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Nº 5901
Opinião

Por amor

RONALD MENDONÇA * Sucesso de audiência, a novela “Por Amor”, da Globo aborda, com a conhecida superficialidade, alguns temas caros à civilização, como o alcoolismo e seus desdobramentos, as relações amorosas entre pessoas maduras, os conflitos entre pais

Por | Edição do dia 23/11/2002 - Matéria atualizada em 23/11/2002 às 00h00

RONALD MENDONÇA * Sucesso de audiência, a novela “Por Amor”, da Globo aborda, com a conhecida superficialidade, alguns temas caros à civilização, como o alcoolismo e seus desdobramentos, as relações amorosas entre pessoas maduras, os conflitos entre pais e filhos, a infidelidade conjugal, além, é claro, dos enche-lingüiças de praxe. Mas o fulcro do enredo é a suprema renúncia que a personagem Helena, vivida por Regina Duarte, faz ao entregar o filho recém-nascido a sua filha, que, coincidentemente, dera à luz, ao mesmo tempo da mãe, a uma criança que morreria algumas horas depois. Tudo isso sem que a filha saiba que em lugar do filho está criando um meio-irmão. Folhetins à parte, o fato é que a expressão “por amor”, de repente tomou conta do noticiário, virou manchete de jornais e revistas. Primeiro foi Lula, que difundiu o “Lulinha paz e amor” e descolou a presidência da República. Depois foi aquela tragédia inominável da filha espalhar e repetir aos quatro cantos que planejou a morte dos pais “por amor”. Assassina fria, calculista, inconseqüente e burra, a crueldade e a covardia do ato só são comparáveis à ingenuidade de pensar que estava cometendo um crime perfeito. Há três anos, aqui mesmo em Maceió, a violência invadiu uma residência e retirou a vida de dois irmãos, uma moça de 28 anos e um rapaz de 22, este, enquanto dormia. Autor ou autores e coadjuvantes também imaginaram  que estavam praticando um crime perfeito. Com certeza foi  “por amor” ao ex-empregado que uma receptadora “guardou” os dólares roubados e os manteve consigo, “na moita”, até que o assassino foi capturado e a denunciou. O “amor” deve ter sido o mote para uma loja de armas liberar uma caixa de balas para um desconhecido e sem credenciais, num sábado à noite. Desconfio, também, que a impunidade para essa gente tenha sido “por amor”. Quase ao mesmo tempo do triste desfecho do casal Richthofen, em São Paulo, o País emociona-se com a notícia do paradeiro de Pedrinho, seqüestrado de um hospital de Brasília, quando ainda era um recém-nascido, por uma mulher que se fez passar por assistente social. A comemoração pelo reencontro dos pais com o filho, dezesseis anos depois, contrasta com a evisceração das entranhas da raptora, que mente descaradamente, não demonstrando o menor arrependimento pela dor e sofrimento gerados. Na sua óptica nada fez de desabonador. Foi tudo “por amor”. A verdade é que paira sobre nós um estranho “espectro amoroso” que tenta justificar esse entardecer moral e ético, impelindo pessoas até a carregarem bombas no seu corpo e explodir num ônibus cheio de crianças, e ainda ser festejados como mártires. Deixando a novela de lado, Amor com A maiúsculo foi o da mãe Richthofen que, ferida de morte e julgando tratar-se de um assalto comum, preocupou-se com a segurança da filha chegando a falar: “Fuja, Suzane”. (*) É MÉDICO E PROFESSOR DA UFAL

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