Internacional
Vers�o de v�rus adquire resist�ncia

| Reinaldo José Lopes Folhapress Uma versão do vírus H5N1, causador do atual surto de gripe aviária na Ásia e na Europa, parece ter desenvolvido resistência contra um dos principais remédios usados para combatê-lo. A pessoa com a cepa resistente se recuperou, mas o achado mostra que o vírus pode estar se tornando um inimigo imprevisível. A análise foi liderada por Yoshihiro Kawaoka, da Universidade de Tóquio e da Universidade de Wisconsin (EUA). Graças à preocupação causada pelo aparecimento do H5N1 em aves na Turquia e na Romênia, a revista científica britânica Nature (www.nature.com), na qual Kawaoka e seus colegas publicam o trabalho, resolveu liberar o acesso à pesquisa na última sexta-feira, embora ela só saia na sua edição de quinta-feira. O vírus, resistente ao medicamento Tamiflu, foi isolado de uma menina vietnamita de 14 anos. Outro dado preocupante, aliás, é que ela pode ter pegado a doença do irmão. Os pesquisadores dizem que essa é a hipótese mais provável porque a garota não teve contato com aves, principais responsáveis por transmitir a doença, e ajudou a cuidar do irmão quando ele convalescia. Como a vietnamita tomou doses preventivas do remédio antes de adoecer, não se pode descartar a possibilidade de que isso tenha favorecido o aparecimento da cepa resistente, embora, no momento, não exista certeza sobre isso, afirma o pesquisador japonês. ### Modificação preocupa pesquisadores Causadores de doenças como os vírus, que contam com uma capacidade de embaralhar e modificar seu material genético, costumam desenvolver resistência a medicamentos. ?Há dados mostrando que entre 12% e 15% dos vírus influenza [o grupo dos causadores da gripe] se tornaram resistentes a antivirais?, conta Paolo Zanotto, do Instituto de Ciências Biomédicas (ICB) da USP. No caso da menina do Vietnã, Kawaoka e seus colegas não tiveram a dimensão exata do que estavam enfrentando até extraírem amostras da garota. Ela adoeceu em 27 de fevereiro e teve alta em 14 de março, uma semana depois de um tratamento de sete dias. Quando os pesquisadores se puseram a analisar o H5N1 obtido com a paciente, notaram que alguns dos vírus tinham uma diferença quase insignificante em seu material genético. A mudança se refletia na troca de um único aminoácido (os ?tijolos? bioquímicos que compõem as proteínas). Essa troca acontecia na proteína conhecida como neuraminidase, justamente a que é o alvo do Tamiflu. A neuraminidase é que permite ao vírus escapar de uma célula infectada e invadir outras. Os pesquisadores inocularam as cepas com essa modificação em doninhas e viram que, de fato, elas eram altamente resistentes ao Tamiflu, embora fossem derrotadas pelo Relenza, outro antiviral que também age sobre a neuraminidase. ?Os remédios têm desenho químico diferente, o que pode explicar isso?, diz Arruda Neto. Ele chama a atenção para o fato de que, nas doninhas infectadas com as cepas resistentes, a replicação dos vírus foi menor. ?Essa é uma notícia alvissareira. Ela confirma dados anteriores de que os vírus muito resistentes são menos patogênicos?, provavelmente porque a modificação que lhes permite resistir à inibição da neuraminidase também acaba dificultando sua saída das células. Seja como for, diz Zanotto, ?a resistência a inibidores de neuroaminidase seria muito preocupante caso ocorra em um H5N1 adaptado para a transmissão em humanos?. Por isso, a equipe de Kawaoka sugeriu que pode ser útil estocar ambos os antivirais como proteção contra uma possível pandemia. ?Não sei se está na hora de tomar essa decisão. Não há remédio suficiente nem de um dos antivirais, que dirá dos dois?, avalia Arruda Neto.