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O luto e a vida: como lidar com as perdas para seguir em frente

Psicóloga especialista no assunto fala sobre os diferentes tipos de luto e a necessidade de naturalizá-los

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Psicóloga Jacqueline Leão diz que cada pessoa encara o luto de uma forma diferente
Psicóloga Jacqueline Leão diz que cada pessoa encara o luto de uma forma diferente | Foto: Divulgação

O luto é uma reação natural à perda de algo ou alguém significativo. Embora geralmente associado à morte, ele pode surgir em diversas situações e se manifestar de diferentes formas, trazendo consequências emocionais, físicas, cognitivas e até espirituais. Envolve tristeza, raiva, culpa, fadiga, insônia e, por vezes, crises de fé ou perda do sentido da vida. A morte da cantora Preta Gil, no último dia 20 de julho, reacendeu o debate a respeito do assunto, pois comoveu o país inteiro e expôs as variadas formas de enfrentar esse tipo de dor.

A psicóloga Jacqueline Leão, que é especialista no assunto, ressalta que cada um encara esse processo de uma forma, com reações diferentes, pois trata-se de um processo adaptativo vivenciado por todas as pessoas ao longo da vida. “O luto é uma experiência profundamente pessoal e única para cada indivíduo, que pode manifestar-se em diversas dimensões. Esse processo passa por reconhecer a realidade da perda e processar emocionalmente a dor, e é necessário que a pessoa se reajuste a um novo ciclo da vida onde a pessoa ou o que foi perdido está ausente”, afirma.

A especialista chama atenção para os diversos tipos de luto, nem sempre compreendidos pela sociedade. “O luto pode ocorrer após qualquer perda significativa, como o fim de um relacionamento, perda de emprego, mudança de cidade, diagnóstico de doença crônica, envelhecimento ou até a síndrome do ninho vazio”, fala Jacqueline.

E como nem sempre essas perdas envolvem morte, muitas vezes o sofrimento é invisível aos olhos dos outros, não é publicamente validado e não recebe apoio social, o que pode isolar ainda mais quem passa por essas situações. Esse tipo de luto é chamado de “luto não reconhecido” ou “luto invisível”.

“Isso acontece quando, por exemplo, a relação não é reconhecida, a exemplo dos amantes, ex-parceiros e animais de estimação. Também acontece nos casos de abortos espontâneos, perdas perinatais, doenças crônicas, perda de funções cognitivas em idosos e desaparecimentos. Existe ainda o enlutado que não é reconhecido, como no luto das crianças, de pessoas com deficiência intelectual ou mesmo profissionais de saúde que não podem chorar a perda de pacientes”, destaca a psicóloga.

Apesar da ideia popular das “fases do luto”, Jacqueline destaca que elas não são regras fixas e que tudo acontece de forma única para cada pessoa. “A experiência do luto é influenciada por fatores como a natureza da perda, a relação com o que foi perdido, a personalidade do enlutado, o sistema de apoio social e cultural e experiências anteriores. Além disso, nem todos passam por todas as fases, e a ordem pode variar. As fases do luto incluem a negação da perda e sentimentos de raiva, quando a pessoa percebe a situação como injusta. A barganha é outro fenômeno que pode acontecer, nesse caso a pessoa pode acreditar que se fizer algo específico, poderá evitar mais dores. Existem momentos de tristeza profunda, isolamento e desesperança e, finalmente a aceitação e resignação à perda. O luto é um processo emocional difícil e cada pessoa se organizará de maneira diferente frente a esse desafio”, completa a especialista.

Há, no entanto, situações em que o luto se torna mais complicado ou prolongado. “No luto saudável, há melhora gradual na capacidade de funcionar. Já no luto complicado, a dor é persistente, intensa e debilitante por um período prolongado. A pessoa permanece ‘presa’ na fase inicial do luto, sem progredir na adaptação. É importante notar que o luto complicado não é uma falha de ‘superar’ o luto, mas uma condição que requer atenção e apoio profissional”, alerta a psicóloga.

Jacqueline também destaca que nossa sociedade ainda tem dificuldades para lidar com o luto. Expressões como “a vida continua” ou “seja forte” podem soar como uma pressão para seguir em frente, quando, na verdade, o mais importante é permitir-se sentir. “Existe uma expectativa implícita de que a pessoa deve ‘superar’ a situação rapidamente, mas o luto não tem prazo de validade”, reforça.

Amigos e familiares podem ser apoio essencial nesse momento. “Oferecer escuta sem julgamento, permitir a expressão das emoções e validar a dor são formas poderosas de acolher”, diz Jacqueline.

Pequenos gestos de presença e empatia também ajudam a aliviar o peso da solidão. Para quem se sente paralisado, a dica é dar pequenos passos e, se necessário, procurar ajuda profissional, pois, mesmo diante da dor, é possível encontrar aprendizado.

“A experiência do luto pode aprofundar a empatia, revelar força interior e levar a uma reavaliação de prioridades na vida. O luto não está restrito à morte física. Ele é desencadeado por qualquer perda de um vínculo significativo. É uma ruptura com o ambiente que dá suporte e sentido. Em todos esses casos, há uma necessidade de se adaptar a uma nova realidade, processar a ausência do que foi perdido e reconstruir um novo sentido de si e do mundo, o que caracteriza o processo de luto”, afirma Jacqueline.

Naturalizar o luto e compartilhar a experiência com pessoas de confiança, segundo a especialista, é um passo necessário para uma sociedade mais humana. “Desmistificar a morte exige diálogos e naturalizar o luto significa aceitá-lo como uma parte inevitável e humana da existência, reconhecendo que a dor da perda é o outro lado da moeda do amor e da conexão. Ao fazer isso, podemos criar uma sociedade mais empática, resiliente e humanitária”, conclui.

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