Internacional
O poder militar brasileiro

RUYTER BARCELOS * O Brasil tem um sólido patrimônio construído com os diferentes grupos de países com os quais se relaciona, tem uma tradição de atuação equilibrada e amadurecida nos foros multilaterais. Tem também interesses claros como grande país continental, com uma economia cada vez mais dinâmica e integrada ao exterior. Contudo, fatos portadores de futuro se apresentaram no cenário mundial na última década do século passado e, mais recentemente, no corte temporal dos últimos dois anos. Os conflitos estavam cada vez mais localizados e motivados por razões étnicas, religiosas ou disputas fronteiriças/territoriais, empenhando efetivos reduzidos de exércitos convencionais. Neste contexto, o Brasil se via cada vez mais distante da guerra. Entretanto, o mundo globalizado tem apresentado pressões e conflitos de interesses em todas as áreas do relacionamento humano. A guerra ganhou contornos de paz instável e os conflitos tornaram-se crises, com sua solução no campo das pressões político-econômicas. A expressão militar ganhou força como instrumento da estratégia da dissuasão. Assim posto, vamos analisar o Poder Militar brasileiro, definindo, paralelamente, seu provável agressor ou inimigo. Altos e baixos Inicialmente, a argumentação passa pelo Exército. Este possui uma força de blindados não de última geração, mas é moderna e talvez a maior do continente sul-americano; a guerra eletrônica é de alto nível operacional e com capacidade para conduzir a interferência, a monitoração e a defesa dentro do espectro eletromagnético realmente um poder a mais no balanço de forças em se tratando de Comando, Controle e Inteligência; e, a Brigada de Aviação helicópteros, atuando em binômio com a Brigada de Infantaria Leve, se constitui um núcleo de modernidade que incrementa a terceira dimensão do combate. A Marinha possui um porta-aviões que lhe permite projetar o poder nacional para além de nossas águas territoriais; a frota, se não moderna, é compatível com o cenário ora proposto; e, sua força de submarinos necessita destes com propulsão nuclear, fato que lhe permitiria ampliar o tempo de submersão, dificultando sua localização e fazendo dos submarinos um elemento surpresa. A constatação preocupante fica por conta da Força Aérea que necessita de novos aviões não só em quantidade, mas com aviônica moderna e sistemas de armas com maior poder de destruição. Hoje, assistimos as constantes quedas de aviões de combate devido sua obsolescência, a vida útil ultrapassada e as dificuldades de manutenção, ceifando vidas preciosas de jovens e promissores pilotos. A compra de novas aeronaves se faz urgente e deveria haver consciência nacional nesse sentido, pois a Força Aérea pode estar comprometendo, com os equipamentos ora empregados, a defesa do espaço aéreo brasileiro. Não se pode deixar de comentar que as restrições orçamentárias crescentes têm atrasado o cronograma de desenvolvimento de novas armas, fato que acentua a defasagem tecnológica do material militar brasileiro. Por exemplo, o fuzil em uso no Exército, mesmo que de fabricação mais recente, é de tecnologia da década de 1960. Como informação, os Arsenais de Guerra e diversas indústrias civis possuem protótipos mais modernos não só para o fuzil como também para morteiros, mísseis contra blindados e outras armas convencionais, mas faltam os recursos orçamentários. Da mesma forma, ficou famoso no mundo o carro de combate Osório, por seu excelente desempenho diante de similares de outros países. Assim, pode-se afirmar que temos pesquisa e desenvolvimento na área de material militar, o que nos restringe é o fator financeiro. Dentro do mesmo raciocínio, a Marinha tem retardado o desenvolvimento do submarino movido à energia nuclear por restrições orçamentárias crescentes ano após ano. Identifica-se, como um elemento adverso ao programa, a constante pressão de entidades ambientais que consideram o projeto uma forma velada de obtenção da arma atômica, o que não é verdade. Além disso, o submarino não será armado com ogivas nucleares e sim sua propulsão empregará tal combustível. O desconhecimento da arma estratégica o submarino - tem prejudicado sobremaneira o Brasil. Voltando ao tema financeiro, outro aspecto fundamental a ser considerado é que os minguados orçamentos militares dos últimos dez anos têm impedido o completo treinamento das Forças Armadas, fato este que as deixa, operacionalmente, não nas melhores condições. Como constatação, no último ano, e em outros anteriores não foi diferente, a tropa passou a viver no regime de meio expediente a partir de 1o de julho. Os recrutas não completaram seu adestramento e foram dispensados do serviço militar. Como manter as Forças Armadas adestradas, preparadas para o emprego em tais condições? É claro que estamos aquém do desejado. Objetos da cobiça No entorno regional, a América Latina, o Brasil é um país realizado, sem problemas fronteiriços, não possui litígios ou contenciosos com seus vizinhos; a situação econômica de todos não recomenda uma aventura dessa natureza, além de constatarmos um desequilíbrio acentuado de forças e favorável ao nosso País, uma desproporção numérica em pessoal e material. Se considerarmos a tecnologia do material militar, há um equilíbrio em muitos aspectos, mas há uma vantagem brasileira acentuada em muitos outros. Para o contexto regional, não somos ufanistas e sim realistas, temos condições de dissuadir um ataque ao território brasileiro estratégia defensiva. Contudo, é lícito afirmar que possuímos Forças Armadas para nos defender de quem dificilmente irá nos atacar. Caso o faça, nosso poder de retaliação será maior. Isso é dissuasão. O problema passa a ser enfrentar uma coalizão do nível da anglo-americana, ou mesmo, tropas da Organização do Tratado do Atlântico Norte (OTAN), que estão na fronteira tecnológica em termos de material militar. Como já comentamos, possuímos atrativos estratégicos que justifiquem uma ação militar alienígena. Na Amazônia, os recursos minerais do subsolo ultrapassam o valor de um trilhão de dólares, segundo estimativas; a fauna e a flora formam um ecossistema cobiçado internacionalmente; a água doce se constitui em uma reserva mundial que nos faz afirmar: hoje se mata, no planeta, por petróleo, amanhã por água! Tal assertiva é um alerta por demais conhecido. Outro fato desconhecido da maioria da população brasileira: na fronteira mais a noroeste, na região de São Gabriel da Cachoeira (AM), há uma montanha de nióbio, um mineral que faz parte da liga das naves espaciais, dos componentes eletrônicos! E dizem que o futuro da Humanidade está no espaço sideral. Portanto... Há ou não motivo para preocupação? Como a Amazônia, outra região rica no mundo é a calota polar Antártica. Aonde buscar primeiro a sobrevivência do homem, lá ou aqui? É uma questão de tempo, podemos assegurar. Em qualquer situação apresentada, o diferencial será o homem brasileiro. Este é reconhecido, internacionalmente, como da melhor qualidade. Isso mesmo, o soldado brasileiro é excelente! Contudo, é preciso material militar mais moderno ou será um sacrifício inútil de vidas dos nossos jovens. Para o contexto mundial, não somos pessimistas, mas sim realistas, não temos condições de dissuadir um ataque ao território brasileiro. A Estratégia passa a ser a da resistência deixar invadir, permanecer será difícil senão impossível para o invasor, diante da vontade nacional de defender o solo brasileiro. Basta de sucateamento Como conclusão, considerando que o poder militar deve estar à altura da estatura político-estratégica do País, a sociedade brasileira precisa definir, urgentemente, que Forças Armadas deseja possuir, quantitativa e qualitativamente; é impositivo parar com seu sucateamento ou, então, é melhor não tê-las. Assim posto, não resta dúvida que o Brasil não tem alternativa no cenário descrito, ao menos no prazo desta geração. Como solução, o País deve ganhar tempo até transformar o potencial em poder nacional. Como atitude temporária, o melhor é negociar, ou seja, transformar as ameaças em oportunidades, mesmo que para isso deva submeter-se, parcialmente, à vontade internacional. Mais do que uma triste constatação: é uma realidade. Finalizando, destacamos que transformar o futuro começa agora, sendo pró-ativo e adotando medidas concretas já, alocando mais recursos para as Forças Armadas. Por outro lado, todos nós conhecemos a situação difícil de milhões de brasileiros que passam fome, excluídos socialmente. Mais uma vez, administrar a escassez exige sabedoria. É preciso uma estratégia nacional sem as clivagens ideológicas ultrapassadas, uma estratégia não subordinada a este ou àquele partido político, mas comprometida com o bem comum e com o futuro da nação, para enfrentar o grande desafio brasileiro das próximas duas décadas: ser livre e independente ou submeter-se ao neocolonialismo! (*) É CORONEL DA RESERVA DO EXÉRCITO BRASILEIRO E FOI COMANDANTE DO 59O BATALHÃO DE INFANTARIA MOTORIZADO EM MACEIÓ [email protected]