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Nº 5881
Maré

ACELERANDO A VIDA

Opção para acelerar áudios no WhatsApp reinaugura discussão sobre pressa, ansiedade e ruídos na comunicação

Por DA EDITORIA DA REVISTA MARÉ | Edição do dia 03/07/2021 - Matéria atualizada em 03/07/2021 às 04h00

A discussão remonta à chegada da internet e das redes sociais à vida cotidiana, mas a pressa aflitiva da comunicação contemporânea ganhou, recentemente, mais um atenuante: o recurso de acelerar a voz nas mensagens de áudio no aplicativo WhatsApp. Quem utiliza o app no dia a dia, seja para trabalho ou para a comunicação pessoal, já sente o impacto da funcionalidade, para o bem e para o mal.

Aparentemente inofensivo, o recurso pode estimular gatilhos de ansiedade. De acordo com a Organização Mundial da Saúde (OMS), inclusive, desde 2017, o Brasil tem o maior número de pessoas vivendo com transtornos de ansiedade no mundo: são cerca de 19 milhões de brasileiros. Sem os dados relativos à pandemia de Covid-19.

Para a médica psiquiatra Regiane Kunz Bereza, que questionou o lançamento da funcionalidade em um artigo do Tecnoblog, o problema não é a novidade, mas a maneira com que a usamos no dia e a nossa motivação. Para ela, a necessidade de acelerar tudo é motivo de alerta.

“O que a gente precisa pensar é que, apesar da vantagem, se não é mais uma forma de mostrar que tentamos acelerar tudo. Essa pressa é justificada?”, argumenta Regiane. A psiquiatra diz que problemas como a ansiedade fazem com que as pessoas aproveitem menos o momento, pensando sempre no depois e nunca no agora.

“Muitas vezes precisamos que as coisas durem o tempo que elas precisam durar. Qual a necessidade dessa pressa toda?”, continua a especialista.

Para Everton Lessa, 24, usuário do aplicativo, apenas a notícia da implantação da funcionalidade o deixou em estado de atenção. “Não sabia como seria na prática, mas confesso que me espantei com a proposta. Afinal, o áudio acelerado, em alguns casos, nos faz perder algumas informações devido à velocidade”, diz.

A psiquiatra Regiane Kunz compartilha da mesma preocupação do alagoano e aponta que acelerar os áudios pode provocar ruídos na comunicação, não apenas em relação ao conteúdo, mas no sentido. Por exemplo, ao acelerar os áudio, além da duração, a entonação da voz muda. Outro pensamento que surge na sequência do lançamento da aplicação é um tipo de angústia: será que meus amigos ou companheiro estão acelerando meus áudios?

“Afeta o emocional, porque as pessoas cobram um retorno imediato e também porque fico na neura imaginando: será que minha mensagem foi ouvida por completo ou no modo acelerado? Daí bate uma ‘bad’”, diz Everton Lessa.

Para Mariana Pessoa, 29, a opção de acelerar os áudios foi bem-vinda. Ela diz que as pessoas é que vão decidir se ouvem ou não os áudios dessa maneira.

“Acho que não é um vilão, não. Acredito que agiliza muitas coisas, muitas pessoas não conseguem sintetizar o que querem dizer e divagam muito nos áudios. Então, cada um sabe como são seus amigos, as pessoas com quem trabalha, aí acelera ou não”, afirma a alagoana.

“Eu acho que pode causar muitos problemas de comunicação, de angústia por causa dessa dúvida sobre o jeito que as pessoas ouvem seus áudios, mas aí a gente tem que aprender a encontrar um equilíbrio. A internet inteira está cheia de gatilhos para o psicológico e emocional, a gente tem que encontrar um jeito de desviar, já que não tem como abrir mão disso”, argumenta.


PROBLEMAS NO TRABALHO

Para Everton Lessa, a implementação da novidade tem causado um problema inesperado no trabalho: os clientes estão utilizando mais áudio para se comunicarem e cobram uma resposta mais rápida, já que sabem da possibilidade de utilizar a aceleração dos áudios.

“Trabalho com atendimento online e as pessoas esperavam que a função de acelerar resultasse numa agilidade no atendimento, daí acabam cobrando uma resposta mais rápida.  Só que o atendimento, mesmo com essa opção de acelerar o áudio, deve ser feito de maneira responsável, para que não aconteça nenhum equívoco no processo de venda”, explica. 

Questionada, Mariana também relata uma mudança no comportamento. “Principalmente os chefes, eles estão usando mais áudio para solicitar coisas e acabam gravando áudios mais longos, na expectativa de poupar tempo.”

Everton completa, evidenciando que já alertou os amigos sobre sua resistência à nova aplicação.

“Sim, muitos amigos aderiram. A maioria prefere os áudios no modo 1.5x, mas já deixei claro que não executem o meu assim, estão proibidos. Cada informação deve ser apreciada com a velocidade normal.”

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