Saudade
Todos unidos nas provas de Fórmula 1
Fãs de Ayrton Senna ficavam com os olhos e os ouvidos voltados para a TV, em dias de corrida


Os irmãos João Paulo, de 44 anos, Pedro Paulo, de 41 anos, e Nanda Gomes, de 38 anos, também são fãs de Ayrton Senna e a programação do domingo na casa deles tinha hora para começar. Tudo era marcado somente para “depois da corrida”, pois todos os olhos e ouvidos estavam voltados para a TV.
“Todo domingo de manhã ou de madrugada era a mesma atmosfera de final de Copa do Mundo. Durante a corrida, não tinha ninguém nas ruas e todas as TVs estavam ligadas na Globo para escutar a ‘música do Senna’ no final, enquanto ele empunhava a bandeira do Brasil mostrando todo o seu orgulho de ser brasileiro em uma época em que o povo era carente disso, já que, no futebol, as seleções de 82, 86 e 90 não nos deram alegrias. Se você marcasse um churrasco, seria logo após a corrida, ou caso o carro dele quebrasse ou ocorresse algum acidente, aí sim as pessoas começavam a se movimentar para fazer a programação de domingo”, lembra o educador físico Pedro Paulo.
Ele conta com alegria que teve a chance de assistir ao vivo, no autódromo, a uma corrida do piloto brasileiro, durante o GP de 90. Uma lembrança que ele tem viva na memória, apesar de, à época, só ter oito anos de idade. “Graças a Deus, posso dizer que vi o maior piloto de todos os tempos ao vivo no autódromo, embora tivesse somente 8 anos de idade, eu lembro de tudo como se fosse ontem”, relata.
A irmã mais nova, a jornalista Nanda Gomes, também se tornou fã de Fórmula 1 graças a Ayrton Senna, mas confessa que, de uns tempos pra cá, não acompanha mais o esporte com o mesmo entusiasmo. Assim como Luidy, ela lembra com saudade e detalhes da vitória de Interlagos, em 1993, que levou ela e os irmãos ao choro de alegria.
“Ver o Senna ganhar em Interlagos, em 93, ainda que da televisão de casa, tinha um gostinho diferente. Aquela McLaren vermelha sendo cercada pelo povo que invadiu a pista e, de repente, aparece aquele capacete amarelinho, Galvão Bueno narrando e o hino da vitória tocando. Nos reuníamos para assistir, geralmente, no quarto dos meus pais. Então teve choro de alegria e pulos de comemoração”, conta Nanda.
Ela fala ainda da bonita relação que Senna tinha com a família, aproveitando os momentos com o irmão e os sobrinhos. Além disso, era querido pelos colegas de equipe e os mecânicos, focado no trabalho e amava o que fazia. Praticava outros esportes e buscava formas de se superar. “Era um ídolo e a gente como fã absorveu esses valores”, diz.
Após a morte de Senna, as manhãs de domingo mudaram na casa deles e nunca mais foram iguais. “Por muito tempo, os domingos deixaram de ser especiais, pois grandes brasileiros passaram pela F1, mas acredito que o Senna é uma daquelas pessoas que nascem com uma estrela, que são diferentes. Vi Rubinho, vi Massa, tinha esperança no Bruno Senna, que é sobrinho de Ayrton, mas nunca mais foi igual. Era meio mágico, era o que a maioria das pessoas fazia, assistia ao Senna ganhar e ganhar fazendo espetáculo. Confesso que fui diminuindo o interesse, realizei o sonho de ir ao GP do Brasil em 2013, mas aquelas manhãs de domingo eram gloriosas”, destaca.
Para quem não era nascido nesta época, Nanda recomenda que assista às corridas do piloto brasileiro, a algumas de suas entrevistas e converse com quem viveu esta fase, considerada por ela como incrível. “Senna foi um exemplo de humanidade. Ele colocou o Brasil no mapa, trouxe o olhar para as mazelas do nosso país, se esforçava e se dedicava para nos dar alegria, mas também dizia que, assim como ele, os brasileiros poderiam alcançar seus sonhos. Ele tinha orgulho de ser brasileiro e nos deu esse orgulho também”, conclui Nanda.
ULTRAPASSA GERAÇÕES
O jornalista Daniel de Oliveira nasceu muito tempo após a morte de Ayrton Senna, mas conta as histórias do ídolo como se as tivesse vivenciado. Hoje aos 23 anos, ele diz que começou a se interessar pelo piloto brasileiro ao ouvir a mãe falar sobre a paixão do avô dele pelo Ayrton. Aos 13 anos, Daniel decidiu fazer uma pesquisa mais aprofundada sobre o assunto e acabou se apaixonando pelo que viu.
Ele considera que Senna tornou-se um herói brasileiro por inúmeros motivos e elenca dois deles como os principais. “Acho que tem dois motivos: o primeiro é o técnico. Ele foi o piloto mais brilhante que existiu, construindo uma carreira extremamente vitoriosa e sendo o melhor de todos, mesmo em equipes menores e correndo em carros inferiores. O segundo é a sua representatividade. Ayrton carregava o Brasil inteiro consigo em todo canto que ia e provoca até hoje o sentimento de orgulho de ser brasileiro, mesmo com as dificuldades que enfrentamos todos os dias. Além de tudo, acrescento ainda o fator da humanidade, onde lutou pela proteção dos pilotos e fundou vários projetos sociais”.
Como fã, Daniel coleciona histórias que absorveu em meio a tantas pesquisas feitas em torno da vida do piloto. Ele cita, por exemplo, que Senna chegou a parar no meio de uma corrida para ajudar o francês Érik Comas, que bateu durante uma prova e ficou desacordado dentro de um carro com risco de explosão. Algo praticamente impossível de acontecer hoje, considerando o espírito competitivo da atualidade.
Entre as palavras que Daniel usa para falar do piloto, está a ‘perseverança’. Diferencial de Senna que é destacado por todos os entrevistados desta matéria. “Ele tinha o talento, mas o trabalho duro fez com que ele se destacasse em situações adversas. Conhecia as próprias fraquezas e trabalhava nelas. Algumas viraram até pontos fortes, como a corrida na chuva. A perseverança vem com a vontade de vencer e ele se submetia ao limite para conquistar o topo. E a humanidade é o ponto que faz ele ser não só admirado, mas amado. São três coisas que tento levar para a minha vida”, afirma Daniel, que gostaria de ter vivido a emoção da vitória do GP do Brasil, em 1991.