Vontade e raz�o
EDUARDO BOMFIM * Dizia Gramsci que sempre devemos observar os fatos políticos ou históricos com o otimismo da vontade associado ao pessimismo da razão. Não existem obstáculos intransponíveis, montanhas que não sejam escaladas nem armadilhas que não ve
Por | Edição do dia 22/11/2002 - Matéria atualizada em 22/11/2002 às 00h00
EDUARDO BOMFIM * Dizia Gramsci que sempre devemos observar os fatos políticos ou históricos com o otimismo da vontade associado ao pessimismo da razão. Não existem obstáculos intransponíveis, montanhas que não sejam escaladas nem armadilhas que não venham a ser desativadas. É o voluntarismo. Como se sabe, quem é partidário desta doutrina, sim porque é uma doutrina, considera a preeminência da vontade em todos os planos, físicos ou mesmo divinos. Já a razão, desde que submetida a critérios razoáveis de equilíbrio, age como um contrapeso sobre este, em nossas ações. É bem verdade que muitas das vezes as pessoas ou grupos agem sob a ação espontânea confundindo-se com aquele que é voluntarista. É o mais comum. Faço todo este preâmbulo para tecer algumas considerações sobre o novo governo que será empossado em primeiro de janeiro próximo. O presidente Lula foi eleito com 53 milhões de votos. A maior votação concedida a um presidente da República em todos os tempos. O povo quer mudanças em relação ao radical projeto econômico liberal, imposto ao País pelo presidente Fernando Henrique e sua equipe. Sem afastar o mérito do marqueteiro Duda Mendonça, o novo mandatário do Brasil foi sufragado nas urnas através de uma esmagadora vontade do povo pela correção dos rumos na trajetória nacional e, em conseqüência, de suas vidas também. Foi sem dúvida alguma uma eleição plebiscitária. De tal forma que poderiam ter estado nas urnas eletrônicas apenas duas palavras: basta ou continua. É evidente que alguém encarnou o continuísmo, o senhor José Serra. E Lula, por seu passado de resistência, lutas e opção de esquerda, além de uma perseverante busca pela presidência através de quatro tentativas, identificou-se, mais do que qualquer outro candidato, com as mudanças tão almejadas. A questão que se coloca, urgentemente, é a definição sobre qual o novo projeto para o Brasil, já que pelo voto o povo despediu sumariamente os moedeiros falsos, na linguagem do economista Luís Fiori. Deixaram para a nação uma bomba de efeito retardado. E ela se encontra nas mãos de Lula. Felizmente o Brasil possui veredas de prosperidade. Será preciso, no entanto, composição e unidade com as forças progressistas, além de setores favoráveis ao desenvolvimento sustentado do País. E acima de tudo considerar a receita de Celso Furtado, ao afirmar que não podemos subordinar o Brasil à racionalidade dos mercados e das empresas transnacionais. Devemos partir do conceito de rentabilidade social a fim de que sejam levados em conta os valores substantivos que exprimem os interesses da coletividade em seu conjunto. Como se vê, precisamos de muito mais do que a vontade de acertar. Necessitamos de um projeto, um plano com metas, coragem para defendê-lo contra a banca internacional, além dos nossos vizinhos lá do norte que padecem de uma incurável fobia em relação a qualquer atitude de terceiros, acerca de soberania nacional. (*) É ADVOGADO