R$ 10
Lojas com produto de valor único se popularizam em Maceió
Preços convidativos fazem consumidores se excederem nas compras


Lembrando o fenômeno das lojas de R$ 1,99, que se popularizaram nos anos 1990, Maceió vem se deparando com o surgimento das lojas de “tudo por R$ 10”, onde é possível encontrar desde produtos eletrônicos até maquiagens.
A popularidade desse tipo de comércio, que só aumenta, atrai cada vez mais consumidores, que deixam de comprar em lojas convencionais os mesmos itens, geralmente muito mais caros. Com a grande demanda, é possível observar cada vez mais estabelecimentos desse tipo surgindo pela cidade.
Na década de 1990, após o Brasil atingir a estabilidade econômica com o Plano Real, surgiram as lojas onde qualquer produto custava R$ 1,99. Havia de tudo: brinquedos, bugigangas, artigos de papelaria e utensílios domésticos. Um dos motivos para o baixo preço dessas mercadorias era a importação em larga escala da China, que exportava produtos em lotes para o Brasil.
Em Maceió, observa-se a volta dessa tendência. Em áreas comerciais como o Centro, Jacintinho e até shoppings, lojas que vendem produtos a preço único — normalmente R$ 10 — estão se proliferando. Os fregueses, que aumentam na mesma medida em que cresce a oferta, já possuem até uma rotina de visitas a essas lojas.
“Geralmente costumo ir cerca de duas vezes por mês, a cada 15 dias. Normalmente para ver se tem alguma novidade, se há alguma coisa diferente da última vez que fui”, conta a estudante Gabrielly Barreto, que disse comprar de três a cinco produtos a cada ida. Sem questionar muito a qualidade, Gabrielly diz que, pelo preço, vale a pena. “Sinto que estou economizando, porque o custo-benefício geralmente é bom”, completa.
Os preços são bastante atrativos, e cada produto chega a custar, em média, cinco vezes menos do que em um mercado convencional. Alguns deles possuem até qualidade equivalente.
A Aliança Comercial de Maceió afirma não saber a origem desses produtos, tampouco como são vendidos a preços tão baixos. Já para o professor de Economia da Universidade Federal de Alagoas (Ufal) Chico Rosário, a explicação é semelhante à das lojas de R$ 1,99.
“Eles [chineses] empurram da China contêineres e mais contêineres de produtos. Então, precisam escoar, e essas lojas são um reflexo disso, um reflexo dessa mentalidade de negócio que o chinês tem. O chinês é um grande negociante. Ele quer e vai vender. Então, sacrifica a margem de lucro e trabalha mais, porque quer vender”, explica o professor.
A compra de itens produzidos na China não é uma novidade. Em 2013, o e-commerce chinês AliExpress virou febre entre os consumidores brasileiros. Mesmo sendo transportados do outro lado do mundo, os produtos ainda eram notavelmente mais baratos do que os encontrados no comércio local. No entanto, com a Lei 14.902/2024 — conhecida como “taxa das blusinhas” —, que incluiu as taxas de importação no momento da compra, a importação desses produtos sofreu uma queda, devido à perda da vantagem no preço final.
Sem a desvantagem da taxa na hora da compra e sem exigência de valor mínimo para ter frete grátis, como acontece nos e-commerces, os clientes fazem a festa nas lojas físicas.
“Quem se beneficia é o consumido. Em época de inflação alta como a nossa, em que tudo é muito caro, os comerciantes locais colocam preços mais altos. [Então, o chinês] vem de fora e vende por um preço que o pessoal local pode pagar. É o capitalismo: a livre entrada e saída de produtos e de negócios”, observa Chico.
Ao tomar conhecimento da existência desse comércio de baixo custo, o maceioense não perde tempo e faz uma visita, nem que seja para comprar apenas um item. O que acontece, muitas vezes, é que a compra de um único produto acaba virando duas, três e, às vezes, até mais — tudo pela atratividade do preço.
“Estive em uma dessas lojas no mês passado. Fui com a intenção de comprar apenas um batom, mas acabei levando outros produtos também”, relata a estudante Camila Gama, que está sempre à procura de economizar. “Escolho essas lojas justamente por serem mais econômicas. Um produto que normalmente custa o triplo em outras lojas pode ser adquirido lá por um valor muito mais acessível, o que me permite comprar vários itens gastando menos”.
Enquanto uns vão à procura de um pouco de tudo, a jornalista Rayssa Cavalcante tem um foco na hora de comprar: maquiagens. Ela conta que já se tornou costume ir à loja sempre que vai ao shopping e, da última vez que foi, acabou comprando mais do que imaginava.
“Eu não estava precisando de nenhum produto, mas, como de costume, entrei na loja do shopping. Avistei um rímel que costumo usar e que não estava disponível da outra vez que fui à loja. Então, comprei o rímel, mas vi uma esponjinha e lembrei que a minha estava velha. Depois, vi uns lenços umedecidos e decidi levar também. Comprei ainda um sabonete de rosto, que estou adorando, inclusive”, relata.
Riscos
Embora esse comportamento possa ocorrer espontaneamente, é preciso ficar atento caso se repita várias vezes, como alerta o psicólogo clínico Carlos Gonçalves. A compulsão por compras, chamada oniomania, é um transtorno psicológico em que a pessoa busca a sensação de recompensa a qualquer custo, sem medir as consequências. Entretanto, casos isolados são perfeitamente normais.
“Há pessoas que não precisam estar nesse transtorno, nessa oniomania, nessa compulsão por compras, para fazer ‘besteira’, para gastar desnecessariamente, porque muitas vezes a gente precisa também dessa recompensa. Agora, é claro, deve-se ficar atento, porque, havendo repetição, aí sim a pessoa começa a entrar numa verdadeira dependência”, alerta.
*Estagiário sob supervisão.