COLUNA DO MARLON
O funil invisível do futebol brasileiro
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A pirâmide é simples e cruel. A cada três mil crianças que sonham em viver do futebol, apenas uma consegue assinar um contrato profissional. E, mesmo assim, não há garantia de carreira longa, salário alto ou estabilidade. O dado não é para destruir o sonho, é para expor a realidade. Porque o futebol, no Brasil, virou um projeto de vida antes de ser um jogo.
A diferença entre sonhar e depender do sonho é o que separa a esperança da frustração. Muitos pais tratam o talento do filho como investimento futuro, como se o drible fosse seguro de renda. O problema não está no menino que sonha, está no adulto que transforma um jogo em obrigação. Quando a bola não entra, o peso cai sobre quem ainda nem deveria carregar pressão.
O funil seleciona atletas, mas também seleciona destinos. Para cada profissional que aparece na TV, existem milhares que ficam pela estrada. Alguns viram preparadores físicos, outros se tornam analistas, fisioterapeutas, treinadores, jornalistas, professores. O futebol devolve mais gente ao mercado do que entrega craques ao mundo. Só que quase ninguém conta essa parte da história.
A geração que cresce sem aprender a lidar com o “não” sofre mais do que deveria quando descobre que esforço não garante contrato. O esporte sempre ensinou a cair e levantar, mas agora há quem só aceite levantar se for para erguer taça. A frustração, antes etapa do processo, virou trauma.
O sonho sempre será válido. Sonhar é o que dá sentido à vida, o erro não está em sonhar, mas em achar que ele basta. O futebol pode ser caminho, mas não pode ser a única saída. Quem entende isso descobre que a bola ensina muito além do gol. E que nem todo vencedor precisa chegar no topo mais alto da pirâmide.
