, a dificuldade de investimento se dá porque não tem um valor agregado alto, afirmou. No entanto, o secretário observou que a produção de sururu tem 100% de aproveitamento. Temos o interesse de desenvolver toda a cadeia produtiva do sururu, na qual aproveita-se até a casca para o artesanato, disse Arnaldo Cavalcante. Lagoas do Brasil De acordo com a Agência Nacional de Águas, órgão ligado ao Ministério do Meio Ambiente, a região das lagoas Mundaú e Manguaba abrange um dos sistemas estuarinos mais importantes do país e vem sofrendo, com a ocupação desordenada de suas margens, um processo acelerado de degradação ambiental, afetando, direta e indiretamente, os cerca de 260 mil habitantes que vivem no seu entorno, dos quais 5.000 são pescadores e catadores de sururu. |CS